Equilíbrio da Graça

Uma ilustração acerca da salvação em Jesus por meio da química

 

Como seria tentar contemplar a obra da graça, na salvação em Cristo, usando a analogia de um equilíbrio químico? [i]

Caro leitor, imagine uma “reação química” entre os “reagentes” PECADO_humano e JUSTIÇA_DIVINA, gerando, como “produtos”, SALVAÇÃO_humana e GLÓRIA_DIVINA:

PECADO_humano + JUSTIÇA_divina    SALVAÇÃO_humana + GLÓRIA_divina

Talvez pudéssemos classificá-la como uma reação de “dupla troca”, o que imediatamente nos remeteria à maravilhosa doutrina bíblica da “dupla imputação”. Na verdade, a inspiração para contemplar a obra divina na salvação humana, na perspectiva do equilíbrio em uma reação química, veio a partir da leitura de alguns trechos encontrados no livro “A Cruz de Cristo”, de John Stott. No capítulo 6, denominado “A autossubstituição de Deus”, o autor descreve [ii]

“[…] Assim, ambos os versículos [2Co 5:21 e Gl 3:13] indicam que quando somos unidos a Cristo acontece uma misteriosa troca: ele levou a nossa maldição para que possamos receber a sua bênção; ele tornou-se pecado com o nosso pecado para que possamos tornar-nos justiça com a sua justiça. Em outro lugar, Paulo escreve acerca dessa transferência em termos de ‘imputação’. Por um lado, Deus recusou-se a ‘imputar’ a nós os nossos pecados, ou ‘contá-los’ contra nós (2Co 5:19), com a implicação de que, em vez disso, ele os imputou a Cristo. Por outro lado, Deus imputou a justiça de Cristo a nós [ver Rm 4:6; 1Co 1:30; Fp 3:9].” 

[…] Não, o que foi transferido a Cristo não foi qualidades morais, mas consequências legais: ele voluntariamente aceitou a responsabilidade de nossos pecados. É isso o que significam as expressões ‘feito pecado’ e ‘feito maldição’ [de acordo com declarações de Thomas Crawford citando John Owen].” 

Em capítulos posteriores no livro, John Stott também comenta “A cruz é a única alquimia que transforma o mal em bem”, e depois cita “Pois o ‘único alquimista verdadeiro’ é Deus. Ele tem êxito até mesmo em ‘transmutar o mal em bem’.”

Poderíamos imaginar que este “equilíbrio da graça” também teria, assim como outras reações químicas, uma constante de velocidade para a reação direta (“velocidade de salvação”), e outra constante de velocidade para a reação inversa (“velocidade de apostasia”). 

Vamos considerar que esta “reação química” esteja acontecendo em meio aquoso, ou seja, tendo como solvente a água da “fonte para a vida eterna” [iii], que também poderia ser chamada de graça (como substância). Em relação ao aparato reacional, na forma de vidrarias (balões e frascos) e mangueiras de conexão, poderíamos associa-los à (como instrumento). No que diz respeito à relação entre graça e , pode ser muito útil a didática ilustração usada durante uma pregação (Joel R. Beeke), citando o texto de Efésios 2:8-9: “Porque pela graça sois salvos, mediante a fé; e isto não vem de vós; é dom de Deus; não de obras, para que ninguém se glorie”. Na ilustração, somos levados a imaginar um homem caminhando no deserto, debaixo do sol do meio-dia, e que estando bastante sedento, está à procura de água. Em sua direção, vem outro homem carregando um copo com água fresca, e tendo se aproximado, a oferece ao homem sedento, que bebe a água do copo, porém através de um canudo. Quando o homem, antes sedento, termina de beber a água, o que vocês acham que ele exclama? “Oh! Que canudo maravilhoso!!!” É claro que não! Ele, certamente, exclama “Oh! Que água maravilhosa!!!” É possível, então, perceber que nesta ilustração a água é equivalente à graça – a substância –, enquanto o canudo é equivalente à – o instrumento da salvação.

Continuando nossa analogia com a “reação química” no “equilíbrio da graça”, poderíamos ainda considerar que a fonte de calor (“bico de Bunsen” ou “placa de aquecimento”) seria a ira divina contra o pecado [iv], o “agitador” (ou “misturador”) [v] magnético (ou mecânico) poderia ser a inconstância e pequenez da nossa fé. Já o “catalizador” – que normalmente é usado para acelerar uma reação – seria a providência de Deus, que nunca tarda nem se atrasa [vi].

Quando uma reação química chega ao fim, normalmente é realizado um processo de “extração”, para que haja a separação final dos produtos planejados. Reconhecendo a soberania de Deus na doutrina da “eleição”, durante o “equilíbrio da graça”, o momento final de “extração” acontecerá na “consumação do século” (Mt 13:36-43), e o “funil de separação” será usado “no dia em que o Filho do Homem se manifestar” (Lc 17:30ss) …. Contudo, não antes da oportunidade de experimentar a misericórdia divina ser graciosamente revelada e oferecida (Jo 3:16ss): o tempo oportuno e gracioso da misericórdia é o agora!

Como uma característica central deste “equilíbrio da graça”, poderíamos concluir que a “constante de equilíbrio” (tipicamente representada pela letra K) desta reação, no contexto desta analogia, só poderia ser o nosso Kurios, o Senhor Jesus Cristo [vii]. Finalmente, como uma reação química é frequentemente “monitorada” ou “acompanhada” através do uso de um termômetro (muitos deles usam mercúrio colorido em vermelho), não há como não lembrar de que o nosso Kurios derramou seu sangue carmesim no “termômetro” (cruz) enfincado no Calvário… Além disso, ele também prometeu “estar conosco todos os dias”, até a “consumação do século” (Mt 28:20).

Graças a Deus por Jesus Cristo, nosso Salvador e Senhor (Kurios)!

 

Leia mais artigos do Dr. Marcelo Zaldini Hernandes na coluna Fé e Ciência – clique aqui.

Conheça os livros da Editora Fiel sobre Fé e Ciência – clique aqui.


*Notas:

[i] É importante enfatizar que nenhuma analogia deste tipo poderia ser precisa e exata em todos os pontos, principalmente quando se trata de representar verdades eternas reveladas na Palavra de Deus.

[ii]Ambos os versículos [2Co 5.21 e Gl 3.13] vão além dessas verdades negativas (que ele levou o nosso pecado e maldição a fim de redimir-nos deles) a verdades positivas. Por um lado, ele levou a maldição a fim de que pudéssemos herdar a bênção prometida a Abraão (Gl 3.14), e por outro, Deus fez que o Cristo, que não tinha pecado, fosse feito pecado por nós a fim de que ‘nele fôssemos feitos justiça de Deus’ (2Co 5.21)” [“A Cruz de Cristo”, John Stott].

[iii] “Afirmou-lhe Jesus: Quem beber desta água tornará a ter sede; aquele, porém, que beber da água que eu lhe der nunca mais terá sede; pelo contrário, a água que eu lhe der será nele uma fonte a jorrar para a vida eterna” (Jo 4.13-14).

[iv] “Por isso, recebendo nós um reino inabalável, retenhamos a graça, pela qual sirvamos a Deus de modo agradável, com reverência e santo temor; porque o nosso Deus é fogo consumidor” (Hb 12.28-29).

[v] “Se, porém, algum de vós necessita de sabedoria, peça-a a Deus, que a todos dá liberalmente e nada lhes impropera; e ser-lhe-á concedida. Peça-a, porém, com fé, em nada duvidando; pois o que duvida é semelhante à onda do mar, impelida e agitada pelo vento. Não suponha esse homem que alcançará do Senhor alguma coisa; homem de ânimo dobre, inconstante em todos os seus caminhos” (Tg 1.5-8).

[vi] “Em ti, SENHOR, me refugio; não seja eu jamais envergonhado; livra-me por tua justiça. Inclina-me os ouvidos, livra-me depressa; sê o meu castelo forte, cidadela fortíssima que me salve” (Sl 31:1-2).

[vii] “Pelo que também Deus o exaltou sobremaneira e lhe deu o nome que está acima de todo nome, para que ao nome de Jesus se dobre todo joelho, nos céus, na terra e debaixo da terra, e toda língua confesse que Jesus Cristo é Senhor [Iesous Christos Kurios], para glória de Deus Pai” (Fp 2.9-11).