Um blog do Ministério Fiel
A criança e o bebê
Eu ouvi apenas o burburinho — muito barulho sobre o recente caso de aborto.
De certa forma, tenho tentado me manter, disciplinadamente, distante da “pauta do dia”. Há muito ruído e toda a gritaria e o excesso de informação ocupam um espaço mental que atrapalha bastante a saúde e a produtividade. Tudo isso sem falar na manipulação constante dos meios de comunicação, e na perda de foco naquilo que é eterno.
Mas essa é outra conversa. O fato é que eu apenas ouvi o burburinho sobre uma criança de 10 anos, estuprada, que engravidou e estava prestes a realizar um aborto.
O barulho das redes revelava duas grandes inclinações – uma favorável ao aborto, e outra contrária. E as inclinações logo foram instrumentalizadas por dois grandes partidos: abortistas e anti-abortistas.
A discussão do aborto é inevitável. E, sendo esse um tema tão importante, é perfeitamente impossível entender a gritaria. Mas algo me incomodou.
Eu não quero entrar na discussão simplesmente para falar algo a favor ou contra o aborto. Muitos já estão fazendo, e fazem melhor do que eu. Apenas quero apontar uma perspectiva sobre a discussão.
O meu incômodo se deu porque, no meio da gritaria, a criança e o bebê pareciam estar sumindo.
Primeiramente, percebi certa polarização entre a criança e o bebê. É como se você tivesse que escolher um dos lados: ou você defende a criança — e não liga para o bebê —, ou defende o bebê — e a criança que “se vire”.
Mas quem disse que temos de escolher um lado? Quem definiu que apenas um dos dois pode (deve) ser amado?
É claro que nem todos pensam assim. Mas essa foi a minha impressão ao ver a discussão.
E logo percebi um segundo movimento, que decorria desse primeiro: a criança e o bebê não eram apenas colocados um contra o outro, mas começavam a sumir entre os adultos que gritavam no espaço público.
Criança e bebê foram despersonalizados, transformados em “símbolos de uma causa”. Nunca é bom quando um homem, de carne e osso, é transformado em uma ideia. Ideias sempre são menores do que pessoas. Ideias não carregam a imagem e semelhança de Deus em si.
Momentos assim inevitavelmente levantarão a discussão acerca do aborto e suas possibilidades. Mas transformar o dilema de uma criança real e um bebê real em mero instrumento da causa abortista ou antiabortista é fazer violência à criança e ao bebê.
Abortistas querem defender a criança, e a violentam ao despersonalizá-la. Anti-abortistas querem defender o bebê, e o violentam ao despersonalizá-lo.
Eu não vim propor uma solução ao debate. Vim propor que, antes de levantar a discussão abstrata (com implicações práticas, sem dúvida), aprendamos a amar a criança e o bebê, com nome e rosto, e a chorar por uma situação tão difícil.
A discussão terá que acontecer, pois os abutres não desperdiçam a carniça. Mas um coração alinhado pode fazer toda diferença em nossa capacidade de olhar para a situação concreta, e de discutir as abstrações com ousadia e amor.