Plantação de igrejas em diferentes contextos culturais e etnias

Há nove anos, minha esposa e eu (ambos brancos) nos mudamos para um bairro onde éramos uma minoria étnica. Queríamos plantar uma igreja. Ao longo dos anos, nosso idealismo foi esmagado, atingimos o fundo do poço, experimentamos um renascimento da visão e fizemos progresso lentamente. Deus tem sido incrivelmente amável enquanto tem formado uma igreja diversificada em nosso bairro. O contexto imediato é em sua maioria afro-americano, ainda assim estamos a três quarteirões de um bairro historicamente branco. Nossa igreja é quase metade negra, metade branca e talvez dois por cento asiática.

Base bíblica

Em primeiro lugar: é bíblico e correto realizar o ministério transcultural. Deus encarrega indivíduos de uma cultura para compartilharem o evangelho e investirem em outro contexto cultural. Deus encarregou meu amigo coreano-americano, Dan, para plantar uma igreja em um bairro historicamente branco e pobre. Deus encarregou meu amigo afro-americano, Marty, que cresceu no interior da cidade, para plantar uma igreja nos subúrbios. Deus chamou um homem chamado Paulo, que queria trabalhar entre o seu próprio povo, para sair e levar o evangelho aos gentios. Quando Deus envia um pregador para um grupo de pessoas, um bairro ou uma região, é certo para esse pregador ir e se tornar tudo para com todos de modo que ele possa salvar alguns.

Refletindo sobre a sua própria obra evangélica, o apóstolo Paulo escreveu:

Porque, sendo livre de todos, fiz-me escravo de todos, a fim de ganhar o maior número possível. Procedi, para com os judeus, como judeu, a fim de ganhar os judeus; para os que vivem sob o regime da lei, como se eu mesmo assim vivesse, para ganhar os que vivem debaixo da lei, embora não esteja eu debaixo da lei. Aos sem lei, como se eu mesmo o fosse, não estando sem lei para com Deus, mas debaixo da lei de Cristo, para ganhar os que vivem fora do regime da lei. Fiz-me fraco para com os fracos, com o fim de ganhar os fracos. Fiz-me tudo para com todos, com o fim de, por todos os modos, salvar alguns. Tudo faço por causa do evangelho, com o fim de me tornar cooperador com ele (1Co 9.19-23).

Mas você pergunta: alguém do contexto não teria um testemunho melhor?

Não necessariamente. Não entenda mal: Deus chama povos nativos a alcançarem os seus semelhantes, mas o evangelho “é o poder de Deus para a salvação de todo aquele que crê” (Rm 1.16). Além disso, o apóstolo escreve: “Eu, irmãos, quando fui ter convosco, anunciando-vos o testemunho de Deus, não o fiz com ostentação de linguagem ou de sabedoria. Porque decidi nada saber entre vós, senão a Jesus Cristo e este crucificado” (1Co 2.1-2).

E se Deus chamou Dan para o bairro historicamente branco, Marty para o bairro suburbano e a mim para um bairro afro-americano “para que a fé não se apoiasse em sabedoria humana, e sim no poder de Deus”? Deus pode colocar o vaso mais improvável em um bairro, de modo que a única explicação para o fruto seja a obra sobrenatural de Deus. O homem não pode fazer isso; somente Deus pode.

Motivos

Ainda assim, estimulados pelo apoio bíblico, é possível investir na obra transcultural sem examinar nossos motivos extra-bíblicos. Durante meus primeiros anos, muitas vezes fui questionado: “Por que você acha que deveria plantar uma igreja aqui?”. Isso, inicialmente, me surpreendeu enquanto eu tinha muito a aprender. Mas ao longo do tempo eu percebi que a questão era boa, porque vinha de um lugar intimamente familiarizado com a história da superioridade branca.

Se você deseja realizar o ministério transcultural, aqui estão algumas perguntas que você deveria estar disposto a fazer a si próprio:

  1. Por que estou aqui? Você está aqui por culpa, porque acha que pode ser um salvador, ou porque pensa implicitamente que esta é maneira de viver e que a igreja é superior?”.
  1. Estou disposto a me submeter a alguém de uma etnia diferente? Você tem um mentor familiarizado com esse contexto? Se não, por que não? Você está disposto a encontrar um? O que eles podem dizer sobre a sua decisão de plantar uma igreja aqui?
  2. Existe a necessidade de uma nova igreja? Existem outras obras evangélicas nativas com as quais você pode considerar unir-se? Você se submeteria a outro pastor nesse contexto? As outras igrejas aqui estão realmente doentes ou apenas estão operando a partir de um conjunto diferente de valores culturais?

Essencialmente, você deve se perguntar: “Mudei-me para este contexto desconhecendo a história racial e a dinâmica do país e da comunidade?”.

Minas terrestres

Com essas palavras de encorajamento e exame, permita-me também apresentar algumas potenciais minas terrestres:

Mina terrestre #1: Tentar ser alguém que você não é

Não há nada pior do que um homem branco que muda a sua linguagem ao falar com um afro-americano. Marty me conta sobre o seu amigo de vinte anos que ainda tenta “falar com gíria do jazz” com ele. “Ser tudo” não significa que você se esquece de que é branco e tenta se tornar alguém de outra etnia. Isso é apenas irritante; também é pedante. Lembre-se de seu contexto e reconheça quaisquer tensões que a sua presença possa suscitar.

Mina terrestre #2: Impor a sua própria cultura a outras etnias

Você tem uma cultura. O seu estilo de pregação, liturgia e hinos — incluindo o modo como você os canta — são influenciados pela cultura. Seu contexto cultural moldou as suas preferências de discipulado e ministério. Seus valores, política e a maneira como você fala sobre essas coisas estão repletos de certos padrões culturais.

Não seja como Pedro em Gálatas 2.11-14. Devido ao seu temor e respeito pelos líderes de sua própria cultura, Pedro rompe a comunhão com os gentios devido a questões culturais. Pedro exige que aqueles que são etnicamente diferentes se assemelhem a ele para que desfrutem de comunhão com ele. Paulo diz que “eles não estavam agindo de acordo com a verdade do evangelho”. O evangelho não permite que ninguém estabeleça as suas normas culturais como o padrão para o discipulado.

Mina terrestre #3: Desprezar aqueles que se parecem com você

Uma tentação inesperada para muitos que estão trabalhando em um contexto transcultural é um desdém sutil quando membros de sua própria etnia se unem à sua igreja. Meu amigo Dan me disse que demorou um pouco para lidar bem com o fato de que ele ainda atrai outros coreano-americanos para a sua igreja. Você encontrará pessoas de sua própria raça atraídas para a sua igreja por sua causa, e você deve lidar bem com isso. Não torne o trabalho transcultural um ídolo.

Mina terrestre #4: Tender para espaços familiares

Ao mesmo tempo, há outra tentação inesperada, e essa é a tendência para a familiaridade. Tem sido dito que o maior desafio missionário é permanecer missionário quando já estiver no campo. Você será atraído por se socializar, se misturar e se conectar com aqueles que se parecem com você e que são do mesmo contexto que você. Isso é natural. E, contudo, para permanecer como missionário, você deve lutar contra essas tendências naturais e desenvolver intencionalmente amizades transculturais; aprender a apreciar os valores, prazeres, ritmos e rotinas de seus novos vizinhos. Sacrifique o conforto e aprenda uma nova cultura. Torne-se tudo para com todos de modo que, pela graça de Deus, você possa ganhar alguns.

Conclusão

Fico feliz que você deseje servir em um contexto diferente da sua própria cultura. Isso demonstra que Deus derrubou os muros da divisão étnica em sua própria vida. À medida que você avança cuidadosamente com humildade e sabedoria, seja encorajado com o fato de que Deus frequentemente usa a obra transcultural para a sua própria glória.

Por: Joel Kurz. © 9Marks. Website: 9marks.org. Traduzido com permissão. Fonte: Church Planting across Ethnic Lines.

Original:Plantação de igrejas em diferentes contextos culturais e etnias. © Ministério Fiel. Website: MinisterioFiel.com.br. Todos os direitos reservados. Tradução: Camila Rebeca Teixeira. Revisão: André Aloísio Oliveira da Silva.