Água em vinho

A transformação poderosa


No Evangelho segundo João (Jo 2:6-11) pode ser encontrado o relato do que é considerado o primeiro milagre público do Senhor Jesus Cristo, nas “bodas em Caná da Galiléia”, onde Ele transformou água em vinho. Como este é um dos vários milagres públicos testemunhados claramente no registro do Seu ministério terreno, vamos fazer uma análise paralela, do ponto de vista científico, para tentarmos compreender o tamanho do desafio que representa transformar água em vinho, considerando cumprir esta tarefa apenas como um empreendimento humano, em laboratórios de pesquisa.
Vamos começar considerando a composição química: a água (H2O) é uma substância pura, formada por apenas dois elementos químicos da tabela periódica, o hidrogênio (H) e o oxigênio (O). O vinho, no entanto, é uma mistura complexa de diversas substâncias químicas, com a seguinte composição média [i]: 70-80% de água, 12-15% de carboidratos (glicose, frutose), 0,4-1,3% de ácidos orgânicos (tartárico, málico, cítrico), 0,03-0,17% de substâncias nitrogenadas, 0,3-0,5% de substâncias inorgânicas minerais (potássio, ferro, cálcio, fosfato, etc), e 0,01-0,10% de taninos e corantes. Pode-se perceber que além da água, existem também diversas outras substâncias, como os carboidratos, taninos, corantes, ácidos orgânicos, substâncias minerais e nitrogenadas, envolvendo, portanto, uma grande quantidade de outros elementos químicos da tabela periódica, como carbono (C), nitrogênio (N), potássio (K), ferro (Fe), cálcio (Ca), fósforo (P), etc, além do hidrogênio (H) e do oxigênio (O), que estão presentes na água e também em várias destas outras substâncias.
Como a análise detalhada desta transformação de água em vinho seria muito complexa para se contemplar plenamente, vamos focar em apenas uma pequena parte do problema em questão, buscando compreender o tamanho da dificuldade que seria tentar realizar esta tarefa em laboratórios de pesquisa. Consideremos apenas a transformação dos elementos químicos constituintes da substância água – hidrogênio (H) e oxigênio (O) – em carbono (C) e nitrogênio (N), necessários para compor os carboidratos (12-15%), as matérias nitrogenadas e o próprio etanol (C2H6O), o álcool mais presente (~10%) no vinho.
Somente este desafio de transformar hidrogênio (H-1) e oxigênio (O-16), em carbono (C-12) e nitrogênio (N-14), já representa uma enorme barreira a ser transposta do ponto de vista do desafio científico e tecnológico. Estes números aqui apresentados (1, 16, 12, 14), ao lado dos símbolos atômicos (H, O, C, N), representam os números de massa dos isótopos com maior abundância natural na crosta terrestre [ii]. A transformação de elementos químicos envolve a transformação dos seus núcleos, ou seja, acontece através de reações nucleares que normalmente envolvem gigantescas quantidades de energia (ex: fissão e fusão nuclear).
O ciclo CNO representa uma série de reações nucleares catalisadas por núcleos de (C)arbono, (N)itrogênio e (O)xigênio para produzir partículas alfa (núcleo do átomo de Hélio), pósitrons e neutrinos (partículas subatômicas). Estas reações do ciclo CNO tem como resultado final a fusão nuclear de hidrogênio (H) em hélio (He), e acredita-se que elas ocorram predominantemente em estrelas com massa 1,3 vezes superior à massa do nosso Sol. Outra reação de fusão nuclear bem conhecida é a “cadeia próton-próton”, e acredita-se que este mecanismo seja predominante em estrelas com massa menor ou igual à do nosso Sol.
Uma alternativa para se imaginar obter C-12 e O-14, a partir de H-1 (próton, “p”) e O-16, seria considerar os ciclos CNO-I e CNO-II juntos [iii] (ver figura de capa deste artigo). Contudo, estima-se que o ciclo CNO-II ocorra no núcleo do nosso Sol em apenas cerca de 0,04% das vezes. Além disso, estamos falando aqui de temperaturas altíssimas, que chegam a vários milhões de graus (megakelvin), para a ocorrência destas reações nucleares, o que certamente dificultaria muito a transformação da água em vinho que estamos tentando compreender, considerando que este processo estivesse ocorrendo em laboratórios de pesquisa na Terra, assim como foi o milagre realizado em Caná da Galiléia.
– Pergunta: Como realizar, então, esta transformação de água em vinho, se precisaríamos de uma quantidade tão gigantesca de energia, que é típica de temperaturas tão altas quanto àquelas encontradas nas estrelas (como o nosso Sol)?
– Resposta: Apenas confiando nAquele que é o “sol da justiça” (Ml 4:2) e a “brilhante Estrela da manhã” (Ap 22:16), e no poder da sua obra de criação (criando a água), providência (transformando água em vinho no casamento de Caná da Galiléia), e redenção (sendo a fonte de “água da vida” para todos aqueles que creem Nele).
O “Carpinteiro-Alquimista” Nazareno também é o Glorioso Gênio da química [iv], que não tem nenhum impedimento em transformar água em vinho, e nem mesmo em andar “sobre as águas” [v]. Por mais impressionantes que sejam os avanços científicos e tecnológicos que a humanidade alcançou, pela graça de Deus, nós jamais seríamos (nem seremos) capazes de realizar esta transformação tão poderosa de água em vinho, como foi descrito aqui. Como cientistas, precisamos ter humildade diante desta verdade, reconhecendo a glória e a majestade dAquele que é onipotente, e portanto o único capaz de realizar esta transformação!
No texto do Evangelho segundo João, está escrito “a água transformada em vinho” (Jo 2:9). A palavra usada no original para “transformada” encontra um paralelo com o conceito de “transformação” que aparece, por exemplo, em Dt 27:9, quando Moisés declarou que o povo de Israel “vieste a ser” povo do Senhor.
As celebrações de casamento no primeiro século podiam durar vários dias, de modo que o pior vinho era reservado para mais tarde, quando o paladar dos convidados já estivesse um tanto embotado. O elogio do “mestre-sala” ao noivo, dizendo “tu, porém, guardaste o bom vinho até agora” (Jo 2:10b), reconhece o “vinho superior”, mas só os serventes (servos) sabiam o motivo. Esta é uma clara referência à “superior aliança” (Hb 7:22), garantida por meio do nosso “fiador”, o Senhor Jesus Cristo.
Assim como o “Alquimista Nazareno” poderosamente transformou água em vinho em Caná (que significa “lugar de canas”), uma vila na Galiléia localizada a cerca de 8 km a noroeste de Nazaré, Ele também transforma nossos corações e mentes, pelo poder do Seu Espírito, e misericordiosamente promete que “não esmagará a cana quebrada” (Is 42:3; Mt 12:20).
Como discípulos de Cristo, e, portanto, como “cana quebrada”, precisamos tentar ser mais gentis (doces como “caldo de cana”) [vi] – embora sem nunca comprometer a verdade – na difícil e imprescindível tarefa de proclamar o Evangelho da Cruz para aqueles “opositores hostis” que ainda não conhecem este bendito Salvador e Senhor!

Solus Christus
Soli Deo Gloria


*Notas:
[i] “Vinhos do Brasil e do mundo: para conhecer e beber”, J.O.A. do Amarante – 1983 – Summus Editorial.
[ii] Os números de massa (A) representam a soma do número de prótons (conhecido como número atômico, Z) com o número de nêutrons encontrados no núcleo de um átomo (elemento químico). Em uma comparação entre átomos, isótopos são os elementos químicos com o mesmo número de prótons (mesmo número atômico, Z). A abundância natural se refere, por exemplo, à abundância de isótopos de elementos químicos naturalmente encontrados na crosta terrestre. Para a discussão a respeito da transformação da água em vinho, a informação mais relevante é que a abundância natural do H-1 é de 99,985%, do O-16 é de 99,76%, do C-12 é de 98,89%, e do N-14 é de 99,64%.
[iii] “Fusion Reactions in Stars: Proton-Proton Chain and CNO Cycle Reaction”, Jiachen Li, Univers. Stanford, 2018, http://large.stanford.edu/courses/2018/ph241/li-ji2/
[iv] “O Glorioso Gênio da química: Um ensaio apologético e uma expressão devocional”, Marcelo Zaldini Hernandes, 2022, https://www.amazon.com.br/dp/B09T3HR628
[v] Além de transformar a água em vinho, o Senhor Jesus também não teve nenhuma dificuldade em “andar sobre as águas”, conforme o relato de outro de seus milagres bem conhecidos nos Evangelhos (Mt 14:22-33; Mc 6:45-52; Jo 6:15-21).
[vi] Nos textos originais (Is 42:3; Mt 12:20), “cana” significa “reed” (junco ou cálamo: “cana aromática”). Aqui, “caldo de cana” tem um sentido figurado.