Uma Cartilha de Disciplina Eclesiástica (Jonathan Leeman) (2/4)

Quando uma igreja deveria praticar disciplina?

Quando uma igreja deveria praticar disciplina? A resposta curta é: quando alguém peca. Mas a resposta pode diferir a depender de estarmos falando em disciplina eclesiástica informal ou formal, para usar a distinção de Jay Adams entre confrontações feitas em particular e confrontações feitas publicamente, perante a igreja.

Todo pecado, seja ele de natureza grave ou não grave, deve evocar uma repreensão privada entre dois irmãos ou irmãs na fé. Não significa dizer que nós deveríamos repreender todo e cada pecado que um companheiro membro de igreja comete. Significa simplesmente que todo pecado, não importa quão pequeno, está no domínio do que dois cristãos podem  amorosamente trazer à tona um ao outro em uma conversa privada, a ser avaliado com prudência.

Quando nos voltamos para a questão de quais pecados requerem disciplina corretiva formal ou pública, precisamos avançar com um pouco mais de cuidado.

Listas bíblicas

Alguns dos teólogos mais antigos apresentaram listas de quando é apropriado proceder à disciplina formal. Por exemplo, o ministro congregacional John Angell James afirmou que cinco tipos de ofensas deveriam ser disciplinadas: (i) todos os vícios escandalosos e imoralidades (p. ex. 1Co 5.11-13); (ii) a negação da doutrina cristã (p. ex. Gl 1.8; 2Tm 2.17-21; 1Tm 6.35; 2Jo 10ss.); (iii) o surgimento de divisões (Tt 3.10); (iv) a falha em prover o sustento de parentes próximos quando eles se encontrem em necessidade (p. ex. 1Tm 5.8); (v) e inimizades não reconciliadas (p. ex. Mt 18.7). [1]

Esse tipo de lista bíblica pode ajudar até certo ponto. Observe que cada um dos pecados descritos é sério e possui uma manifestação exterior. Eles não são apenas pecados interiores, do coração; eles podem ser vistos com os olhos ou ouvidos com os ouvidos. E nessa manifestação exterior eles enganam tanto o mundo como outras ovelhas acerca do Cristianismo.

Contudo, essas listas falham em abranger a vasta multidão de pecados que as Escrituras jamais abordam (o que dizer do aborto?). Além disso, textos sobre disciplina eclesiástica podem mencionar apenas um pecado particular, tal como 1Coríntios 5, que discute o pecado de deitar-se com a mulher de seu pai; mas é evidente que Paulo não está dizendo às igrejas para disciplinar apenas aquele pecado. Como as igrejas deveriam partir desses exemplos para outros pecados?

Exterior, sério e impenitente

Uma maneira de resumir os dados bíblicos é dizer que a disciplina eclesiástica formal é necessária em casos de pecado exterior, sério e impenitente. Um pecado deve ter uma manifestação exterior. Ele deve ser algo que pode ser visto com os olhos ou ouvido com os ouvidos. As igrejas não deveriam rapidamente balançar a bandeira vermelha da expulsão cada vez que suspeitassem haver avareza ou orgulho no coração de alguém. Não é que esses pecados do coração não sejam sérios. É que o Senhor sabe que nós não podemos ver o coração uns dos outros, e que os verdadeiros problemas do coração irão, de todo modo, emergir para a superfície no final (1Sm 16.7; Mt 7.17ss.; Mc 7.21).

Segundo, um pecado deve ser sério. Por exemplo, eu posso perceber que um irmão exagerou os detalhes de uma história e então, em particular, confrontá-lo acerca da questão. Mas, mesmo que ele negue o fato, eu provavelmente não o levaria à frente da igreja. Por que não? Primeiro, algo como esse pecado de florear histórias está enraizado em pecados muito mais significativos e ocultos, como idolatria e autojustificação. Esses são os pecados com os quais eu quero gastar tempo discutindo pessoalmente com ele. Segundo, perseguir cada pecadilho na vida de uma igreja provavelmente levará à paranoia e impelirá a congregação ao legalismo. Terceiro, claramente deve haver um lugar para o amor que “cobre uma multidão de pecados” na vida de uma congregação (1Pe 4.8). Nem todo pecado deveria ser perseguido até as últimas consequências. Graciosamente, Deus não agiu assim conosco.

Em último lugar, a disciplina eclesiástica formal é o curso de ação apropriado quando o pecado é impenitente. A pessoa envolvida em um pecado sério foi confrontada em particular com os mandamentos de Deus na Escritura, mas ele ou ela se recusa a abandonar o pecado. Tudo indica que a pessoa valoriza o pecado mais do que Jesus. Pode haver um tipo de exceção a isso, a qual consideraremos adiante.

Todos os três fatores estavam em jogo na minha primeira experiência com a disciplina eclesiástica corretiva. Aconteceu de a pessoa em questão ser um bom amigo e um companheiro próximo. Contudo, tanto eu como a igreja estávamos cegos para o fato de que ele estava envolvido em um estilo de vida de pecado sexual, ao menos até ele me contar, um dia, enquanto almoçávamos. Imediatamente, perguntei-lhe se ele sabia o que a Bíblia afirma acerca daquela atividade, e ele sabia. Contudo, ele disse que estava em paz com Deus. Eu o instei para que se arrependesse. Outros também o fizeram. Mas ele dizia a mesma coisa a todos nós: “Deus não está incomodado com isso”. Após alguns meses de conversas como essa, a igreja formalmente o removeu da sua comunhão. O pecado dele era sério, impenitente e tinha uma clara manifestação exterior. Ele iria enganar outros, tanto na igreja como fora dela, sobre o que significa ser um cristão. A igreja passou vários meses em busca desse homem. Nós o amávamos. Nós queríamos que ele se voltasse do seu pecado para conhecer que Jesus é mais valioso do que qualquer coisa oferecida por este mundo. Ainda assim, fica claro quase imediatamente que ele não tinha intenção de voltar atrás. Ele estava resoluto. Diante da escolha entre seu pecado e a Palavra de Deus, ele escolheu o pecado. Então a igreja agiu formalmente.

Extraído do site www.9marks.org. Copyright © 2013 9Marks. Usado com Permissão. Original: A Church Discipline Primer

Tradução: Vinícius Silva Pimentel – Ministério Fiel © Todos os direitos reservados. Website: www.MinisterioFiel.com.br / www.VoltemosAoEvangelho.com. Original:  Uma Cartilha de Disciplina Eclesiástica (Jonathan Leeman) (2/4)

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