Sobre cristãos rotulando e categorizando uns aos outros durante este momento cultural

No dia 13 de Junho, Shai Linne, um rapper cristão reformado americano, publicou uma série de tweets sobre justiça social, racismo, papel da igreja quanto a cultura e alguns outros assuntos relacionados:

Mesmo sendo um tipo de postagem mais voltada ao contexto americano, penso que muito do que é tratado nessa thread seria útil ao nosso contexto brasileiro, até mesmo aos irmãos de outros países de fala portuguesa que nos acompanham por aqui. Por isso, pedi permissão ao Shai Linne para traduzirmos e publicarmos em forma de post aqui no blog e ele graciosamente concedeu. Encorajo a sua leitura!
—Filipe Castelo Branco, Editor Online

Hoje em dia, os rótulos flutuam loucamente por aí, frequentemente usados pejorativamente e quase sempre de forma inútil. “SJW” [Social Justice Warrior], (“Justiceiro Social”), “Woke” (“Acordei”), “Marxista” etc. etc. ou de outro ponto de vista, “Karen”, “White Evangelical”, “Trumpers” etc.

Entendo o desejo de rotular e categorizar as pessoas e suas posições. Isso nos ajuda a arquivá-las em nossa pasta mental. Depois de colocar um rótulo em você, posso facilmente dizer “Ele é um aliado” ou posso dizer “cancelado” e encerrado com ele. E pronto.

Primeiro, não há nada de cristão em “cancelar” alguém. Aos cristãos é ordenado: “Suportai-vos uns aos outros, perdoai-vos mutuamente, caso alguém tenha motivo de queixa contra outrem. Assim como o Senhor vos perdoou, assim também perdoai vós;” (Cl 3.13).

Juntamente com isso, tornou-se popular acusar as pessoas de “sinalizadores da virtude”. Parece-me que, por definição, você não pode lançar essa acusação sobre alguém sem julgar os motivos do coração de uma pessoa. Mas nós somos cristãos, então, tentamos não fazer isso, certo?

Mas eu rio quando ouço a expressão “sinalizador da virtude” ser dita sobre mim, porque fazer ou falar coisas populares fosse minha motivação, eu teria começado anos antes! Eu provavelmente teria menos cabelos grisalhos e mais alguns fãs e ex-amigos ainda por perto.

Uma das razões pelas quais sempre hesitei em me envolver muito com as mídias sociais é o que considero serem as limitações inerentes às nuances e contextos, ingredientes necessários para uma comunicação eficaz.

Mas entendo que a mídia social é uma forma primária de discurso público em nossa cultura e, portanto, tento administrá-la e usar discursos que não me deixarão envergonhado no último dia quando precisarei prestar contas (Mt 12.36). Eu nem sempre entendo corretamente e preciso da graça de Deus para quando não entendo.

Muito do que eu disse recentemente pode parecer novo para algumas pessoas, como se estivesse envolvido em uma onda atual ou algo assim. Mas eu literalmente tenho dito essas coisas há anos. Está no meu primeiro álbum (The Atonement). E, na realidade, polvilhadas em todo o meu trabalho.

Mas foram intencionalmente “borrifadas”, e não “saturadas”, porque eu acreditava na época, e ainda acredito, que o evangelho deve ser prioridade. A pessoa e obra de Cristo é a coisa mais importante que posso compartilhar com qualquer pessoa. Mas não vou ignorar importantes implicações do evangelho.

Eu tentei ser fiel à convicção de não conhecer nada além de Cristo, e ele crucificado, por quase vinte anos de ministério público. Portanto, se um único tweet ou artigo o faz me colocar na sua pasta de “Justiceiros Sociais”, convém a você examinar porque é tão fácil fazer isso.

As pessoas são seres complexos. Foi assim que Deus nos criou. A maioria das pessoas é maior que as pastas mentais em que as colocamos. É possível que duas (ou duas mil) coisas sejam verdadeiras ao mesmo tempo.

Posso concordar de todo o coração e apreciar coisas sobre John MacArthur, ou Jonathan Edwards, por exemplo, e ao mesmo tempo, discordar plenamente de outras coisas. E você pode preencher esse espaço em branco com qualquer número de figuras públicas cristãs.

Jesus não se encaixa perfeitamente em nossas categorias comuns de polarização moderna, então por que devemos esperar que seus seguidores o façam? Se formos fiéis à Bíblia, deve haver momentos em que todos os pés caminhem harmoniosamente, incluindo os nossos.

Então, eu sou reformado? Sim.

Cessacionista? Não.

Republicano? Não.

Isso me faz um democrata? Não.

Eu sou “conservador”? Em algumas coisas.

Eu sou “liberal”? Liberal sobre o que? Casamento? Não. Teologia? Não. Justiça para os pobres e oprimidos? Sim, dependendo do que você quer dizer com isso.

Eu odeio e sofro com o aborto? Sim.

Odeio e sofro com a brutalidade policial e injustiça racial? Sim.

Eu vejo lugar para protestos pacíficos sobre essas duas coisas? Sim.

Apoio tumultos e saques? Não.

Penso que proclamar o evangelho em palavras e ações é a missão da igreja? Sim.

Eu acho que muitas igrejas reformadas falham severamente quando se trata de discipular membros em questões relacionadas ao racismo e injustiça? Sim.

Eu poderia, literalmente, continuar nisso por horas, se nos sentássemos para uma xícara de chá (socialmente distanciada), há muitas coisas que tenho certeza de que ficaríamos surpresos em saber um do outro. Mas nada disso mudaria o fato de que Cristo é nosso tesouro e o evangelho é nossa única esperança.

O benefício da dúvida é algo que sempre queremos dos outros, mas temos dificuldade em concedê-los. Isso porque esse é um presente que estamos mais propensos a dar àqueles que amamos. Então, se você me ama, eu realmente aprecio esse presente! E vou tentar retribuir.

Obrigado.