Um blog do Ministério Fiel
Suicídio é um pecado, mas não o pecado imperdoável
A notícia da morte de Robin Wiliiams, na última semana, foi dolorosa para milhões de pessoas, não apenas porque ele era um querido artista (conte-me como um fã do seu trabalho saudável), mas porque o suicídio não é um tema com que lidamos facilmente. Isso é verdade especialmente para o incontável número de cristãos que se acham de luto por pessoas queridas ou que têm lutado, eles mesmos, com pensamentos suicidas. Não é surpreendente que, diante dessa notícia de alcance nacional, a internet fervilhou de comentários e críticas, pontos e contrapontos. Alguns deles úteis, outros nem tanto.
Sem tentar examinar tudo o que foi dito, e sem pretender dizer tudo o que precisa ser dito acerca de um assunto tão difícil, pensei que poderia ser útil tentar dissipar um pouco a fumaça e apontar quatro breves afirmações. Talvez elas possam nos ajudar a pensar teologicamente e pastoralmente sobre o suicídio.
1. O assunto do suicídio deve ser abordado de modo sensível e compassivo.
Nós precisamos saber o tempo e o lugar. Este é um post de blog direcionado a uma audiência genérica, então eu não acredito que seja insensível dar um passo atrás e analisar “quatro afirmações” sobre o suicídio. Mas eu não apresentaria quatro pontos como estes a alguém de luto pela morte de um amigo ou a alguém que estivesse pensando em suicídio. Tais situações exigem abraços, lágrimas, perguntar, ouvir, contato pessoal e oração – coisas que são impossíveis ou praticamente impossíveis de fazer em um post de blog. Dito isso, mesmo em um artigo genérico, dirigido a ninguém em particular, devemos ter em mente que qualquer um pode estar lendo. O cristão sábio está sempre cônscio de que as pessoas ouvem com diferentes ouvidos. Para alguns, este tópico é uma interessante questão teológica. Outros estão pensando em como ministrar eficazmente quando a necessidade surgir. E, para outros, a mera menção ao suicídio lhes causa no íntimo uma dor indescritível.
2. Suicídio é complicado e ocorre por diferentes razões.
Acredito que muitas pessoas se irritaram com as respostas críticas à morte de Robin Williams porque as críticas falharam em compreender – ou pelo menos pareceram falhar em compreender – as diferenças morais que envolvem os diferentes contextos de suicídio. Certamente, alguém que tira a própria vida após vinte anos de lutas recorrentes contra a depressão merece mais simpatia do que o homem que perde tudo no mercado de ações e pula do 75º andar em um momento de crise financeira. Há uma diferença moral do indivíduo que é pego em adultério e – cheio de vergonha e sem disposição de enfrentar o seu pecado – comete suicídio em comparação ao indivíduo que descobre ter sido traído e, sentindo que sua vida não pode mais seguir em frente, decide dar-lhe um fim. O indivíduo que dispara contra crianças e então se mata é egoísta, maligno e centenas de outras coisas. O indivíduo que tira a sua própria vida em meio aos espamos de uma depressão que é indesejada, impertinente e aparentemente interminável será visto de modo muito diferente. A nossa última ação – mesmo sendo pecaminosa – não define a totalidade da nossa existência. Nós estamos certos em lembrar tudo o que era bom e verdadeiro naqueles que sucumbem à tentação da autodestruição.
3. Suicídio é um pecado.
Certamente, não seria com isso que eu começaria no aconselhamento pastoral, no cuidado pastoral ou ao conduzir um funeral, mas é um aspecto deste assunto difícil que não podemos evitar. Enquanto pode haver situações extremas em que um suicida claramente perdeu o controle de todas as suas faculdades (isto é, demência, traumatismo craniano), na grande maioria dos casos estamos certos em ver o suicídio como uma escolha moralmente culpável e moralmente condenável. Por séculos, a igreja tem consistemente visto o suicídio como uma violação do sexto mandamento. Assassinato de si mesmo ainda é assassinato. Como John Frame observa no livro “A Doutrina da vida cristã”, há cinco exemplos de suicídio na Escritura (Juízes 9.52-54; 1Samuel 31.3-5; 2 Samuel 17.23; 1Reis 16.18-19; Mateus 27.3-5) e todos eles estão em um contexto de vergonha e derrota. Do mesmo modo, quando personagens mais nobres pedem a Deus para tirar suas vidas, Deus nunca lhes atende (Números 11.12-15; 1Reis 19.4; Jonas 4.1-11). Nos casos de Jonas e Jó, Deus claramente vê suas petições autodestrutivas de modo desfavorável.
Embora nós desejemos ter empatia por aqueles que sofrem – seja pelo arrependimento, depressão, doença ou qualquer outra enfermidade persistente –, certamente é um raciocínio ético pobre pensar o sofrimento como um meio que justifica qualquer fim. Nossas escolhas devem ser consideradas “livres” contanto que não estejam sujeitas à coerção ou compulsão exteriores. Julie Gossack – uma esposa e mãe que, por cinco vezes, teve de enfrentar o sofrimento do suicídio de familiares – resume bem a questão: “Suicídio não é uma herança genética nem uma maldição familiar. Suicídio é uma escolha pecaminosa feita por um indivíduo. Essa afirmação não é desprovida de amor ou respeito. É a verdade. Eu amava ternamente meus familiares que cometeram suicídio, mas as escolhas deles foram pecaminosas, e não justas” (JBC Winter: 2006). O suicídio pode parecer a única saída, mas a Escritura nos afirma que Deus nunca nos conduzirá a uma situação em que violar seus mandamentos seja a única opção (1Coríntios 10.13). Nós não ajudamos os santos que estão lutando se nos recusamos a dizer-lhes que o suicídio desagrada a Deus; falar-lhes isso, em amor, pode ser um dos meios pelos quais Deus sacode a alma suicida e lhe traz de volta a um pensamento melhor, mais piedoso.
4. Suicídio não é o pecado imperdoável.
Nós não temos um sistema de penitência e de “extrema unção”. Embora seja particularmente triste para um cristão morrer dessa maneira – confuso e sem esperança –, essa perda de perspectiva não necessariamente significa que o indivíduo não era um cristão nascido de novo e justificado. John Frame, o qual sustenta que o suicídio é pecado, também conta a história de um amigo missionário que foi conduzido para mais perto de Jesus à medida que lutava contra a depressão, mas terminou por matar-se. Frame não hesita em dizer, com confiança, que aquele homem era um cristão genuíno. Nós somos salvos pelo sangue de Cristo, não pelo fato de o nosso momento final ter sido triunfante ou trágico. O suicídio não deve ser tratado com leviandade. Ele é inimaginavelmente doloroso e desagradável a Deus. Porém, para o filho de Deus, verdadeiramente arrependido, verdadeiramente crente e verdadeiramente justificado, Deus é maior do que os nossos pecados, mesmo aqueles que nos apanham em nosso último suspiro.
Ainda com dúvidas?
Leia este artigo mais detalhado de Miguel Núñez: Ao Cometer Suicídio,
o Cristão Perde a Salvação?