No que cremos agora e para sempre

O credo dos Apóstolos

Creio em Jesus Cristo, seu único Filho, nosso Senhor, o qual […] padeceu sob o poder de Pôncio Pilatos, foi crucificado, morto e sepultado; desceu ao Hades; ressurgiu dos mortos ao terceiro dia […]. (Credo dos Apóstolos)

Nenhum dos discípulos subscreveria essa parte do credo para que ela fosse cumprida.

Eles pensavam que estavam na marcha da vitória, na Entrada Triunfal, na iminência de inaugurar o reino. Eles pensavam que estavam voltando da guerra para casa em celebração, e não indo direto para o coração do território inimigo. Eles consideravam os “Hosanas” que os receberam no portão como apropriados (Mc 11.9). Eles não esperavam a cruz, embora Jesus a tenha predito claramente em várias ocasiões:

É necessário que o Filho do Homem sofra muitas coisas, seja rejeitado pelos anciãos, pelos principais sacerdotes e pelos escribas; seja morto e, no terceiro dia, ressuscite. […] Fixai nos vossos ouvidos as seguintes palavras: o Filho do Homem está para ser entregue nas mãos dos homens. (Lc 9. 22, 44)

No entanto, nenhum dos discípulos previu o que estava por vir. Nem mesmo Pedro, a rocha, que chamou Jesus de lado e tentou repreendê-lo dizendo: “Tem compaixão de ti, Senhor; isso de modo algum te acontecerá” (Mt 16.22). Sua mente, Jesus nos diz, estava voltada para as coisas do homem, não para as de Deus (Mt 16.23). Pedro, como Satanás, tenta-o com um reino sem derramamento de sangue (Lc 4.5-7).

Mas o sofrimento, a crucificação e a morte do Messias — tão difícil para os discípulos acreditarem — foram uma maravilha para os olhos do céu. Os anjos assistiram em transe. Com olhos sem piscar, eles viram a revelação dos sofrimentos de Cristo e as glórias subsequentes há muito preditas pelos profetas (1Pe 1.10-12). Em contraste com os discípulos, Moisés e Elias desceram ao monte da transfiguração e tinham apenas esse assunto em mente para discutir: “Eis que dois varões falavam com ele: Moisés e Elias, os quais apareceram em glória e falavam da sua partida, que ele estava para cumprir em Jerusalém” (Lc 9.30-31). Sua partida, literalmente seu êxodo. Então, o que ele realizou em Jerusalém?

Padeceu sob Pilatos

Se você pudesse inserir outro nome histórico no antigo credo ao lado de Maria e Jesus, qual seria? José? Davi? Moisés? Adão talvez? O único outro a ser mencionado pelo nome é Pôncio Pilatos.

Sabemos que ele hesitou em matar Jesus, que o considerou inocente, que tentou, ainda que sem entusiasmo, libertar Jesus vivo. No entanto, apesar de lavar as mãos, ele foi o governador que aquiesceu, e seu nome caiu na infâmia: Jesus padeceu sob Pôncio Pilatos. A história revelou esse vilão complexo como o representante de um mundo furioso contra seu Deus e seu Messias. Pedro conecta Pilatos explicitamente à vilania do Salmo 2:

Por que se enfureceram os gentios, e os povos imaginaram coisas vãs? Levantaram-se os reis da terra, e as autoridades ajuntaram-se à uma contra o Senhor e contra o seu Ungido; porque verdadeiramente se ajuntaram nesta cidade contra o teu santo Servo Jesus, ao qual ungiste, Herodes e Pôncio Pilatos, com gentios e gente de Israel, para fazerem tudo o que a tua mão e o teu propósito predeterminaram […]. (At 4. 25-28).

Pilatos e Herodes deram as mãos em sua cumplicidade para matar o Filho de Deus (Lc 23.12). Pilatos considerou Jesus inocente e ainda assim o condenou à crucificação para satisfazer a multidão (Mc 15.14-15), uma abominação aos olhos de Deus (Pv 17.15). 

E este não era um mero homem, mas o Filho amado de Deus.

Foi crucificado e morto

Pilatos enviou Jesus para ser açoitado e depois crucificado. Os leitores modernos podem se surpreender com o quão curta a descrição de Marcos diz: “Então, o crucificaram” (Mc 15.24). Todo o livro de Marcos corre para a realidade que essas três palavras transmitem. Então, por que ele não diz mais? Talvez porque qualquer um que tivesse sido testemunha de uma crucificação não precisasse de mais detalhes.

A palavra crucificado continha horror suficiente para remeter a homens semimortos, pregados em um madeiro. Seminus. Sangrando. Nus, ali eles ficavam pendurados em agonia. Ali eles clamavam por uma morte rápida que já demorava. Ali permaneciam: vendo, ouvindo, sentindo — mas incapazes de se mover. Sem intervalos, sem pausas para ir ao banheiro. Nenhuma mão disponível para proteger do sol em seus olhos ou espantar as moscas de suas feridas abertas. Ali, um homem se contorceu como um verme em um anzol, isca para a boca escancarada do Sheol. E o crucificaram.

E enquanto ele se contorcia em uma dor incompreensível, sua morte ultrajante se desenrolava diante de incontáveis olhos, ouvidos e insultos (Mt 27.39-44). Jesus sofreu intensamente. Ele sofreu publicamente. E ele sofreu sob a ira justa de seu Pai. Pendurado em um madeiro, Jesus estava pendurado sob a maldição de Deus, “porquanto o que for pendurado no madeiro é maldito de Deus” (Dt 21.22-23). Ele não tinha apenas homens contra ele, mas “ao Senhor agradou moê-lo” (Is 53.10). Ele bebeu voluntariamente o cálice da ira divina derramada com força total contra os pecados que não cometeu (Mt 26.39).

E ele morreu. Ele não fingiu nem evitou. O corpo humano de Jesus foi separado de sua alma humana. Ele falou claramente a João em Patmos: “Não temas; eu sou o primeiro e o último e aquele que vive; estive morto, mas eis que estou vivo pelos séculos dos séculos e tenho as chaves da morte e do inferno.” (Ap 1.17-18).

Desceu ao Hades

O Credo dos Apóstolos continua: “Ele desceu ao Hades”. O que significa que Jesus desceu ao Hades? Ele desceu ao inferno? Havia mais horror esperando, mesmo depois que ele proferiu as palavras aparentemente vitoriosas: “Está consumado” (Jo 19.30)?

Quando ele pronunciou “Está consumado”, estava consumado. Sua vergonha, seu sofrimento e sua humilhação haviam acabado. Ele foi sepultado em honra, como foi predito (Is 53.9), colocado no túmulo de um membro do conselho judaico, José de Arimatéia, que — ao contrário dos discípulos — procurou o reino de Deus no corpo moído e cheio de cicatrizes de Cristo (Mc 15.43). Então, o que quer dizer “desceu ao Hades”?

Em resumo, Jesus desceu ao que o Antigo Testamento chamou de Sheol, o reino dos mortos, almas humanas arrancadas na morte de seus corpos, aguardando o julgamento final. E ali Jesus libertou aqueles de fé que o precederam, incluindo Abraão, Noé, Moisés, Davi, Raabe, Samuel, Jeremias e João Batista.

O próprio Sheol, antes de Cristo descer, estava dividido em duas partes, separadas por um grande abismo (Lc 16.26): o seio de Abraão e o Sheol propriamente dito. O primeiro é onde Lázaro e outros santos justos moravam em paz (Lc 16.25); o último era um lugar de tormento. Quando Jesus desceu da cruz para o Hades, ele foi ao seio de Abraão, o lugar do “paraíso”, para erguer aqueles fiéis dali para o céu. Ao esvaziar o seio de Abraão, todos os que morrem agora partem para estar diretamente com Cristo (Fp 1.23).

Ao terceiro dia

Todos os que morreram antes de Jesus viram seus corpos irem para a sepultura e se desfazer enquanto suas almas esperavam no Sheol. Mas sobre Jesus, Davi escreveu: “Pois não deixarás a minha alma na morte, nem permitirás que o teu Santo veja corrupção.” (Sl 16.10; At 2.31). O corpo de Jesus não se decompôs. Sua alma não foi abandonada no Sheol. Ele ressuscitou ao terceiro dia.

Tendo nascido da virgem Maria, padecido sob Pôncio Pilatos, tendo sido crucificado, morto e sepultado, tudo o levou a isto: “Ele é o princípio, o primogênito de entre os mortos, para em todas as coisas ter a primazia” (Cl 1.18). O sofrimento aparentemente absurdo de Cristo leva seu povo a desfrutá-lo eternamente. Seu povo, sua noiva, foi comprado por meio de seu sangue — não à parte da cruz, mas por meio dela. Lá, ele assegura todos os contínuos hosanas do céu (Ap 5.9-13).

Os ateus ao longo da história creram que Maria deu à luz a Jesus, que ele foi crucificado sob uma figura histórica chamada Pilatos, mas nós ainda cremos, e continuaremos a crer, que Jesus vive. Cremos que ele reina. Cremos que ele está vivo para sempre, segurando “as chaves da morte e do inferno” (Ap 1.17-18). Cremos que sua morte destruiu a morte. Cremos que seu corpo moído ressuscitou. E cremos que em breve ele nos ressuscitará com ele.

Por: Greg Morse. © Desiring God Foundation.Website: desiringGod.org. Traduzido com permissão. Fonte: His Broken Body Rose

© Voltemos ao Evangelho. Website: voltemosaoevangelho.com. Todos os direitos reservados. Tradutor: Paulo Reiss. Editor: Vinicius Lima. Revisor: Zípora Dias.