Senhor, dá-nos amor com discernimento

Uma oração para dias de divisão

O último ano revelou muito sobre nós, para o bem ou para o mal. Provações nos expõem, nos confrontam e nos purificam, e Deus tem nos dado provações de vários tipos. Quem sabe o que os próximos meses ou semanas – ou até horas – podem trazer?

Deveríamos nos reunir como igreja apesar do vírus ou não? Deveríamos usar máscaras ou não? O uso da força por um oficial foi legítimo? Um tiroteio foi motivado por motivos raciais? Deveríamos protestar? O que deveríamos dizer (ou tweetar)? Deveríamos dizer qualquer coisa? Estamos experimentando uma catástrofe climática? O que deveríamos dizer, como cristãos, sobre a presidência? Deveríamos votar nesse ou naquele partido, nesse ou naquele candidato, ou em alguém que nunca irá ganhar?

Essa complexidade dos nossos desafios e dificuldades – relacionais e políticos, médicos e financeiros, mentais e espirituais – revelam dois impulsos perigosos e rivais dentro de nós.

Impulsos imaturos

Em circunstâncias difíceis e confusas, confrontadas com notícias conflitantes e apelos emocionais por ajuda e compaixão, nós frequentemente analisamos e julgamos sem amor ou nos lançamos em amor sem um discernimento cuidadoso.

Mesmo em um coração humano – meu coração humano – podemos nos sentir entre esses polos distantes, cada um sendo certo o suficiente para ganhar nossa confiança e devoção e, ainda, errado o suficiente para distrair nossas almas e enfraquecer nosso testemunho. Nós precisamos, hoje mais do que nunca, do estranho casamento de uma antiga oração:

Oro para que o amor de vocês transborde cada vez mais e que continuem a crescer em conhecimento e discernimento. (Filipenses 1.9, NVT)

Amor e discernimento. Discernimento e amor. Nós raramente podemos ver os dois juntos na vida real, no entanto, a sabedoria mora no casamento entre os dois. Deus os uniu, perfeitamente em Cristo e agora cada vez mais em nós, para que brilhemos – com paciência, coragem, humildade, paz, esperança, lealdade e diferenças – especialmente em dias sombrios, divisíveis e perturbadores como os nossos.

Amor sem discernimento

A primeira falha em meio à crise e à inquietação seria tentarmos buscar o amor enquanto deixamos o discernimento de lado. “Oro para que o amor de vocês transborde cada vez mais” Paulo diz, “em conhecimento e discernimento” (Filipenses 1.9). Amor sem discernimento decifra a realidade e toma decisões (a maior parte de forma inconsciente) baseado principalmente naquilo que os outros querem e sentem. É um amor cativo, raso e, com frequência, superficial; geralmente é um amor desonesto. Esse tipo de amor possui alergia a questões difíceis e gula pela aprovação dos outros.

Longe de fazer o amor menos amável, mas o verdadeiro discernimento apenas aprofunda e promove o amor. Como Paulo diz em sua oração, esse amor abunda não apesar do conhecimento e discernimento, mas com conhecimento e discernimento. Conhecimento e discernimento não são somente parte de uma lista para o amor cumprir; são algumas das raízes mais fortes do amor.

Conhecimento

O que é conhecimento? Conhecimento é uma consciência precisa da realidade, especialmente da realidade espiritual, adquirido através do ensino ou experiência. Por causa de como Paulo ora por ele, sabemos que conhecimento espiritual é, em essência, um dom de Deus (Filipenses 1.9; Efésios 1.17; 1 Coríntios 2.13-14). Porém, embora o conhecimento seja um dom, nós ainda nos esforçamos e nos empenhamos para crescer nele (Colossenses 1.29-2.3), em grande parte através da submissão ao fiel ensino (Efésios 4.11-13).

Assim, o conhecimento que precisamos é distribuído sobrenaturalmente por Deus pela atenção cuidadosa e rigorosa de sua palavra. Nós o recebemos e devemos aumentá-lo (Colossenses 1.9-10).

Discernimento

E o que é discernimento? Discernimento é a habilidade de julgar bem, especialmente de julgar da forma como Deus julgaria em qualquer situação.

Apesar dos dois estarem intrinsecamente relacionados, até sobrepondo-se, discernimento é mais enganoso, porque coloca o conhecimento para funcionar na vida real. Uma coisa é definir o certo e o errado, ou bem e mal, abstratamente, mas outra coisa mais desafiadora é a tarefa de distingui-los na realidade – nos relacionamentos reais, em manchetes reais, em crises reais. E, novamente, ainda que nossa habilidade de discernir bem seja, no final das contas, dada por Deus, nós sabemos que ela também é “exercitada para discernir não somente o bem, mas também o mal” (Hebreus 5.14). Prática constante. Se nenhum outro bem veio dos eventos do ano passado, certamente eles nos desafiaram a fazer o que Deus nos chama para fazer a todo tempo: crescer continuamente em discernimento.

O amor veste-se de discernimento. E não apenas algum discernimento, mas pleno discernimento (Filipenses 1.9) – um discernimento completo e crescente, um discernimento que escuta, aprende, questiona e que raramente é pretencioso. Um discernimento incansável que reforça um amor ainda mais incansável. Enquanto os debates aquecem e reinos oscilam e vírus se espalham, nós não precisamos de um amor leve e fácil. Nós precisamos do peso e durabilidade de um amor com discernimento.

Discernimento sem amor

Mas, para que aqueles entre nós que possuem mais discernimento não comecem a pensar mais sobre si mesmos do que deveriam, Paulo ora, em última instância, não por discernimento, mas por amor. E não apenas qualquer amor, mas um amor abundante.

Enquanto alguns caem em um amor vago e desenfreado dirigido pelo medo dos homens, outros de nós estão tão ocupados e determinados a fazer as perguntas certas que, na verdade, nunca amam. A investigação, não as pessoas com necessidades reais, se torna o foco, até o fascínio. Nós deixamos de amar anunciando discernimento. Esse tipo de pessoa lê extensivamente, mas ora pouco. Aos poucos ele se torna desconfiado dos necessitados e calejado quando ele poderia ser compassivo.

Tão importante quanto o discernimento, Paulo ora aqui para que o amor, não o discernimento, aumente mais e mais. Se nosso discernimento parece mais e mais cínico e indiferente, enfaticamente Paulo não está orando por discernimento. Discernimento piedoso catalisa e fortalece o amor. Ele incendeia corações para se arriscarem em amor. Ele pode não ser o amor que outros desejam – muito frequentemente ele não será o tipo de amor ou apoio que os outros querem, esperam ou até demandam. Porém, ele é amor de qualquer forma – um desejo e compromisso profundo de servir (e se sacrificar) pelo bem eterno de outros.

Enquanto debates aquecem e reinos oscilam e vírus se espalham, nós não precisamos de análises indiferentes ou especulações cínicas. Nós precisamos do calor e da devoção de um amor com discernimento.

Cheio de amor com discernimento

Praticar o amor e discernimento não é meramente sobreviver em um mundo caído. O céu e o inferno estão em jogo, de uma forma muito real, pelo jeito que nós amamos e discernimos. O apóstolo Paulo ora para que o amor da igreja pudesse aumentar em conhecimento e discernimento “para aprovardes as coisas excelentes e serdes sinceros e inculpáveis para o Dia de Cristo, cheios do fruto de justiça, o qual é mediante Jesus Cristo” (Filipenses 1.10-11).

Se nós não abundarmos em amor e discernimento, se nós não aprendermos a identificar e aprovar o que é excelente e verdadeiro, nós não estaremos puros e inculpáveis para o Dia de Cristo. Essa pureza e inocência não é a justiça de Cristo imputada em nós, mas a justiça que ele graciosamente trabalha em nós e através de nós (Filipenses 2.12-13) – não é perfeição, mas a pureza e inocência genuínas que separam o povo de Deus do mundo (Filipenses 2.15). E, se nós não somos puros e inocentes para o Dia de Cristo – em uma medida real e abundante – então ele nos mandará embora no Dia de Cristo (Mateus 7.21-23; Hebreus 12.14).

Por mais despreparados que nos sentimos nos dias sem precedentes do ano passado, quão pior seria sermos encontrados despreparados para o grande e terrível dia que virá? Nós deveríamos desejar sermos cheios do fruto de justiça, como Paulo ora; cheios de um amor abundante marcado por um discernimento cada vez mais refinado.

Praticar – realmente praticar – o amor e o discernimento não é meramente ganhar um argumento ou estar do lado certo da história, mas é ser justo perante Deus na eternidade. Se nós queremos glorificar a Deus em tudo o que fazemos, nós não podemos nos acomodar com um discernimento sem o real amor. Se queremos ser mais e mais como Jesus, nós não podemos nos acomodar por um amor sem o real discernimento. Se queremos fazer a diferença em dias sombrios como esses, nós precisamos do amor verdadeiro cheio do real conhecimento e discernimento nas pressões e complexidades mais reais que nos são dadas.

Por: Marshall Segal. © Desiring God Foundation.Website: desiringGod.org. Traduzido com permissão. Fonte: Lord, Give Us Discerning Love: A Prayer for Divisive Days.

Original: Senhor, dá-nos amor com discernimento: uma oração para dias de divisão. © Ministério Fiel. Website: MinisterioFiel.com.br. Todos os direitos reservados. Tradução: Juliane Teixeira Lima Peixoto. Revisão: Renan A. Monteiro.