Desacelere, você não é o seu desempenho

Uma das músicas que mais gosto de ouvir quando estou cansada fisicamente ou emocionalmente é Vienna, do Billy Joel. Os últimos meses tem sido existencialmente cansativos, e Vienna tem me embalado em muitos momentos. Eu não sei exatamente o que Billy Joel quis transmitir com a letra, mas eu sei como aplico ela a mim.

“Vá devagar, sua criança louca
Você é tão ambiciosa para uma jovem
Mas se você é tão esperta, me diga por que ainda tem tanto medo?”

Recentemente li o livro “Deuses Falsos” do Tim Keller, e ele fala sobre a sedução do sucesso no capítulo 4. Além disso, também fala sobre a idolatria do desempenho. Pensei em como hoje em dia, principalmente com as redes sociais transformadas em grandes mercados, somos incentivados ao êxito e ao sucesso. Somos pressionados a perseguir não apenas um estilo de vida “confortável” ou “suficiente”, mas sim o ápice, o sucesso. Os feeds, as lojas, o marketing, o sucesso das outras pessoas nos leva a crer que essa é a verdadeira felicidade. Passamos a confundir o ter com o ser. Ter status, fama, grandes títulos acadêmicos se tornou o grande objetivo de vida. E se não tivermos tudo isso logo, estaremos fadados a não ser ninguém. Não podemos ser comuns.

Nesse contexto, é um risco grande que o cristão confunda “dar o seu melhor para Deus” com “se esgotar para ser reconhecido”. O que estou dizendo não é que devemos nos contentar com a mediocridade, mas que está tudo bem em não ter o que você achou que teria aos 20, 30, 40, 50 anos ou mais. Está tudo bem se você não tiver muitos seguidores ou muita influência nas redes sociais. Desde quando deixamos que o “engajamento” das redes ditem quem somos ou como devemos nos sentir? Desde quando a única coisa que importa nessa vida são os títulos acadêmicos ou o status na empresa?

“Você tem tanto o que fazer e tão poucas horas em um dia.”

Eu não tenho tanta experiência de vida assim, mas em meus 23 anos Deus já me quebrou algumas vezes. Algumas dessas vezes por problemas de saúde que me obrigaram a parar e ter que atrasar muitos planos, inclusive a faculdade. Lembro que eu queria tanto me formar cedo (ou no tempo “certo”) que me enchi de disciplinas, e conciliar isso com o trabalho e com a igreja não foi possível. Deus começou a trabalhar no meu coração alguns conceitos e prioridades que estavam invertidos.

“Vá devagar, você está indo bem
Você não pode ser tudo o que quer ser antes do seu tempo.”

Eu nunca cheguei a ter um burnout propriamente dito, mas estava perto disso. Hoje eu agradeço porque não precisei chegar lá para compreender que o “tempo certo” para ter as coisas não existe, mas sei que em meu coração ainda há uma guerra contra mim mesma para acalmar e não atropelar os processos. Às vezes achamos que descansar é simplesmente parar de se esforçar, mas a verdade é que, quando o desempenho se torna um ídolo no nosso coração, o descanso exige um esforço muito maior. Não é natural.

“Você está tão à frente de si mesma que esqueceu o que precisa.”

É difícil reconhecer que o que somos não depende de nosso próprio trabalho, do nosso esforço, do nosso sucesso, mas, ao mesmo tempo, é libertador. Lembro de uma história que o psiquiatra Viktor Frankl conta de uma enfermeira que estava internada e se sentindo inútil por não poder fazer nada. Frankl perguntou a ela se ela também achava que todos aqueles pacientes que antes estavam sob seus cuidados eram pessoas inúteis ou menos dignas simplesmente porque não podiam levantar da cama. Nesse momento ela percebeu que estava errada. Nem mesmo uma pessoa que está em coma perde sua dignidade. Ela ainda é uma pessoa. O que lhe confere valor não é o que ela faz, mas o fato de que ela é uma criatura de Deus, Sua imagem e semelhança.

No caso dos cristãos, há ainda outra verdade libertadora. O que nos confere valor e dignidade não é nosso desempenho nas redes sociais, no trabalho, na faculdade, no ministério que servimos na igreja, nos resultados que apresentamos ou na nossa eficiência. Embora essas coisas não sejam necessariamente ruins, elas também não podem tomar o lugar de Cristo no nosso coração. Esse trecho me lembra muito a história de Marta e Maria. Marta não estava fazendo coisas erradas, mas ela tinha perdido a perspectiva correta. O que era mais importante naquele momento não eram as coisas, e sim o Mestre. E quantas vezes somos Marta quando deveríamos ser Maria?

Foi o que Cristo fez que nos deu sentido e valor. Ele já lutou. Nós podemos descansar o coração nisso e simplesmente parar de achar que o que conseguimos (ou não) fazer é o que há de mais importante.

“Quando você vai perceber? Viena espera por você.”

Você pode parar e descansar. Pode parar de sofrer tanto quando fracassa ou quando é uma pessoa “comum” e “mediana”. Você pode parar de se comparar com as pessoas que tratam o sucesso como o que há de mais importante e vivem pra isso.

Eu não sei qual é a Viena de Billy Joel. Não sei se é realmente Viena da Áustria e muito menos o que tem lá de tão importante que fará a criança louca da música descansar. Mas eu sei que a minha Viena é representada pelos braços abertos de Cristo, que foram perfurados por amor a mim e agora me acolhem como a criança cansada que precisa de um lugar para repousar e abrir mão dos próprios esforços. Não é assim a nossa salvação? Nós não conseguimos pela nossa força, porque simplesmente não temos. Ela foi de graça. E ainda há graça todos os dias para quando acharmos que somos inúteis ou que estamos atrasados na vida simplesmente porque não conseguimos alcançar um padrão de sucesso e desempenho que de alguma forma foi colocado em nós.

Se você, assim como eu, é uma criança cansada, sobrecarregada, que precisa de descanso, de libertação das próprias obras e de braços rendidos para Aquele que é o verdadeiro Descanso:

Viena espera por você.