A igreja precisa de alvará municipal?

Outro assunto que está no TOP 10 dos temas do Direito Religioso: Alvará Municipal. Será que o município pode exigir alvará para permitir que a Igreja funcione? Seria o alvará um documento indispensável ao ponto de a municipalidade incorporá-lo como condição para o funcionamento das igrejas? O Município pode ameaçar de fechamento um Igreja que não tenha o alvará? Vamos por partes:

A vedação ao embaraço muitas vezes é mitigada pelos municípios brasileiros que obrigam às organizações religiosas a possuírem alvará, diga-se de passagem, de forma ilegal e arbitrária, como se associação civil fossem. O simples fato da emissão do alvará, para fins de organização municipal, não enseja desrespeito às normas constitucionais; todavia, como requisito de funcionamento ou do que quer que seja, o torna ilegal, pois contraria o Decreto federal n.º 119-A/1890, além de infringir o texto constitucional.

Exemplo de afronta à Constituição Republicana e ao Decreto nº 119-A é a exigência de que a igreja possua alvará de localização e/ou funcionamento para requerer a imunidade de IPTU de seu templo. Sempre que o Poder Público Municipal exigir a juntada de alvará de localização e/ou funcionamento para a propositura do pedido de imunidade religiosa, o servidor público municipal deverá certificar a negativa para que a Organização Religiosa possa impetrar o devido remédio constitucional do mandado de segurança. Cumpre lembrar que o servidor público é obrigado a emitir certidão nesse sentido, sob pena de prática de crime de prevaricação, previsto no art. 319 do Código Penal, por deixar de praticar ato de ofício em que é obrigado nos termos do art. 5º, XXXIV, “b”, da Constituição Brasileira.

Os direitos líquidos e certos ofendidos pela Administração Pública Municipal são diversos, dentre os quais podemos citar o decreto-lei 119A/1890, bem como o art. 19, I, da Constituição Brasileira, entre outros dispositivos constitucionais que garantem a liberdade religiosa, o livre exercício de culto e vedam qualquer embaraço estatal ao exercício pleno da religiosidade. A autoridade coatora será o prefeito municipal ou o secretário municipal correspondente à pasta da fazenda municipal.

Na hipótese de recebimento do pedido de imunidade que culmine, após superada a fase recursal, em negativa do reconhecimento de imunidade religiosa pela ausência de alvará, a organização deverá procurar o Poder Judiciário para a obtenção da Imunidade Tributária Religiosa. O processo ocorre por meio de uma ação declaratória, inclusive com pedido de inconstitucionalidade pelo controle difuso, com efeito interpartes, a qualquer dispositivo legal municipal que estipule a existência de alvará municipal pela organização religiosa para que seja imune a impostos nos termos da Constituição Brasileira.

O decreto nº 119-A/1890 esgrima quaisquer dúvidas, como é possível verificar:

Art. 1º É proibido à autoridade federal, assim como à dos Estados federados, expedir leis, regulamentos, ou atos administrativos, estabelecendo alguma religião, ou vedando-a, e criar diferenças entre os habitantes do país, ou nos serviços sustentados à custa do orçamento, por motivo de crenças, ou opiniões filosóficas ou religiosas.

Art. 2º A todas as confissões religiosas pertence por igual a faculdade de exercerem o seu culto, regerem-se segundo a sua fé e não serem contrariadas nos atos particulares ou públicos, que interessem o exercício deste decreto.

O texto legal é claro e imperativo no sentido de que o Estado não deve embaraçar o funcionamento dos cultos religiosos e suas diversas manifestações.

Então, finalmente para que serve o  Alvará? Respondendo: após o registro do estatuto social da organização religiosa, e de posse da devida inscrição no Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas, deverá ser procedido o Cadastro de Contribuinte Municipal junto à prefeitura local; malgrado serem imunes, as organizações religiosas possuem outras obrigações perante os entes públicos, tais como o pagamento de taxas e contribuições. Com o cadastro efetivado, a organização religiosa poderá encaminhar o Alvará de Localização e/ou Funcionamento, outro documento que não é obrigatório, como já referido, entretanto, agiliza outros processos junto aos poderes públicos, como o requerimento de imunidade de IPVA de veículo automotor de propriedade da igreja, exigido por alguns estados (exigência que pode ser contestada, inclusive), por exemplo.

Ou seja, nada mais é do que um facilitador.


Este texto contém excertos do livro: Direito Religioso: Questões Práticas e Teóricas [3ª Ed. Rev. e ampl. São Paulo, Vida Nova.]