Colocando a igreja online na era do Coronavírus

Como a maioria dos outros pastores e líderes de igrejas nas últimas semanas, estou no meio da confusão. A rápida disseminação do COVID-19 nos impôs um enigma eclesiológico. O que significa ser uma “igreja” em tempos como esse? Quanto importa que continuemos a nos reunir fisicamente, em meio a esses medos e incertezas? Essa decisão é sensata ou imprudente? Em que ponto estamos sendo resolutos ou descuidados?

Para aumentar a confusão para mim, estou me preparando para lançar um livro no final de março, no qual sugiro, em termos inequívocos, que a igreja sempre foi e sempre será uma realidade “analógica” – uma comunidade onde os crentes ignoram as conveniências das “conexões” digitais para se comunicarem uns com os outros em tempo real e em proximidade. Minha crítica ao uso do vídeo e à igreja online agora está tomando novas e inesperadas cores.

À luz dos acontecimentos recentes, aqui estão algumas questões a serem consideradas ao navegarmos nesses dias de ansiedade.

Compromisso, não Conveniência

Dada a rápida crise do COVID-19, muitas igrejas descobrirão que direcionar as pessoas para as reuniões on-line não é apenas uma opção viável, mas também uma necessidade. Em muitos locais do mundo, o impedimento, imposto pelo governo, às grandes reuniões, estão forçando uma mudança dos costumes.

Isso está se tornando cada vez mais realidade onde eu moro e sirvo. A universidade local acabou de encerrar as aulas presenciais pelo resto do trimestre. Escolas públicas de todos os tamanhos estão começando a fazer o mesmo. Até agora, igrejas como a nossa receberam apenas uma forte recomendação nessa direção, mas a tendência é caminhar no sentido de cessar todas as reuniões onde haja um número considerável de pessoas. O distanciamento social parece ser a única solução viável para interromper ou pelo menos retardar a propagação do vírus.

Enquanto direcionamos temporariamente nossas congregações para esses espaços on-line, é de extrema importância que esclareçamos essa realidade digital como um compromisso temporário e não como uma conveniência contínua. Nossa clareza nesse sentido, ou a falta dela, será formativa de uma maneira ou de outra. Não se engane, é conveniente sentar no conforto e segurança de nossas casas para assistir a um sermão em nossa televisão ou computador. E a conveniência tem um meio de desfazer rapidamente o trabalho de disciplina de longa data. Se acreditamos que a reunião como igreja, em tempo real e no espaço físico é fundamental (e isso é verdade), nossa realidade on-line temporária deve ser vista como um compromisso circunstancial, até que possamos voltar à imprescindível reunião em carne e osso.

Quando vejo minha esposa e meus filhos pelo Face Time, em minhas viagens, fico grato por essa “pseudoconexão”. Mas o que mais quero é chegar em casa, abraçar e acolher meus entes queridos em meus braços. Portanto, assim deve ser também nesses tempos de compromisso eclesiológico.

Aproveitando o Momento e o Meio

Ao entrarmos nessa nova realidade digital, por um tempo, podemos aproveitar o momento e o meio de maneiras úteis. Embora nos falte a presença física de nossa comunidade, durante esta temporada on-line, as várias plataformas que usamos nos oferecem oportunidades para reimaginarmos várias de nossas práticas regulares de adoração, de maneiras que podem nos conectar de forma única e acentuar nosso desejo de estarmos verdadeiramente uns com os outros, uma vez que isso se torne possível novamente.

A maioria das plataformas de transmissão ao vivo inclui uma opção de bate-papo. Nesta temporada de reuniões on-line pode se pregar e ensinar um pouco mais de diálogo do que normalmente podemos experimentar em uma reunião física de domingo. Para pastores e líderes da igreja, incluir um elemento de conversação, após o sermão, pode nos servir bem nesta temporada. Fazer isso pode ajudar a diminuir o fosso digital, convidando aqueles que assistem on-line a não apenas emprestar olhos e ouvidos, mas também pensamentos, ideias e perguntas. Essa abordagem também enfatiza a reunião “ao vivo”, instando as pessoas a chegar on-line em um horário definido com outras pessoas, o que ajuda a atenuar a tentação de ver a experiência da igreja on-line como uma conveniência a ser acessada quando quiser.

Uma abordagem semelhante pode ser aplicada à oração. Incentivar as pessoas a compartilhar on-line as necessidades de oração em tempo real é algo que a maioria das igrejas on-line já faz. Embora orar um pelos outros através do abismo da distância digital não tenha a profundidade da presença humana física, ainda pode ser uma maneira poderosa de nos amarmos uns aos outros enquanto estamos separados. Na melhor das hipóteses, pode até agir como uma introdução acessível entre indivíduos que, em seguida, poderão caminhar em direção a uma conexão pessoal mais significativa na vida da igreja.

Na maioria das igrejas, já existe uma dinâmica grande/pequena, ajuntamento/dispersão. Existem os “grandes” ajuntamentos de adoração dominical e, também, os “pequenos” grupos que se “espalham” por nossas cidades, bairros e vilas. Durante essa temporada imprevista, podemos incentivar as pessoas a se reunir em pequenos grupos, não apenas durante a semana, mas também, quando possível, durante as reuniões de adoração on-line “ao vivo”. Embora possamos não ser capazes de nos reunir como um corpo maior, ainda podemos nos reunir como membros, pequenos e dispersos quanto possível.

Esforçando-nos Para nos Vermos Uns aos Outros

“No amor não existe medo; antes, o perfeito amor lança fora o medo.” (1Jo 4.18) deve ser um refrão comum para os cristãos em tempos como esses. É importante lembrar que a palavra grega “perfeito” aqui é teleia, que significa “um objetivo ou finalidade”. O tipo de amor que lança fora o medo é o amor de Deus, que nos aponta na direção de nosso fim principal e do definitivo novo começo de Deus. Aqui está o que sabemos com certeza: se o COVID-19 não nos matar, outra coisa acabará nos matando. O período quaresmal nos lembra isso: somos pó e voltaremos ao pó. Mas os seguidores de Jesus não permanecerão lá. Essa é a nossa última esperança.

E essa é uma das razões pelas quais a igreja continua a se reunir, cantar, ouvir, orar, servir, participar do pão e do cálice na comunhão. É um meio de incorporar e antecipar, fisicamente, nossa esperança futura no aqui e agora. As circunstâncias atuais podem impedir muitos de nós de nos reunirmos fisicamente nas próximas semanas e talvez meses. Certamente devemos agir com sabedoria e responsabilidade. Mas, no espírito do apóstolo Paulo, enquanto estivermos separados, que possamos “com tanto mais empenho diligenciamos, com grande desejo, ir ver-vos pessoalmente.” (1Ts 2.17).

Por: Jay Kim. © The Gospel Coalition. Website: thegospelcoalition.org. Traduzido com permissão. Fonte: Taking Church Online in a Coronavirus Age.

Original: Deixando a igreja online na era do Coronavírus. © Ministério Fiel. Website: MinisterioFiel.com.br. Todos os direitos reservados. Tradução: Paulo Reiss Junior. Revisão: Filipe Castelo Branco.