Um blog do Ministério Fiel
2 livros que todo pastor deve ler
Sem dúvida alguma há dois livros que todo pastor deve ler: “O pastor aprovado” de Richard Baxter e “O pastor como teólogo público” de Kevin J. Vanhoozer e Owen Strachan. Com propostas diferentes e sem contradição, esses livros nos ajudam no ministério pastoral de maneira brilhante.
Richard Baxter escreve com uma preocupação específica, o cuidado particular de todo o rebanho. Seu livro foi motivado por uma reunião de pastores em Worcester, no dia 4 de dezembro de 1655, para acordarem a catequização de cada membro nas suas respectivas igrejas. Por motivo de doença, Baxter não pôde comparecer, mas deixou essa joia rara escrita com os seus pontos de vista para aqueles obreiros.
O que torna o livro de Baxter mais precioso ainda é que ele não escreve somente a partir de princípios bíblicos, mas pela própria experiência com a sua congregação. Veja o seu relato:
“Passamos as segundas e terças-feiras, desde cedo de manhã até ao cair da noite, envolvendo umas quinze ou dezesseis famílias, toda semana, nesta obra de catequese. Com dois assistentes, percorremos completamente a congregação que tem cerca de oitocentas famílias, e ensinamos cada família durante o ano. Nem uma só família se negou a visitar-me a meu pedido. E vejo mais sinais externos de sucesso com os que vêm do que em toda a minha pregação pública. O grande número me força a tomar uma família completa por vez, uma hora cada. O secretário da igreja vai adiante, com uma semana de antecipação, para organizar os programas de horários e itinerário. Também guardo anotações daquilo que cada membro da família aprendeu, para poder continuar e ensiná-lo sistematicamente” (p.31).
A preocupação de Baxter é demonstrada mais na frente: “[aqueles] que me ouviram durante oito ou dez anos, ainda não sabem se Cristo é Deus ou homem. Admiram-se quando lhes falo do Seu nascimento, vida e morte. Ainda não sabem que as crianças têm o pecado original. Tampouco sabem da natureza do arrependimento, da fé, ou da santidade que deles se requer” (p. 173). O apelo dele é para seguirmos o exemplo de Cristo que usava do diálogo para pregar aos seus discípulos; de Paulo que pregava e ensinava a todos para não tornar o seu trabalho inútil (Gl 2.2.) e dava instruções pessoais (carcereiro em Atos 16); de Pedro que ao mesmo tempo que pregou publicamente em Jerusalém para uma multidão (At 2), também pregou a Cornélio e seus amigos (At 10); de Filipe que discipulou pessoalmente o eunuco (At 16); entre outros. O autor entendia que o ministério pastoral consiste em cuidar de todo o rebanho através da catequização pessoal (At 20.28), sem exceção. Ele chega a dizer que “o tamanho do rebanho deve ser determinado pelo número de pastores. Não poderão ser pastoreados todos, se não houver suficientes pastores na igreja, ou se a congregação for pequena o suficiente para possibilitar o cuidado pastoral de cada membro” (p. 110).
O versículo base para toda argumentação de Baxter é Atos 20.28: “Cuidem de vocês mesmos e de todo o rebanho sobre o qual o Espírito Santo os colocou como bispos, para pastorearem a igreja de Deus, que ele comprou com o seu próprio sangue”. A primeira parte do livro é direcionada ao coração do próprio pastor – “cuidem de vocês mesmos”. Baxter se preocupa com o caráter do obreiro e com a necessidade de ele ter experimentado a graça divina em sua própria vida. Ele chega a fazer um apelo corajoso pedindo o arrependimento público dos pastores perante suas congregações caso não tenham vivido de maneira exemplar. A segunda e terceira parte do livro é dedicada à outra metade do versículo: “e de todo o rebanho”. O autor chega a ser um pouco repetitivo e verboso por enfatizar constantemente a necessidade e obrigação pastoral em cuidar pessoalmente de todo o seu povo.
Sem dúvida alguma o livro de Baxter é um alerta a todos nós ministros do evangelho para não perdermos o rumo na nossa caminhada. Há hoje em dia uma tendência pecaminosa no ministério de se preocupar com a igreja somente como instituição ou “departamentalizar” o ministério em diversas áreas. É comum vermos pastores somente pregadores, ou administradores. Pastores não sabem mais os nomes de seus membros, não oram mais por eles e não se envolvem nas vidas de suas ovelhas. Precisamos de pastores à moda antiga. Temos perdido a essência do ministério pastoral!
Se o livro de Baxter nos chama ao cuidado pessoal do rebanho, o livro de Vanhoozer e Strachan nos convoca à necessidade de sermos bons teólogos. A preocupação dele é que a teologia foi separada do ministério pastoral: “Aqui jaz um pastor e um teólogo” (P.13), duas coisas distintas e não características de um único pastor. O que Deus uniu, o homem separou, e a preocupação dos autores é que o “teólogo no mundo acadêmico corre o risco de tornar-se uma mente sem corpo…” e que as “mentes teológicas [devem pertencer] a corpos eclesiásticos” (p. 15). Se a teologia continuar no “exílio” (p.18), a igreja se tornará uma “terra árida”, um local onde não é possível “cultivar ou desenvolver algo” (p.19).
Vanhoozer identifica um problema atual no ministério pastoral, as imagens distorcidas desse ministério: “liderança, diretor executivo, guru psicoterapêutico, agitador político, mestre, pregador de avivamento, construtor, treinador moral, ativista comunitário”, entre outras. A maneira de evitarmos esse erro é respondermos a sua pergunta crucial: “o que pastores têm a dizer e a fazer que seja papel exclusivamente seu?” (p. 26). O autor resume seu argumento da seguinte forma: “Primeiro, pastores são e sempre foram teólogos. Em segundo lugar, cada teólogo é, em certo sentido, um teólogo público, um tipo particular de intelectual, uma classe específica de generalista. […] Em terceiro lugar, o propósito de o pastor-teólogo ser um intelectual público é servir ao povo de Deus, edificando-o na ‘fé entregue aos santos de uma vez por todas’” (p. 36).
Por “teólogo”, o autor sugere que seu papel principal é “dizer o que Deus está fazendo em Cristo a favor do mundo”. Por “público”, significa que “pastores trabalham com o público de Deus e em favor dele, para o bem do público/povo em todos os lugares”. Por último, “intelectual” é “uma forma específica de generalista que sabe como relacionar grandes verdades a pessoas reais”. Vanhoozer acredita que pastores devem estar adiante das congregações e para isso devem ser fundamentados no evangelho e culturalmente competentes. Ele deve ser um “intelectual orgânico” que “enuncia com clareza as necessidades, convicções e aspirações do grupo social ao qual pertence.” Em outras palavras, “ele traz para o nível do discurso as doutrinas e os desejos da comunidade.”
Dois pontos merecem destaque no livro “O pastor como teólogo público”. O primeiro é que entre os capítulos do livro, os autores colocam as “perspectivas pastorais”, artigos de diversos pastores abordando, a partir da experiência e exegese bíblica, pontos importantes do ministério. Um outro ponto de destaque é o capítulo 2, escrito por Owen Strachan, sobre “uma breve história do ministério pastoral”. O autor traça um panorama histórico brilhante de pastores teólogos, desde Ireneu de Lião (130-200 d.C.) até os dias atuais, destacando os grandes nomes da nossa fé como exemplos de ministério. A intenção com esse capítulo é demonstrar que a Igreja cristã sempre acreditou que pastores devem ser bons teólogos à serviço da igreja local. Segundo o autor, foi somente no final do século 19 e no início do século 20 que “pastores concederam aos acadêmicos a condição de líderes intelectuais, abrindo mão de boa parte da grade de disciplinas que o Cristo de Kuyper (e de Edwards) havia reivindicado: ‘Minha!’” (p.122).
Me resta uma última observação sobre os dois livros. A necessidade que temos para considerar essas duas obras, é porque, se ao mesmo tempo elas estão preocupadas com áreas distintas do ministério pastoral, essas áreas andam de mãos juntas! Baxter nos convida ao cuidado pessoal do rebanho, Vanhoozer e Owen nos ensinam que sem a teologia pública, o nosso serviço ministerial estará comprometido.
Não devemos decidir qual caminho escolher, devemos percorrer pelos dois. Sem uma dessas “asas” nosso voo perderá seu rumo, e o que nos aguarda é a queda.