Um blog do Ministério Fiel
Tem cuidado de ti mesmo e da doutrina
A importância das disciplinas espirituais para pastores
Nota do Editor: Neste artigo de Donald Whitney, escritor muito conhecido e apreciado no assunto das disciplinas espirituais, nos fala da importância delas na vida dos pastores e ministros da Palavra, e em como elas são importantes para a saúde e crescimento da igreja.
Durante os 24 anos em que servi no ministério pastoral, vi um fluxo contínuo de anúncios sobre como tornar uma igreja maior. Em quase 50 anos de pregação e ensino, já ouvi dezenas de mensagens sobre evangelização, missões e crescimento da igreja. Apesar disso, porém, eu poderia talvez contar em uma mão o número de vezes em que um desses anúncios ou mensagens mencionou o único versículo na Bíblia que em essência diz: “Faça isso e você verá pessoas salvas”.
A mensagem deste versículo era tão importante para o apóstolo Paulo, que, ao se dirigir especificamente aos presbíteros no Novo Testamento, ele o comunica em essência. Esse é também o único versículo na Bíblia (que posso lembrar) que expressa a mesma exortação três vezes. Você acha que este versículo é importante?
Qual é esse versículo? 1 Timóteo 4.16:
Tem cuidado de ti mesmo e da doutrina. Continua nestes deveres; porque, fazendo assim, salvarás tanto a ti mesmo como aos teus ouvintes.
Durante 28 anos, tenho voltado a esse versículo cada semestre no último dia de aula. No compacto espaço de duas orações breves, há três imperativos e duas promessas. Começaremos com os imperativos, antes de nos voltarmos às promessas.
1. “Tem cuidado de ti mesmo.”
Como um ministro “tem cuidado” de si mesmo? Por cultivar fidelidade à devoção a Cristo e por evitar a erosão de sua devoção a Cristo. Como ele faz isso? Por obediência a um mandamento dado anteriormente neste capítulo: “Exercita-te, pessoalmente, na piedade” (1Tm 4.7). E como ele faz isso? Por praticar consistente e sinceramente as disciplinas bíblicas espirituais, em especial as disciplinas relacionadas à Palavra de Deus e à oração, porque estas são os meios de piedade dados por Deus.
Piedade — uma palavra bíblica que, em essência, é sinônimo de semelhança com Cristo, santidade e santificação — é cultivada pelas disciplinas espirituais pessoais e interpessoais, tanto positiva (vivificação) quanto negativamente (mortificação). Em outras palavras, esses hábitos bíblicos são os meios pelos quais o Espírito Santo trabalha para nos ajudar a experimentarmos a Deus e crescermos na graça, bem como a vencermos o pecado.
Você deve lembrar que esse mandamento foi dado primeiramente a um ministro (Timóteo) e, depois, por extensão, a todos os cristãos. Portanto, querido pastor, não pense que, enquanto seu povo se torna mais e mais piedoso por praticar as disciplinas espirituais, você se torna mais semelhante a Cristo simplesmente por estar no ministério. As tentações e pressões do ministério conspirarão para torná-lo menos piedoso, se você não se exercitar pessoalmente na piedade. Removerão mentalmente tudo que em sua vida está relacionado ao ministério. E, com o que sobrar, poderia se dizer que você está crescendo mais em semelhança a Cristo?
Aconselho-o solenemente a ler a consideração de Richard Baxter sobre 1 Timóteo 4.16 — especialmente as suas oito razões por que você precisa cuidar de si mesmo — em sua obra clássica O pastor aprovado. Observe especificamente a terceira razão de Baxter: você está exposto a tentações maiores do que as de outros. Satanás não é estúpido. Ele sabe que, se fizer você cair, isso terá sobre a igreja um efeito mais prejudicial do que se ele fizer cair o homem que vem uma vez por mês à igreja e senta na última fileira de bancos.
A menos que um pastor — novo ou velho — se dedique aos meios bíblicos de piedade, ele cessará de ser um homem piedoso. E que igreja saudável deseja ter um pastor que não é piedoso?
2. “Tem cuidado… da doutrina.”
Nesse imperativo pastoral, “a doutrina” se refere ao ensino — ao ensino contido em “todo o conselho de Deus” (At 20.27 ARC). Dito em outras palavras: “Estude teologia, pastor!”
Até ao final de sua vida, Paulo foi um exemplo de estudo diligente. Apesar de seu conhecimento completo das Escrituras e de tudo que ele tinha visto e experimentado como apóstolo, Paulo rogou a Timóteo no último capítulo de sua última epístola inspirada: “Quando vieres, traze… os livros, especialmente os pergaminhos” (2Tm 4.13). Se houve uma pessoa que não precisava mais estudar teologia, você não acha que era Paulo? E, se houve algum tempo em que ele não precisava ter cuidado de sua própria doutrina, você não acha que seria antes de ele morrer? Entretanto, Paulo sabia que, enquanto a sua mente estivesse funcionando, não haveria nada melhor a colocar ali do que a verdade da Palavra de Deus.
No transcorrer de décadas, tenho observado que poucos ministros persistem em estudar teologia. Muitos param de ler livros, ouvir mensagens em áudio ou participar de conferências que têm o propósito de aprimorar o seu pensar teológico e aprofundar o seu entendimento doutrinário. O que tem resultado disso? As palavras de David Wells, em seu livro Sem lugar para a verdade, são ainda mais verdadeiras em nossos dias: “Temos agora menos fidelidade bíblica, menos interesse pela verdade, menos seriedade, menos profundeza e menos capacidade de comunicar a Palavra de Deus à nossa própria geração de uma maneira que ofereça uma alternativa ao que ela já pensa”. Em tempos que são muito mais complexos do que 30 anos atrás, a igreja e seus líderes precisam de mais teologia e não de menos teologia.
Igrejas não se elevam em piedade e maturidade bíblica acima do nível da piedade e teologia de seus pastores.
3. “Continua nestes deveres.”
Em outras palavras, “continua a ter cuidado de ti mesmo e da doutrina”. Querido pastor, persevere até ao fim de seus dias em ter cuidado tanto de sua piedade quanto de sua teologia. Você nunca chegará a um nível de maturidade ou a um tempo em sua vida em que não precisará dessa vigilância.
Outra vez, quando Paulo escreve ou fala especificamente aos ministros, ele repete basicamente o que diz aqui para Timóteo. Aos presbíteros da igreja de Éfeso, Paulo diz: “Atendei por vós e por todo o rebanho” (At 20.28). Quando ele diz “por todo o rebanho”, sabemos que está exortando os presbíteros a terem “cuidado da doutrina”, porque no versículo seguinte Paulo os adverte de que logo surgirão falsos mestres “que não pouparão o rebanho” — homens que “arrastarão os discípulos atrás deles” (vv. 29-30).
Para Tito, outro destinatário de uma epístola pastoral, Paulo reitera: “Torna-te, pessoalmente, padrão de boas obras [ou seja, piedade]. No ensino, mostra integridade, reverência, linguagem sadia e irrepreensível, para que o adversário seja envergonhado” (Tt 2.7-8). O principal interesse de Paulo em relação aos pastores permanece o mesmo: “Tu mesmo e doutrina”. Vida e doutrina. Coração e mente. Fogo e luz. Espírito e verdade. Piedade e teologia.
A maioria de nós tende a se inclinar para uma direção ou para a outra, em direção à piedade ou à teologia. Qual é a sua própria tendência? Acautele-se disso e empenhe-se por “vigiar” que sua dedicação a uma não faça a outra definhar.
E acautele-se da tentação de crer que, depois de bastante experiência ministerial, você superará a necessidade de vigilância. Tenho estado no ministério por quase 50 anos e preciso persistir em vigiar agora tanto quanto sempre precisei.
Disciplinas espirituais do pastor e uma promessa
Primeira, “salvarás a ti mesmo”. É seguro pressupor que Paulo acreditava que Timóteo era salvo. Por isso, é provável que o apóstolo esteja lembrando a Timóteo que um pastor verdadeiramente cristão precisa “cuidar de si mesmo e da doutrina”, se espera por segurança de sua salvação final. Mas, ao buscar essa segurança, querido pastor, lembre-se de que nem uma vida devocional regular nem teologia ortodoxa o salvará. Os fariseus eram muito bons em ambas. Nem mesmo uma vida inteira de serviço fiel no ministério pastoral o salvará. Até pastores são salvos tão somente pela obra de Cristo.
E, à semelhança de qualquer outro cristão, pastores também precisam atentar ao mandamento de 2 Coríntios 13.5: “Examinai-vos a vós mesmos se realmente estais na fé”. Mas, à semelhança de qualquer outro cristão, todo pastor que gasta sua vida inteira buscando sinceramente a Cristo por meio das disciplinas bíblicas e da verdade de Deus, na Escritura, exibe firmes indicações de que é salvo.
Segunda, “salvarás aos teus ouvintes”. Levando em conta o aspecto de salvação capacitada pelo Espírito, essa é, também, uma promessa bastante lógica. Por exemplo, quem mais provavelmente deve fazer seguidores da maneira de viver e do ensino de Gandhi? Sem dúvida, será alguém que vive como Gandhi e ensina o que Gandhi ensinou. De modo semelhante, quem mais provavelmente deve ver pessoas se tornarem seguidores de Jesus do que um homem que vive como Jesus e ensina o que Jesus ensinou?
Observe: Deus não promete que você verá tantas pessoas salvas quanto deseja, nem mesmo que você sempre saberá quando pessoas são salvas. Contudo, ele diz que seu ministério resultará em conversões verdadeiras. E prefiro ver dez pessoas verdadeiramente convertidas, em vez de cem pessoas que confessam ser convertidas, mas não o são. Você não prefere isso também?
Seu primeiro chamado
Os “métodos” de 1 Timóteo 4.16 eram o âmago das estratégias evangelísticas, missionárias e crescimento de igreja de Paulo. Ser um homem piedoso — viver e agir como Jesus — é essencial em levar pessoas a Cristo. Conhecer e proclamar as doutrinas de Cristo e da salvação — ou seja, o evangelho — é o meio pelo qual Deus salva pessoas (Rm 1.16). E, nesse versículo, Deus promete que, se você persistir em fazer essas coisas, verá pessoas chegarem a Cristo.
Pastor, você é chamado primeira e principalmente para ser um homem de Deus. Portanto, “Tem cuidado de ti mesmo e da doutrina. Continua nestes deveres”.