Entre bodes e ovelhas

Em 2011 participei de uma missão de curta duração na Etiópia com um grupo de outros oito irmãos e irmãs. Chegamos num domingo de manhã na capital Addis Abeba, e nosso primeiro compromisso era participar de um culto em uma igreja Anglicana. No aeroporto fomos recebidos por um presbítero ligado à agência missionária, que nos acompanhou dentro da van durante o trajeto. Expressamos nosso encanto com a grande quantidade de animais nas ruas, dentre os quais se destacavam os bodes e as ovelhas. O presbítero nos perguntou se sabíamos diferenciar entre bodes e ovelhas com uma simples olhadela. Obviamente que naquele grupo de pessoas que cresceu em grandes cidades do Ocidente ninguém fazia a mínima ideia. Ele, então, nos respondeu: “Goats, tail up; lambs, tail down”, que, em Inglês, quer dizer: “Bodes, rabos para cima; ovelhas, rabos para baixo”.

No mundo espiritual é igual. Bodes tem características de bode, e ovelhas têm características de ovelha. As evidências exteriores são claras se você souber diferenciar. E, da mesma maneira, muitos bodes podem andar entre as ovelhas e se misturar com elas. As razões pelas quais isso acontece são variadas, seja por motivos culturais, quando são de família cristã, ou por motivos sociais, tal como ter amigos crentes, ou porque pensam que precisam exercitar algum tipo de espiritualidade. Contudo, são pessoas que nunca nasceram de novo, porque nascer de novo só se dá para quem crê, e crer é reservado apenas às ovelhas. Quando os fariseus inquiriam a Jesus até quando deixaria suas mentes em suspenso, que, se fosse o Cristo, dissesse-lhes logo, Ele replicou: “Já vo-lo disse, e não credes. As obras que eu faço em nome de meu Pai testificam a meu respeito. Mas vós não credes, porque não sois das minhas ovelhas. As minhas ovelhas ouvem a minha voz; eu as conheço, e elas me seguem”  (João 10.24-27). Isso significa que uma pessoa não é ovelha porque crê, mas crê porque é ovelha.

Estou convencido de que um dos pontos mais importantes da maturidade cristã é saber discernir entre bodes e ovelhas. Bodes, rabos para cima: são espiritualmente altivos, não tem humildade para aprender e continuam em seus pecados. Ovelhas, rabos para baixo: são humildes e sabem se submeter à correção, endireitando suas veredas quando erram. Tal qual I João 5.18 nos diz, “sabemos que todo aquele que é nascido de Deus não vive em pecado”. Pode até haver ovelhas que ainda não foram salvas ou estão desviadas pelo caminho, mas são ovelhas; perdidas, mas, ainda, ovelhas, as quais o Bom Pastor logo tudo deixará para resgatar (Lc 15.1-7). Como bem notou Martinho Lutero: “Essas pessoas já são ovelhas e conhecem a voz do pastor!”.

Saber discernir entre bodes e ovelhas é fundamental para escolher amizades, para formar liderança na igreja, para constituir sociedades nos negócios, quanto mais para casar – pois este é um jugo que se compartilha para a vida toda. É, de igual modo, importante para saber de quem se afastar e com quem não manter comunhão, principalmente quando se tratar de bode que gosta de estar entre ovelhas. Paulo, em I Coríntios 5 trata justamente sobre isso:

Geralmente, se ouve que há entre vós imoralidade e imoralidade tal, como nem mesmo entre os gentios. […] Mas, agora, vos escrevo que não vos associeis com alguém que, dizendo-se irmão, for impuro, ou avarento, ou idólatra, ou maldizente, ou beberrão, ou roubador; com esse tal, nem ainda comais. (versos 1 e 11)

Preste atenção ao que Paulo diz: com tipos destes, nem se quer comais. Andar com estes é pior coisa que andar com os ímpios do mundo, pois o apóstolo, quando diz que não devemos nos associar com os impuros (verso 9), também deixa claro: “refiro-me, com isto, não propriamente aos impuros deste mundo, ou aos avarentos, ou roubadores, ou idólatras; pois, neste caso, teríeis de sair do mundo” (verso 10).

Somente Deus sabe quem é realmente bode e quem é realmente ovelha. Quando o Filho retornar em glória e reunir todas as nações diante dEle, separará uma das outras: ovelhas à sua direita e bodes à sua esquerda (Mateus 25.31-33). Todavia, Jesus nos deu a fórmula do discernimento para agora: “pelos frutos vos conhecereis. Nem todo aquele que me diz: Senhor, Senhor! entrará no reino dos céus, mas aquele que faz a vontade de meu Pai, que está no céu” (Mateus 7.20-21). E ele disse também acerca daquele que recusa disciplina dos irmãos e da igreja, “considera-o como gentio e publicano” (Mateus 18.15-17). Portanto, os rabinhos para cima ou para baixo, ou seja, a atitude altiva ou humilde, se vive em pecado ou se aceita correção para se arrepender de eventuais pecados e abandoná-los, se tem ou não um padrão de vida em santidade, são sinais que nos mostram com quem estamos lidando.

Por fim, a lição é esta: obviamente, não devemos deixar de orar pelos impenitentes, aqueles que insistem em levar uma vida que não glorifica a Deus; no entanto, fazemos bem em reconhecer tais pessoas e delas nos afastarmos, ainda que andem entre ovelhas e se apresentem com linguajar e aparência de crentes, até que produzam frutos de arrependimento e o rabinho comece a apontar para baixo. “Bodes, rabos para cima; ovelhas, rabos para baixo.”