Um blog do Ministério Fiel
O coração do meu bebê parou de bater
Alguns dias atrás, meu marido e eu voamos para San Diego, minha cidade favorita para visitar. Eu estava sentada na fila atrás dele, quase tonta de emoção, ansiosa por um alívio do estresse que me atormentara nas últimas duas semanas.
Eu estava ao lado de uma mulher que estava falando alto em seu telefone sobre sua amiga que estava grávida novamente. Ela desagradavelmente replicou que o marido de sua amiga dizia que ela é mais bonita quando está grávida: “Provavelmente apenas para conseguir mais filhos dela”, ela brincou. Fiquei ouvindo por um tempo até perceber que a mulher ao telefone também estava grávida.
Então fui tomada por um momento desagradável.
“Como é que ela pode ter um bebê, mas eu não? Ela parece odiar crianças. Eu as adoro. Isso não é justo”.
Assim que esse pensamento me veio à cabeça, me senti terrivelmente culpada. Eu sei que não se deve pensar nessas coisas e, quando pensa, certamente não é legal admiti-las. Mas lá estava, claro como o dia: eu estava com inveja.
Adeus Felicidade
Quando meu marido e eu descobrimos que estávamos esperando um bebê, não ficamos surpresos. Claro, eu passei por aquele momento chocante de olhar para o teste, mãos trêmulas, olhos arregalados, a maternidade pairando sobre mim. Mas apesar de Phillip e eu estarmos casados há apenas um mês, eu cresci ouvindo meu pai brincar sobre a eficiência dele e de minha mãe (nasci dez meses depois que eles se casaram). Só para mencionar, eu cresci em uma comunidade da igreja onde as crianças seguem o casamento tão inexoravelmente quanto a noite segue o dia. Duas de minhas amigas e seus maridos que se casaram um pouco antes de mim, receberam recém-nascidos com apenas uma semana de intervalo, no ano passado.
Eu considerei sobre contar a alguém que estávamos esperando um bebê, mesmo sabendo que o risco de aborto espontâneo é maior durante o primeiro trimestre. Para o meu marido, era óbvio: que as pessoas se regozijem conosco enquanto nos regozijamos. E se houver luto, lamentaremos juntos (Romanos 12.15). Eu ainda esperei duas semanas antes de tornar a notícia pública, mas a contei a meus amigos e colegas de trabalho imediatamente.
E então eu comecei a me preocupar.
Eu sou uma pessoa preocupada por natureza, e o roer de unhas se estendeu à minha nova gravidez. Passei seis semanas acordando com suores noturnos, com medo de que algo tivesse acontecido com meu filho – aquele pequenino mirtilo[i] que eu já amava tanto. Então, durante a sétima semana, senti que havia chegado a um lugar mais seguro. Eu estava mais calma, capaz de apreciar meu corpo em mudança e a maravilha da criança crescendo dentro de mim.
Até então, eu não sabia que o coração do meu bebê havia parado de bater.
Quando o ultrassom nos informou disso, senti a maior dor no estômago que já havia experimentado na minha vida. Ainda dói. Sempre vai doer, suponho.
Para que serve isso?
A pior coisa que imaginei que pudesse acontecer, nas últimas semanas, aconteceu duas semanas atrás. Deitei no chão do nosso apartamento sofrendo fisicamente, emocionalmente e espiritualmente, lutando com mais dor em todas as maneiras do que jamais eu havia sentido, e gritei: “Por quê”?
Sou uma “boa moça cristã” de uma “boa família cristã”, então sei que não devo perguntar: “Por que eu”? Sim, é claro, mereço a morte, o inferno e a sepultura (Romanos 3.23). Nos momentos mais difíceis, a resposta da escola dominical de que eu estava indo “melhor do que eu merecia” ecoou dentro de mim. Ainda assim, não pude deixar de me sentir enganada.
Aqui estava eu, com uma dor insuportável, lágrimas escorrendo – por um bebê que me causou tanta alegria em tão pouco tempo – um bebê que eu nunca conseguiria segurar.
No minuto em que descobri que estava grávida, fiquei ansiosa por conhecer a pequena pessoa a qual o Senhor me abençoara em ser mãe. Eu me perguntava sobre o futuro dele, seu lugar em minha casa, seu impacto em nossas vidas. Eu crescia em amar essa pessoa mais e mais a cada dia.
Eu amo crianças eu cresci em torno delas, eu as ensino, quero uma casa cheia delas. Eu mal podia esperar para ser mãe – mal podia esperar para cuidar do meu próprio filho. Mas agora meu filho estava morto. Eu me senti como o salmista: “Que proveito obterás no meu sangue, quando baixo à cova? Louvar-te-á, porventura, o pó? Declarará ele a tua verdade” (Salmo 30. 9)? Às vezes não podemos deixar de perguntar: Deus, o que o Senhor está fazendo?
Seu Propósito Intrépido
Mesmo naquela dor excruciante, o sofrimento do Senhor em meu favor veio para apoiar.
E não quero dizer que fiquei sentada cantando “Amazing Grace” enquanto ondas de dor e pesar inundavam meu coração. Estava longe de ser uma visão bonita. Eu clamei a Deus – literalmente, guturalmente – e senti-me próxima do sofrimento do Salvador, que havia experimentado uma dor ainda mais insuportável por mim, não porque ele perdeu um filho, mas porque deu tudo de si para levar para casa os filhos perdidos.
Ele dá propósito ao nosso sofrimento (Romanos 8.28). Meu aborto espontâneo não aconteceu no vácuo. Eu e meu filho fomos criados à imagem de Deus, projetados para a sua glória. Minhas intenções para a vida de meu filho não eram as intenções do Senhor, e minha agenda não era a agenda dele. Ele escolheu que o propósito dessa pequena pessoa fosse cumprido durante sete semanas de vida. Ele escolheu que meu propósito fosse ainda mais revelado através da morte daquele pequeno.
Ele me escolheu para ser mãe do meu filho por sete semanas. Ele escolheu que eu e meu marido aprendêssemos a caminhar juntos pelas neblinas hormonais, para que meu marido mostrasse amor sacrificial por sua esposa cansada. Ele escolheu que andássemos juntos pela tristeza e proclamasse sua grandeza mesmo através da nossa dor (Jó 13.15).
Eu fui mãe. Foi apenas por um momento, mas foi um momento bonito. Espero ser mãe de novo, mas mesmo que isso não aconteça, Deus é bom. E seus propósitos para mim são seguros. Minha pequena fatia da maternidade continua me mostrando diferentes ângulos do bom caráter de Deus e coisas sobre mim que nunca poderia ter aprendido sem meu bebê. Por isso, sou grata. Deus é o autor da vida e o único que tudo satisfaz. Ele cumprirá seu propósito por nós (Salmo 57.2) e, com isso, eu sou consolada.
[i] NE.: Mirtilo (Blueberry) é uma fruta originária da América do Norte, bastante usada na culinária americana.