Um blog do Ministério Fiel
Os cristãos podem se casar com não-cristãos?
“Isso parece tão certo, tão certo. Como pode ser errado?”
Essas palavras foram escritas por Ben Weisman para serem cantadas por Elvis Presley, porém frequentemente tenho ouvido uma variação delas ditas por cristãos solteiros começando a se envolver de modo romântico com não-cristãos.
Então, isso muitas vezes é respaldado por uma enxurrada de outros comentários:
“Eu costumava pensar que a Bíblia afirmava que eu não deveria me pôr em jugo desigual com os incrédulos, mas examinei 2 Coríntios 6 em seu contexto e não parece estar falando sobre casamento, mas sim sobre como os cristãos devem ser separados dos não-cristãos dentro da igreja. Então, tentei encontrar um versículo que diga que um cristão não deve se casar com um não-cristão e não consegui encontrar nenhum. Conversei com cristãos em quem confio e eles também não conseguiram encontrar nenhum, nem mesmo um versículo! Então, acho que estava errado e estou livre para seguir nesse relacionamento.
De qualquer forma, ele/ela está realmente interessado(a) no evangelho e me disse que minha fé é algo que ele/ela acha realmente cativante e não desejaria mudar. Na verdade, acho que ele/ela será mais encorajador(a) da minha fé do que muitos cristãos seriam”.
Algumas tentações comuns a muitos solteiros — como lutar contra a pornografia — são moldadas de tal maneira que os cristãos sabem que estão errados, e, por isso, o problema será, muitas vezes, que, em sua culpa, eles ficarão escondidos. Uma vez confessado, o problema não é o reconhecimento de que eles pecaram; o problema é o lento e doloroso processo do arrependimento.
Mas a tentação de se envolver de modo romântico com um não-cristão tende a ser moldada diferentemente. As pessoas não tendem a ocultá-lo, mas sim a tentar justificá-lo — primeiro para si mesmas e depois para outros cristãos que estão tentando alertá-los sobre o caminho que estão seguindo. Se parece certo, então eles voltarão a olhar para a Bíblia para tentar provar que isso é certo.
Neste artigo, não tentarei propor um método para aconselhar pessoas que enfrentam tal tentação. Um artigo assim deveria incluir uma imagem mais clara do que é o casamento: tomar decisões sobre carreira, onde morar, como gastar o dinheiro, como criar os filhos, etc. Tudo isso é complicado quando você e seu cônjuge estão vivendo por coisas diferentes. Para examinar melhor algumas dessas questões, considere este artigo. Acima de tudo, tais conselhos envolverão um exame cuidadoso da motivação e um reexame da confiabilidade e da bondade de Deus que não nos chama a fazer concessões em nossa devoção a ele, mas a confiarmos nele.
Ao invés disso, oferecerei uma breve teologia bíblica sobre namorar com incrédulos. Quero demonstrar que é uma questão de obediência a Deus não buscar um relacionamento com um não-crente. Tentarei tornar tão claro quanto possível que, embora pareçam corretos, esses sentimentos são tentações para chamar de certo o que Deus chama de errado; esses sentimentos não são acompanhados por nenhuma confirmação da parte de Deus.
Se o raciocínio de alguém para não se envolver de modo romântico com um não-crente depende de alguns poucos textos de prova retirados do contexto, então tenho certeza de que esse raciocínio pode ser abalado em alguns poucos momentos diante de um par de olhos, de alguma atenção e da excitação de um relacionamento potencialmente satisfatório ao longo da vida.
Também é minha experiência dolorosa que, quando o fundamento fraco de tal convicção é removido no início de um relacionamento potencial, não haverá um momento em que alguém esteja em boa posição para examinar mais cuidadosamente o ensino da Bíblia e para construir um fundamento bíblico mais firme.
Uma breve teologia bíblica
A minha esperança é que este artigo seja de alguma utilidade para pessoas em tal situação, porém de mais utilidade para o cristão que, antes da tentação, precisa tomar uma decisão mais firme para não se envolver de modo romântico com um não-cristão.
E apenas para ser claro: envolver-se de modo romântico provavelmente acontecerá se você passar grande parte do tempo com alguém do sexo oposto a sós. Recentemente, tive uma conversa dolorosa com um amigo querido que disse que nunca havia planejado se envolver de forma romântica com determinada mulher. Mas ele passou horas e horas em conversa a sós com ela após a meia-noite durante várias semanas.
Se você não quer se envolver de modo romântico com determinada pessoa, não passe horas em contato com ela a sós. Se você está tendo boas oportunidades evangelísticas com alguém do sexo oposto, apresente essa pessoa a alguns cristãos piedosos do mesmo sexo. Se ele estiver realmente interessado no evangelho, ficará tão satisfeito em conhecer sobre o evangelho com eles quanto com você. Se o Senhor quiser que vocês se casem, ele deixará isso claro por meio da vinda dessa pessoa à fé!
Além disso, um texto de prova para não namorar um não-cristão é algo estranho de ser esperado por alguns motivos.
Primeiramente, namorar como entendemos realmente não acontecia nos tempos bíblicos. Em segundo lugar, “Com quem devo me casar?” é algo que deveria fluir de toda a teologia bíblica do que é o casamento, em vez de um ou dois meros versículos de regras.
Minha alegação é que, se é proibido para um cristão se casar com um não-cristão, é, no mínimo, uma tentativa deliberada de tentação namorar um não-cristão. Se você não pode se casar com um não-cristão sem uma conversão sobrenatural operada pelo Espírito Santo no coração dele, sobre o que você não tem controle, então, antes de mais nada, seria extremamente insensato e muito desagradável considerar esse casamento.
Agora, espero demonstrar quão claramente a Bíblia afirma que é pecaminoso para um crente se casar com um não-crente.
1) Gênesis 1: O casamento existe para exibir a imagem de Deus por meio da obediência aos mandamentos de Deus relativos à fecundidade e ao domínio.
Em Gênesis 1.26-28, Deus designa o casamento para ser uma parceria no governo da criação sob o seu domínio. Se não reconhecermos que estamos governando sob o governo de Deus, então estamos governando sob o governo de um ídolo, ou uma combinação de uma série de ídolos.
Falando de forma prática, isso impacta cada decisão que você precisa tomar como casal. Por exemplo, como você decide o que deve fazer em qualquer aspecto da sua vida? Você deveria:
1) Fazer o que agrada ao Senhor?
2) Fazer o que agrada a si mesmo?
3) Fazer o que agrada aos outros?
Para o cristão, o número 1 supera os números 2 e 3. Para os não-cristãos, há apenas 2 e 3.
2) Gênesis 2: O casamento é uma parceria para servir a Deus.
Gênesis 2 demonstra ainda mais esse fato. Gênesis 2.15-17 mostra como Adão é profeta/sacerdote/rei no reino do jardim onde Deus o colocou para governar dentro dos limites do reino supremo de Deus (simbolizado pelas duas árvores: benção e vida por viver sob o seu domínio; maldição e morte por recusar o seu governo). O restante do capítulo detalha como Adão é incapaz de cumprir o seu chamado para ser profeta/sacerdote/rei sozinho. Ele precisa de uma auxiliadora idônea para fazê-lo, então Eva é providenciada para que juntos eles cumprissem o chamado de Deus para glorificar o seu nome sob o seu domínio.
Logo, o casamento é uma parceria. “Não é bom que o homem esteja só” não é verdade principalmente porque o homem é solitário: é verdade porque ele é incompetente, mesmo antes da queda.
Deus não criou o homem sozinho para ser competente para cumprir o seu chamado quanto à imagem de Deus. Ele criou homem e mulher em relacionamento para fazerem isso. Homens e mulheres solteiros podem fazê-lo também, particularmente em relação à igreja sob o amor de Cristo, o cumprimento do casamento.
Então, em um casamento cristão, o casamento é uma parceria no evangelho. Por outro lado, casar com um não-cristão faz com que o casamento seja uma parceria em outra coisa.
Por que um cristão escolheria entrar em tal parceria?
3) Gênesis 3: o casamento é prejudicado pelo pecado.
Gênesis 3 nos mostra como o casamento é destruído pelo pecado. Adão e Eva, que antes viviam nus e não se envergonhavam, agora se escondem um do outro.
Na maldição, Deus pronuncia como o casamento após a queda é uma batalha de uma vontade pecadora contra outra:
“O teu desejo será para o teu marido,
e ele te governará” (Gn 3.16).
Isso significa que todos os casamentos são difíceis. Mas em um casamento cristão, os cônjuges têm a oportunidade de chamar um ao outro a submeterem as vontades pecaminosas à vontade perfeita de Deus. Ao se casar com um não-cristão, você perde a benção de ter um cônjuge que o chama a submeter a sua vontade a Cristo e, em vez disso, tem um cônjuge que não tem interesse algum em ser chamado a submeter a sua própria vontade a Cristo.
4) O Antigo Testamento adverte contra casar com os incrédulos.
No restante de Gênesis, vemos um enorme esforço feito para garantir que o povo de Deus só se casaria com aqueles que creem no Senhor.
Em Gênesis 24, vemos as grandes distâncias a que Abraão vai – combinado com a incrível resposta de Deus à oração — para garantir que seu filho Isaque se case com a crente Rebeca.
Em Gênesis 27.46-28.9, vemos o desgosto de Rebeca e Isaque com o casamento de seu filho com mulheres cananeias e heteias. Isso não é racismo: é religioso.
Em Gênesis 34.8-9, Hamor convida os filhos de Jacó a se casarem com as filhas de Siquém (uma cidade que acabara de provar o seu caráter no abuso de Diná). Casar-se com pessoas dessa cidade, em vez de se distanciar de tal contaminação, seria ceder completamente; isso destruiria o povo de Deus na primeira geração.
Na conquista de Canaã, o Senhor dá proibições estritas contra casamentos mistos:
“nem contrairás matrimônio com os filhos dessas nações; não darás tuas filhas a seus filhos, nem tomarás suas filhas para teus filhos; pois elas fariam desviar teus filhos de mim, para que servissem a outros deuses; e a ira do SENHOR se acenderia contra vós outros e depressa vos destruiria” (Dt 7.3-4).
Essa proibição é repetida em Josué 23.12, e a trajetória dos casamentos mistos nunca assume ou espera que os cananeus acabem sendo convertidos.
O casamento misto é também a queda de reis: mesmo do sapientíssimo Salomão (1Rs 11) e, obviamente, de Acabe (1Rs 16-19). Mais positivamente, um sinal de arrependimento para o povo de Deus foi o seu arrependimento de casamentos mistos em Esdras 9-10. Por outro lado, se um estrangeiro já fosse convertido, não havia absolutamente nenhuma proibição contra casar com um deles. Na verdade, isso é visto como positivo (Zípora, Raabe e Rute).
Toda essa evidência bíblica me faz pensar que “continuarei seguindo Jesus mesmo com um cônjuge incrédulo” é uma declaração muito orgulhosa que subestima a nossa própria fraqueza e presume sobre a graça de Deus.
- O Antigo Testamento retrata de modo positivo os casamentos entre crentes.
Positivamente, Provérbios 31 convoca o jovem a buscar uma mulher de caráter nobre. O auge do poema, e a fonte de tudo o que é nobre sobre ela, é alcançado no versículo 30:
“Enganosa é a graça, e vã, a formosura,
mas a mulher que teme ao SENHOR, essa será louvada”.
O que mais atrai você a um potencial cônjuge: charme, beleza ou temor do Senhor? Com um não-cristão, só há os dois primeiros: charme enganoso ou beleza vã.
Rute e Boaz estão entre os retratos mais belos dentre os crentes casados. Ele supre e protege; ela confia e toma uma iniciativa piedosa. É uma história de amor maravilhosa de como uma mulher que veio sob as asas do Senhor vem ao amor de um homem piedoso.
- Os textos do Novo Testamento implicam a proibição de casar com incrédulos.
No Novo Testamento, há uma série de observações que deixam claro que essa proibição do Antigo Testamento ainda é válida.
“A mulher está ligada enquanto vive o marido; contudo, se falecer o marido, fica livre para casar com quem quiser, mas somente no Senhor” (1Co 7.39).
“Não vos ponhais em jugo desigual com os incrédulos; porquanto que sociedade pode haver entre a justiça e a iniquidade? Ou que comunhão, da luz com as trevas?” (2Co 6.14).
Embora esse segundo versículo não seja explicitamente relacionado ao casamento e ofereça um princípio mais geral de que a igreja se mantenha separada da comunhão com os pagãos, que comunhão mais íntima alguém desejaria do que a comunhão com o próprio cônjuge? Alguém deseja um casamento que não seja uma comunhão? Na realidade, acabará por ser uma “comunhão” ou “parceria” em algo, mas não será uma parceria no evangelho e, portanto, tenderá a prender o crente exatamente como 2 Coríntios 6.14 adverte.
1 Coríntios 9.5: “E também o de fazer-nos acompanhar de uma mulher irmã, como fazem os demais apóstolos, e os irmãos do Senhor, e Cefas?”.
Isso sugere que ter uma esposa incrédula no mínimo desqualificaria para o ministério. Se você deseja ser um presbítero em uma igreja, então isso lhe desqualificaria.
Aqueles que exigem evidências do Novo Testamento para a proibição de casamentos mistos com incrédulos encontrarão esses textos. Simultaneamente, eles não encontrarão um único versículo com sequer uma sugestão de que a proibição do Antigo Testamento quanto a tais casamentos mistos seja revogada para o crente do Novo Testamento.
- Uma visão positiva mais clara para o casamento revelada no Novo Testamento.
O Novo Testamento oferece uma revelação mais clara do casamento: trata-se de uma parceria que representa o amor redentor de Cristo por sua igreja. O aspecto principal do casamento é retratar o evangelho (Ef 5.21-33; Ap 21.9-27). Além disso, ele retrata a própria relação entre o Pai e o Filho (1Co 11.3).
Casar com um não-crente é como dois artistas tentando pintar duas imagens diferentes na mesma tela. Você está tentando pintar uma imagem de Jesus e da igreja, mas o seu cônjuge está tentando pintar algo completamente diferente.
Ou, para fazer uma analogia musical, seria uma dupla onde uma pessoa está tentando cantar uma música e a outra está tentando cantar algo completamente diferente. Você canta: “Desejo que essa música seja sobre Jesus”, enquanto seu cônjuge canta: “É só você e eu”. Não pode haver harmonia verdadeira.
Quando um crente é casado com um não-cristão — seja por desobediência passada, por sua própria conversão ou pela apostasia de seu cônjuge após o casamento — essa é a música dolorosa, discordante, porém finalmente glorificadora de Deus que deve ser cantada. Porém, não é a canção para a qual o casamento foi concebido, e nenhum cristão deveria deliberadamente buscar compô-la.
Qual é o propósito da vida de um crente? Jesus nos diz em João 17: “E a vida eterna é esta: que te conheçam a ti, o único Deus verdadeiro, e a Jesus Cristo, a quem enviaste”.
O crente vive para conhecer — e ao conhecer, amar, honrar, adorar e seguir Deus por meio de seu Filho Jesus Cristo.
É muito melhor viver sem um cônjuge e na companhia da igreja, do que com alguém que vive por uma vida que não é eterna.