Resumo – Conferência Fiel para Pastores e Líderes – A Realidade do Pecado – D. A. Carson

Acompanhe conosco a Conferência Fiel para Pastores e Líderes de 2013! Assista às reprises e leia os resumos das mensagens aqui no blog. Nesse post, veja a mensagem “A Realidade do Pecado”, por D. A. Carson:

Resumo

O DEUS QUE NÃO ELIMINA OS REBELDES
D. A. CARSON

Texto base: Gênesis 3

Você não pode entender propriamente sua Bíblia enquanto não entender apropriadamente este capítulo. A razão é porque problemas e soluções estão juntas neste capítulo. Você não pode realmente entender a solução que o evangelho provê, a não ser que você entenda o problema que o evangelho confronta. E, também, você não pode entender o pecado, a não ser que você entenda o poder do evangelho. Aqui está a primeira tentação e a raiz fundamental de todo pecado. Aqui estão as raízes da história bíblica que nos levam até a pessoa do Senhor Jesus Cristo e a Cruz.

1. A enganosa e repulsiva natureza que caracteriza essa primeira tentação (v. 1-6).

Aqui somos apresentados à serpente, que é Satanás ou um representante dele. O verso 1 nos diz duas coisas. Primeiro, que Satanás é um ser criado. Em outras palavras, a serpente não é um deus paralelo, um deus mal ou uma manifestação negativa de Deus. A segunda coisa que Deus nos diz é que ele era o mais sagaz de todos os animais. A palavra traduzida por sagaz pode ser tanto negativa quanto positiva. Por exemplo, quando Pv 14:18 diz que o prudente é coroado com conhecimento, a mesma palavra é usada. Pode-se então imaginar que Satanás foi criado como um ser de grande prudência, mas que essa prudência se tornou em sagacidade. Os dois primeiros capítulos insistem em que Deus fez tudo bom. A Bíblia não ensina como a Serpente se tornou sagaz, mas isso é pressuposto que o próprio satanás é rebelde e caído.

Ele então se aproxima de Eva com uma pergunta: “Deus realmente disse que você não deveria comer de nenhuma das árvores do jardim?”. Em outras palavras, ele não começa com uma contradição da palavra de Deus, mas apenas com uma sugestão de que ela tem o direito de julgar Deus. A pergunta ao mesmo tempo levanta orgulho e distração: “Hum, a serpente está perguntando minha opinião sobre Deus”. E, ainda mais, a serpente exagera a proibição de Deus. O capítulo 2:17 diz que Deus havia proibido os seres humanos de comerem de uma árvore, mas satanás pergunta se eles não poderiam comer de nenhuma das árvores. Ele tenta pintar Deus como se fosse alguém essencialmente contra o prazer: “Deus é mau! Ele não quer que você aproveite boa comida! Tudo que ele faz é dizer ‘não!, não!, não!’”.

A mulher responde, e parte de sua resposta é sábia. Ela começa corrigindo a mentira do diabo. Ela diz que podem, sim, comer das árvores do jardim, mas não da árvore que está no meio do jardim. Então, ela escorrega. Ela também exagera a proibição de Deus, dizendo que não poderiam nem mesmo tocar na árvore. Para respondermos o quanto do alvo ela errou, temos que olhar para o que ela deveria ter respondido. Ela deveria ter respondido o seguinte: “Você tá louca, serpente? Como é que você pode imaginar que Deus nãos sabe o que está fazendo? Ele nos fez! Isso é o paraíso! É o Éden! Eu tenho um marido fantástico que acha que sou bonitona! Esse negócio de casamento é legal! A gente anda com Deus todo dia! Nós fomos feitos à imagem e semelhança dele, e ele disse que não devemos fazer isso, então é para o nosso bem!  Você está louca?”. Isso é o que ela deveria ter dito, e toda a história bíblica seria diferente.

Porém, ela começou a contemplar a possibilidade de que Deus tenha feito algo de maneira errada. Então Satanás lança sua primeira e real contradição, no verso 4, dizendo que não morreriam caso comecem a árvore. Normalmente, quando as pessoas querem negar a autoridade da Palavra, elas começam negando o julgamento de Deus, porque depois que você jogar fora da doutrina do julgamento, não existe temor para jogar fora qualquer outra doutrina.

Agora, no verso 5, nós chegamos ao grande esquema da serpente, a grade tentação. O coração dessa proposta, totalmente enganosa, está exatamente no fato de que é parcialmente verdadeira e totalmente falsa. Ela é parcialmente verdadeira, no sentido de que o homem e a mulher sucumbiram à tentação. Porém, em outro sentido, o que ele diz é completamente falso. Observe que este é um convite com a sugestão de serem como Deus, no sentido de definir o que é bom e o que é mau. Nos capítulos 1 e 2, Deus cria algo e diz que é bom. Ele determina o bem e o mal. Quando ele termina tudo, ele declara que tudo é muito bom. O que os seres humanos estão sendo convidados a fazer é determinar o que é o bem e o que é o mal. Isso seria como ser Deus. Aqui está a raiz de todo pecado: a mulher segue suas impressões ao invés de suas instruções.

2. As Consequências iniciais que são fruto dessa primeira tentação

Algumas dessas consequências estão claras na própria narrativa. Deus fez o homem. Do homem, fez a mulher. Homem e mulher deveriam reinar sobre a ordem criada. Porém, o que temos na Queda é uma reversão completa. A serpente corrompe a mulher, a mulher corrompe o homem e os homens se corrompem diante de Deus. Deus havia dito e prometido que se esse fruto fosse comido, haveria morte. Que tipo de morte? Agostinho, teólogo africano do século quatro, disse: “Se fosse perguntado que tipo de morte Deus havia ameaçado o homem, seja corporal, espiritual ou a segunda morte, nós respondemos: todas elas!”. Não incluía apenas a primeira parte da primeira morte, na qual a alma vai a Deus, mas a segunda parte, pela qual a alma deixa o corpo, e inclui a segunda morte, que é a pior de todas. É por isso que quando se chega a Gênesis 5, a genealogia fala tanto da morte.

Mas as consequências específicas que são listadas aqui são as seguintes: verso 7, os olhos foram abertos e eles perceberam que estavam nus, cozeram folhas de figueira e fizeram cintas para si. Então, é claro que num certo sentido, Satanás manteve sua promessa. Seus olhos foram abertos, eles conheceram o bem e o mal. Mas infelizmente é um conhecimento de dentro, como pecador. E a maneira que o escritor nos explica ou nos fala a respeito disso é falando da nudez. Como é que termina o capitulo 2. “eles andavam nus e não se envergonhavam”. Em outras palavras, a nudez está ligada à vergonha depois da queda.

Vós, homens. Só homens. Você gostaria que sua mãe ou sua irmã ou sua filha soubessem de tudo o que você pensou e imaginou? Até mesmo perguntar isso, fala da profundidade da nossa vergonha. Mulheres: gostariam que seu pai, seu irmão ou seu marido, ou seus filhos soubessem de tudo o que você ama, teme ou odeia? Essa pergunta expõe nossa vergonha. O ponto é que você e eu temos tantas coisas que precisamos esconder, que não faria nenhum bem à nossa família conhecer tudo o que se passa em nossa mente, porque esse é um mundo em maldição. Não há apenas culpa, mas vergonha. Mas no princípio, não havia vergonha. Nenhuma vergonha. Adão e Eva poderiam experimentar da intimidade mais profunda, porque nenhum dos dois tinha nada a esconder, e a nudez é uma maneira de mostrar essa questão.

Existe uma história sobre as colônias de nudismo. A melhor das colônias de nudismo, se é que se pode falar assim, tinha uma certa teoria. O argumento era que se pudéssemos ser completamente abertos em algum dos domínios, como o físico, eventualmente aprenderíamos a ser completamente abertos em todos os domínios, então voltaríamos ao paraíso. Claro, não funcionou, pois existe muita culpa e muita vergonha, e tudo o que a nudez faz é aumentar a nudez e a culpa.

Então, embora a cena seja patética, se cobrir com figueira, Deus diz, no fim das contas, que os instintos estavam corretos, e ele mesmo os cobre. Não só isso, mas há a quebra da comunhão com Deus. Verso 8-10. Eles ouviram a voz do senhor e ao invés de correrem para ele, correm dele. É Deus que vai atrás deles. Quando Deus pergunta: onde estás? Não é porque não sabe, mas é porque está tentando fazê-los responder à própria culpa. Ele está expondo futilidade e a estupidez de se esconder de Deus.

Mas a resposta de Adão esconde a causa e revela o sintoma: eu tive medo. E desde aquele momento, a tendência universal do homem é tentar se esconder de Deus. E a parte da graça de Deus que nos move para ele, o que tentamos fazer é nos esconder de vergonha.

Mas não há só a quebra de comunhão com Deus, mas com os outros (11-13). Quem te fez saber que estava nu? Começa da árvore? O homem diz: não é minha culpa, foi a mulher que o senhor fez. Não foi a última vez que um homem acusou a esposa, mas implicitamente o que estão fazendo é criticar a Deus: se tivesse me dado uma mulher melhor não tinha acontecido, Senhor, o problema é seu. A mulher não é melhor que o homem: ela culpa o diabo. Não é minha culpa, se não tivesse serpente aqui, nada tinha acontecido. Mas a característica do pecado é a inabilidade e a falta de vontade de confrontar o próprio pecado. E você sabe que alguém está à beira de se encontrar com Deus quando ele diz: Deus, tem misericórdia de mim.

3. A Maldição explícita que foi pronunciada

Verso 14-15: Primeiro para a serpente. A maldição se dá em duas partes: “visto que isso fizestes…”. Alguns intérpretes veem isso como uma história de como as cobras perderam as pernas. É possível, Deus pode fazer o que quiser. Mas temos que entender que Deus às vezes adiciona novo significado a velhas atividades. Mais tarde, Deus apresenta a Abraão e à sua semente a circuncisão. Pode ser que pense que nunca aconteceu antes e Deus inventou isso. Mas, de fato, todas as evidências mostram que muitas tribos no Antigo Oriente Próximo faziam isso. Mas quando Deus faz isso aos hebreus, ele dá um significado da aliança. Em outras palavras, ele toma um fenômeno da cultura e dá um novo significado pactual. E assim pode ser aqui. Pode ser que as cobras eram cobras e andavam pelo cão, a as pessoas até as achavam bonitinhas. Mas, agora, existe um novo significado adicionado: há uma coisa enganosa, escorregadia.

A segunda parte da maldição vem no verso 15. E isso é chamado de protoevangelho, que significa a primeira anunciação do evangelho. Deus já havia demonstrado graça quando ele veio procurar Adão e Eva, agora ele demonstra graça em uma promessa espetacular. O primeiro anúncio do evangelho. “Porei inimizade entre ti e a mulher”, diz Deus. O que significa? Só significa que mulher não vai gostar de cobra? Se for, minha mulher se encaixa. Ela até aguenta aranha, ratos não assusta, ela ri de morcegos, mas cobras… terrível! Por outro lado, eu conheço mulheres que são especialistas em cuidar de cobras. Parece que esta não é a melhor interpretação.

O texto não diz que a mulher e a serpente teriam inimizade, mas sim que a semente da mulher o teria. Um dia, o descendente da mulher haveria de esmagar a cabeça da serpente, e a serpente haveria de morder o calcanhar do que esmagaria sua cabeça. Você assistiu a Paixão de Cristo, do Mel Gibson? Se você nunca vai ao cinema, eu conto pra você: você lembra a cena de abertura, com Jesus orando no jardim do Getsêmani? Enquanto ele está orando, uma serpente começa a subir nele. No filme, ele se levanta vagarosamente e pisa sobre a cabeça dela. É claro, não há evidencia de que isso realmente aconteceu, mas o cinematografo estava tomando certa licença poética para trazer esse verso pra o filme. Quando eu vi tal cena, eu me perguntei quantas pessoas conheciam o texto bíblico que dava a base daquele momento. É uma maneira de dizer que Jesus, em sua paixão, pisa na cabeça da serpente e, ao mesmo tempo, é mordido e morto.

A maldição, então, também recai sobre a mulher, no verso 16. Primeiro, ele diz que multiplicaria os sofrimentos de sua gravidez. Ora, seres humanos são parte da ordem criada. Nós fomos criados à imagem de Deus, mas viemos do pó. Não somos separados da ordem da criação. E, se nos caímos, existe um sentido onde toda ordem da criação se encontra debaixo da Queda. Aquilo que é a coisa mais distinta da natureza da mulher, que é ter filhos, e até mesmo essa coisa que é boa e maravilhosa, agora é caracterizada por dor e por morte.

Em segundo lugar, Deus diz que o desejo da mulher seria para seu marido, e que ele a dominaria. Eu tenho certeza que alguns de vocês sabem que essas duas linhas tem sido muito debatidas na história da igreja, e não tenho tempo para esclarecer tudo. Então, só vou dizer pra vocês a verdade (risos): é importante lembrar que os verbos aqui só são encontrados outra vez no Pentateuco: eu tenho certeza que quando os primeiros leitores leram esta maldição, eles pensaram: “não sei o que isso significa”. Então, chegaram ao capítulo 4, verso 7, o único outro lugar onde esses verbos se encontram, e então disseram: “ah, é isso que significa”. Nestes versos, Deus está repreendendo Caim, dizendo que o pecado o dominaria. O desejo da mulher seria para seu marido no sentido de que ela tentaria controlar o marido da maneira como o pecado queria dominar Caim. Porém, é dito que ele haveria de governar, ou seja, ele desejaria controlar a mulher com força dominante. Então, ao invés de um casamento feliz e cheio de vida, ela tenta controlar e manipular seu maride. Ele, por sua vez, brutaliza sua esposa, o que é uma descrição apurada de muitos casamentos.

4. As consequências a longo prazo dessa tentação

O verso 20 diz que Adão deu tal nome à Eva por ser mãe de todos os seres humanos. Em outras palavras, esse é o primeiro ato de cumprimento do verso 16, onde diz que a semente viria para destruir a cabeça da serpente. Até que esse dia venha, Deus bem sabe que o povo estaria coberto de vergonha. Então, ele nos cobre com algo que é mais permanente que as folhas de figueira. Ele usa a pele de um animal, o qual precisa morrer para cobrir a nudez de Adão e Eva. Esta é uma tipologia do sacrifício de Cristo que, para nos cobrir de nossas vergonhas, morre em nosso lugar, como o Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo. Em última instância, o capitulo 3 nos mostra a raiz do problema, mas também nos mostra o princípio da solução.