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As mulheres devem ficar caladas nas igrejas? (1 Coríntios 14.34)
A interpretação de 1 Coríntios 14.34-35 provou ser mais do que um pouco controversa ao longo dos anos. A razão para isso se deve, em grande parte, ao choque que este texto traz às sensibilidades igualitárias modernas. Paulo escreve:
“33bComo em todas as igrejas dos santos, 34conservem-se as mulheres caladas nas igrejas, porque não lhes é permitido falar; mas estejam submissas como também a lei o determina. 35Se, porém, querem aprender alguma coisa, interroguem, em casa, a seu próprio marido; porque para a mulher é vergonhoso falar na igreja.”
O que está acontecendo nesses versículos? Paulo realmente quer dizer que as mulheres nunca devem dizer nada em um culto de adoração? É assim que algumas pessoas leram esses versículos ao longo dos anos, mas acho que é uma leitura incorreta do texto. Por quê? Para começar, isso criaria uma contradição incorrigível com o que Paulo diz em 1 Coríntios 11.5, que indica que as mulheres estavam “orando e profetizando” na igreja. Paulo não repreende suas orações e profecias na igreja. Ao contrário, ele lhes dá instruções sobre como fazer isso da maneira certa – de uma maneira que lhes permita falar, mas que ao mesmo tempo honre a liderança masculina.
Mulheres profetizando na assembleia estavam de acordo com o que o apóstolo Pedro disse ser característico do dom do Espírito da Nova Aliança predito em Joel 2: “E acontecerá nos últimos dias, diz o Senhor, que derramarei do meu Espírito sobre toda a carne; vossos filhos e vossas filhas profetizarão” (At 2.17). Quem vai profetizar? Filhos e filhas.
Portanto, se você considera o versículo 34 uma proibição absoluta de mulheres falarem em um culto de adoração, então você adotou uma interpretação que faz o capítulo 14 contradizer o capítulo 11. E isso não pode ser, porque Deus não pode se contradizer.
A alegada contradição levou alguns intérpretes a sugerir que os versículos 14. 34-35 não foram realmente escritos por Paulo. Eles argumentam que algum escriba deve ter vindo depois de Paulo e colocado esses versículos na carta de Paulo. O único problema com essa visão é que cada manuscrito grego de 1 Coríntios que temos inclui esses versículos. Há um punhado de manuscritos nos quais os versículos aparecem após o versículo 40. Mas isso não é evidência de que os versículos 34 e 35 não são originais de Paulo. É uma evidência de que alguns escribas procuraram preservar o fluxo do argumento de Paulo, sobre a profecia, movendo esses dois versículos para o final. Eles estavam errados em fazer isso, mas estaríamos fazendo pior do que eles em retirá-los do texto completamente.
Não, esses versículos são originais de Paulo. Isso significa que temos uma contradição com o capítulo 11? Comentaristas como Richard Hays argumentam que há de fato uma contradição clara entre os capítulos 11 e 14. Hays escreve:
Com respeito à questão da liderança pública das mulheres, existem boas razões teológicas para insistir que devemos ser guiados pela visão de Paulo da adoração cristã em que os dons do Espírito são dados a todos os membros da igreja, homens e mulheres, para a construção da comunidade. Os poucos textos do Novo Testamento que buscam silenciar as mulheres (como 1 Coríntios 14: 34-35 e 1 Timóteo 2: 11-15) não devem ser autorizados a ignorar essa visão. [1]
Hays não apenas postula uma contradição dentro da escritura, mas também argumenta que os leitores precisam escolher qual escritura é certa e qual é errada. Para Hays, o igualitarismo de 1 Coríntios 11 é claramente preferível à subordinação das mulheres em 1 Coríntios 14: 34-36. Por essa razão, ele abraça a primeira e rejeita a última escritura como um erro.
“Com respeito à questão da liderança pública das mulheres, existem boas razões teológicas para insistir que devemos ser guiados pela visão de Paulo da adoração cristã em que os dons do Espírito são dados a todos os membros da igreja, homens e mulheres, para a edificação da comunidade. Os poucos textos do Novo Testamento que pretendem silenciar as mulheres (como 1 Coríntios 14. 34-35 e 1 Timóteo 2.11-15) não autorizam ignorar essa visão”[i].
Hays não apenas postula uma contradição dentro da escritura, mas também argumenta que os leitores precisam escolher qual texto é correto e qual é errado. Para Hays, o igualitarismo de 1 Coríntios 11 é claramente preferível à subordinação das mulheres em 1 Coríntios 14.34-36. Por essa razão, ele abraça o primeiro texto e rejeita o último como um erro.
É claro que a abordagem de Hays violenta a inspiração e autoridade das Escrituras e deve ser rejeitada pelos cristãos sérios. Sua abordagem também falha em ler esses versículos no contexto. Paulo está ordenando às mulheres que fiquem em silêncio em um determinado ambiente – durante o julgamento das profecias. Lembre-se do que Paulo acabou de dizer nos versículos 29 e 32:
“29Tratando-se de profetas, falem apenas dois ou três, e os outros julguem. … 32Os espíritos dos profetas estão sujeitos aos próprios profetas.”
Os profetas não devem apenas profetizar, mas também avaliar outras profecias para ver se são verdadeiras. Por quê? Porque os espíritos dos profetas estão sujeitos aos profetas. Um profeta deve se submeter à avaliação de outros profetas.
Mas isso cria um problema potencial para o princípio de liderança. O que acontecerá se o marido profetizar e a esposa também for profetisa? O marido deve estar sujeito à esposa durante o julgamento das profecias? Os maridos e esposas devem suspender a liderança masculina durante a adoração corporativa? A resposta de Paulo a essa pergunta é um claro não.
Paulo não quer que nada aconteça, durante a adoração corporativa, que perturbe o princípio da liderança que ele tão cuidadosamente os exortou a obedecer em 1 Coríntios 11.2-16. Por essa razão, ele ordena às mulheres, neste contexto, que se abstenham de julgar as profecias. Ele não está ordenando um silêncio absoluto por parte das mulheres. Na verdade, ele já revelou que elas estão de fato orando e profetizando. Ele, no entanto, ordena que elas se calem sempre que as profecias estiverem sendo julgadas. E as mulheres devem fazer isso em deferência à liderança masculina.
Observe que a explicação no versículo 34 indica que a liderança é, de fato, o problema: “as mulheres …estejam submissas”. A palavra grega traduzida como “submissão” é a mesma para a “sujeição” do versículo 32. Uma mulher não pode estar sujeita a seu marido enquanto simultaneamente esperando que ele se submetesse aos julgamentos dela sobre sua profecia. Para evitar esse conflito, Paulo diz que embora as mulheres possam profetizar, elas não podem participar do julgamento das profecias[ii]. Nesse caso, o julgamento das profecias equivale ao ensino, o que Paulo proíbe absolutamente em 1 Timóteo 2.12.
Paulo então instrui:
“35Se, porém, querem aprender alguma coisa, interroguem, em casa, a seu próprio marido; porque para a mulher é vergonhoso falar na igreja.”
Se uma mulher tiver dúvidas sobre uma profecia, ela deve reservar todas as discussões para conversas particulares com o marido. Ela não deve levantar questões ou objeções durante o culto de adoração. Por quê? Pois é vergonhoso para ela “falar” de qualquer maneira que possa sugerir uma subversão da liderança masculina. A palavra traduzida como “vergonhoso” é usada apenas mais uma vez em 1 Coríntios – no capítulo 11.6, onde Paulo mais uma vez está falando sobre potenciais violações da liderança masculina.
Novamente, Paulo não é contra as mulheres falarem de modo geral. Ele reconhece que elas estão orando em voz alta e profetizando em voz alta na assembleia (1Co 11.5). Ele simplesmente não quer que elas julguem as profecias na assembleia porque isso violaria a norma de liderança.
Se essa interpretação estiver correta, então há pelo menos duas implicações que devemos levar em consideração durante a adoração em nossas próprias congregações.
Primeiro, estaremos indo além do exemplo da escritura se excluirmos o que Paulo claramente permite – mulheres orando e compartilhando a revelação de Deus durante os cultos de adoração. Acontece que sou um cessacionista, o que significa que não acredito que a profecia seja uma experiência contínua nas igrejas de Cristo. Dito isso, a revelação de Deus ainda tem um lugar em nossos cultos de adoração por meio das escrituras. Hoje, ler em voz alta a revelação de Deus nas escrituras é o equivalente funcional de profetizar a revelação de Deus nos dias de Paulo. Biblicamente falando, seria totalmente de acordo com as instruções de Paulo as mulheres lerem as escrituras e orarem durante a assembleia reunida do povo de Deus. Ambas as coisas podem ser feitas de uma forma que honre o princípio da liderança (cf. 1Co 11.2-16). Existem várias maneiras de aplicar isso em uma igreja local. Em minha própria igreja, isso significa que temos mulheres orando e lendo as escrituras em nossas reuniões semanais de oração e em cultos especiais (na Páscoa no Natal). Em nossa adoração semanal regular, entretanto, o serviço é dirigido e liderado pelos homens da igreja.
Segundo, seria uma violação do princípio da liderança as mulheres ensinarem ou exercerem autoridade na adoração corporativa. Na terminologia de Paulo, “ensino” envolve explicar e aplicar uma revelação já dada. O julgamento das profecias teria incluído avaliações e correções que são o equivalente funcional do ensino. É por isso que Paulo não deseja que as mulheres julguem as profecias na assembleia reunida. Seria como permitir que ensinassem e exercessem autoridade – algo que ele claramente proíbe em 1 Timóteo 2.12: “E não permito que a mulher ensine, nem exerça autoridade de homem; esteja, porém, em silêncio.”
Paulo tem um último item que vale a pena comentar:
“36Porventura, a palavra de Deus se originou no meio de vós ou veio ela exclusivamente para vós outros?”
Lembre-se de que Paulo começa sua ordem com um apelo sobre como as coisas são feitas “em todas as igrejas” (v.33b). Por que isso foi uma consideração relevante? A palavra de Deus não é domínio exclusivo de nenhuma igreja. A palavra de Deus não se originou em Corinto, nem foi o único lugar ao qual ela chegou. A palavra de Deus está espalhada pelas igrejas. Os coríntios precisam prestar atenção em como o Espírito de Deus está se movendo e trabalhando em todas as igrejas. Se todas as igrejas estão ouvindo uma coisa do Espírito, mas os coríntios estão praticando outra coisa, então isso é uma boa indicação de que os coríntios são os discrepantes, não todos os outros. Todo mundo está observando a liderança masculina. O mesmo deve acontecer em Corinto. Como Paulo escreve sobre a liderança em 1 Coríntios 11.16: “nós não temos tal costume, nem as igrejas de Deus”.
Paulo deseja enfatizar que seu ensino sobre a liderança masculina não é algo que seja bom para algumas pessoas, mas não para outras. Não, isso é uma parte do plano da criação de Deus e é o padrão que deve prevalecer em todas as igrejas. O versículo 36 confirma que a Palavra de Deus não é domínio exclusivo da igreja de Corinto. A palavra de Deus veio a eles e a todas as outras igrejas. Se isso é verdade, então os coríntios deveriam estar honrando a liderança masculina assim como todas as outras igrejas fazem.
O ensino da Bíblia pode ser controverso, mas não é contraditório. Paulo não proíbe as mulheres de orar e profetizar na assembleia. Pelo contrário, ele deseja que o façam de uma forma que honre a liderança masculina (1Co 11.2-16). Entre outras coisas, isso significa que as mulheres podem profetizar, mas não podem julgar as profecias (1Co 14.34-36). Este ensino reflete a preocupação prática de Paulo com as mulheres que ministram em igrejas e como elas podem fazer isso de uma forma que honre a liderança. Essa mesma preocupação deve marcar todas as congregações – até mesmo a nossa.
[i] Richard B. Hays, First Corinthians, Interpretation (Louisville, KY: John Knox, 1997), 249.
[ii] D. A Carson, “‘Silent in the Churches’: On the Role of Women in 1 Corinthians 14:33b-36,” in Recovering Biblical Manhood & Womanhood: A Response to Evangelical Feminism (Wheaton, IL: Crossway, 1991), 140–53.