Casamento e a sociedade do espetáculo

Não bastasse a relação conjugal ter sido capturada por ideais românticos, está na moda agora romantizar divórcios! “Não foi nada demais, só estamos nos divorciando, o amor e amizade continuam, apenas o casamento acabou”, dizem alguns. “O importante é vocês se sentirem bem e serem felizes”, comentam outros. Não que eu defenda que divorciados devam se odiar ou coisa do tipo, mas é que não dá para romantizar um divórcio.

Não dá para dizer que está tudo bem quando não está. A separação é uma forma de luto. Se trata de uma ruptura de duas pessoas que sonharam e se comprometeram perante Deus e a sociedade a permanecer juntas até a morte. Não é a mesma coisa que cancelar sua fidelidade à operadora telefônica, estamos falando de um casal que não sobreviveu às crises comuns da vida à dois e optou pela falência matrimonial. A não ser que hajam motivos minimamente razoáveis para uma separação, como relações sexuais ilícitas mencionada por Jesus, abandono irremediável de uma das partes ou mesmo pela triste experiência da violência doméstica, a separação de um casal deveria ser encarada como uma história de fracasso e não como uma história que “deu certo” enquanto durou.

A sociedade romantiza o divórcio justamente porque aceitou romantizar o casamento. Talvez, a maior responsável por essa reconfiguração do significado do casamento seja a indústria contemporânea de casamentos. James K. A. Smith acertadamente pontua que podemos ser tentados a pensar que “a explosão da indústria do casamento é uma boa notícia, como um sinal de que nossa cultura está começando a valorizar o casamento e a família”. Smith questiona, “Tudo isso não prova que nossa sociedade valoriza o casamento mais do que nunca?” Ele responde: “Nem tanto. Na verdade, estimativas indicam que a receita da indústria do divórcio iguala a exibida pela indústria do casamento”.[1]

Em outras palavras, o fato de festas de casamento estarem em evidência não significa que a instituição casamento esteja. Na verdade, esse é um sinal do raiar da sociedade do espetáculo. Todo casal sabe que embora a cerimônia seja significativa para um casamento, ela não representa a realidade da vida à dois. Mas não é o realismo conjugal que a indústria de “festas de casamento” vende. Ela anuncia o matrimônio como um espetáculo onde o amor é romântico o tempo todo, se materializa nas redes sociais como perfeito o tempo todo, deixando intencionalmente de lado algo que o brilho espetacular da cerimônia de casamento jamais mostrará: o árduo trabalho de manter um casamento.

A verdade é que casamento não combina com a sociedade do espetáculo. Casamento nunca foi e nunca será uma instituição recomendada para aqueles que vivem para o cultivo do seu próprio ego, aparência e notoriedade. A razão é simples: os propósitos do casamento são diametralmente opostos a todos eles. O propósito último do casamento é sacramental, isto é, refletir o ser de Deus. Mais particularmente, Deus criou essa instituição como um sinal de uma realidade sublime: o amor que Jesus Cristo tem por sua Igreja.

Por definição, então, casamento é a instituição do sacrifício e não do conforto; é símbolo da nossa busca por essência e não combina com quem só se interessa por visibilidade. Casamento é uma escola que reprime as vaidades e ilusões. No matrimônio não importa “quem” você é ou quão respeitado você é pelos outros. A maior conquista de um homem é ser admirado pela mesma mulher todos os dias e vice-versa.

No matrimônio os cônjuges se veem como são e não como parecem ser. O casamento nos desafia a amar o cônjuge não por quem eu gostaria que ele fosse, mas do jeito que é. Casamento só tem glamour para a indústria de casamentos, para a sociedade do espetáculo e não para casais comuns.

Talvez, uma das grandes verdades que precisam ser ditas sobre casamento hoje em dia é que o matrimônio foi idealizado pelo Criador, em primeiro lugar, para amadurecermos como seres humanos e não como um veículo para felicidade. Entender esse princípio já é um excelente ponto de partida para reordenarmos nossas expectativas a respeito do casamento.

Mais do que busca por felicidade, o casamento tem uma função moral na sociedade. Por meio de casais, Deus levanta novas gerações e novas civilizações. Todos os valores que uma sociedade precisa para prosperar se encontram na rotina de uma vida em família: princípios morais, de fé, governo, relacionamento, limites, disciplina, tolerância, convivência, finanças, entre muitos outros. Casamentos fortes produzem sociedades fortes; sociedades frágeis são produto de casamentos arruinados. E, dentre vários outros fatores, casamentos arruinados resultam de relações exageradamente romantizadas. Para o bem da igreja e da sociedade, precisamos parar de romantizar divórcios e o próprio casamento.


[1] Cf. James K. Smith. Você é Aquilo que Ama: O Poder Espiritual do Hábito. São Paulo: Vida Nova, 2017, pp. 161–164.

Por: Jean Francisco. © Voltemos ao Evangelho. Website: voltemosaoevangelho.com. Todos os direitos reservados. Original: Casamento e a sociedade do espetáculo.