Comunidade cristã e panelinhas

Cristo é o elo que une nossa irmandade

Encontrar prazer na culinária é algo que sempre me cativou. A combinação de diferentes aromas e texturas durante o preparo de uma refeição é, para mim, uma experiência única. Recentemente, ao preparar um arroz de forno, comecei por separar todos os ingredientes que queria usar. Piquei e coloquei cada um deles alinhados sobre a tábua. Quantas cores lindas! O pimentão vermelho e amarelo, cebolas brancas, o tomate vermelhinho, ervilhas e salsinha dando um toque verde, o frango refogado e desfiado com um tom dourado e por fim o arroz. O toque especial: o tempero. Ao misturar tudo em um grande refratário, pude sentir o aroma delicioso que subia daquela combinação. O resultado foi uma refeição deliciosa. Isso me fez refletir sobre a comunidade de Cristo.

Temos uma grande tendência de querer viver no corpo de Cristo cercado por amigos iguais a nós. É como se ajuntássemos em uma frigideirinha apenas uma cor de pimentão. Os mesmos gostos musicais, o mesmo nível teológico, a mesma faixa de idade, o mesmo quarto do acampamento de 15 anos atrás. 

Por mais que misturemos o mesmo tipo e cor de pimentões em uma frigideira, eles não deixarão de ser pimentões e de terem o mesmo gosto. Da mesma forma acontece quando nos fechamos em “panelinhas” dentro da comunidade e não permitimos que pessoas diferentes tragam sabores, aromas e texturas para as nossas vidas. Tratamos a igreja como um clube de amigos e não como uma comunidade de irmãos em Cristo. 

Um grupo de amigos é caracterizado por uma união formada a partir de afinidades pessoais, interesses comuns e experiências compartilhadas, sem necessariamente ter uma base espiritual comum. Nesse contexto, as relações são mais diversificadas, e abrangem uma variedade de aspectos sociais e pessoais. Você pode, por exemplo, ter um grupo de amigas do clube crochê ou do time de vôlei, cujo único interesse comum é o que diz respeito à atividade praticada. 

Cristo é o elo que une essa irmandade

Em contraste, um grupo de irmãos em Cristo se destaca por um compromisso espiritual compartilhado, onde a fé cristã serve como fundamento central. Os membros desse grupo consideram-se parte da família espiritual de Deus, compartilhando não apenas momentos sociais, mas também uma jornada espiritual comum. O propósito vai além dos interesses individuais, incluindo crescimento espiritual, estudo bíblico e apoio mútuo na caminhada de fé. Cristo é o elo que une essa irmandade.

A tendência de um grupo de amigos é a de pensar que um pertence ao outro por causa do vínculo criado, seja pelo tempo, seja pelo interesse em comum. Por mais que haja uma grande afeição entre os membros, passa a existir um sentimento de posse de um para com os outros e dos outros para com o um. A “panelinha” é então, fechada com uma tampa hermética, impedindo a entrada ou saída de pessoas. Nesse contexto, expectativas são geradas e, se frustradas, geram mágoa, tristeza e, como o elo que une esse relacionamento é frágil, pode gerar um rompimento permanente da amizade. 

A diferença de se viver uma comunidade de irmãos em Cristo, é que ela só pode existir em e por meio de Jesus. Não pertencemos uns aos outros, pertencemos a ele. Não me uno a outra pessoa pela nossa história ou pelos nossos interesses pessoais, mas unicamente através do que Cristo fez por mim e em mim e do que Cristo fez por ela e nela. O que determina a nossa irmandade é o fato de que Cristo nos uniu por meio de seu sangue e que pertencemos a ele. E quanto mais profunda for essa convicção em nós, menos nos importaremos com as nossas diferenças e mais nos dedicaremos uns aos outros em amor e serviço. O elo é, não somente forte, mas eterno.

Como resultado dessa perspectiva, passamos a contemplar a comunidade não com demandas e necessidades, mas com corações generosos e prontos para doar. A gratidão a Deus se torna o fundamento dos relacionamentos, as expectativas se alinham às coisas celestiais, evitando assim frustrações. O amor dedicado uns aos outros não é motivado por interesses egoístas, mas sim pelo transbordar do amor divino. O abandono de sentimentos prejudiciais, como maldade, engano, hipocrisia, inveja e maledicência (1 Pedro 2.1), dá lugar à evidência do fruto do Espírito, manifestando-se em paz, amor, bondade, longanimidade, fé, mansidão e domínio próprio (Gálatas 5.22). Sob esse novo foco, descortinamos a verdadeira essência da vida em comunidade, onde o amor genuíno e o serviço desinteressado florescem, refletindo a natureza daquele a quem somos chamadas a imitar.

E é dentro desse contexto de irmãos em Cristo, unidos pelo elo permanente e eterno, que encontraremos amigos mais chegados que irmãos (Provérbios 18.24), encontraremos o amigo que ama em todo tempo, e que na angústia se torna irmão (Provérbios 17.17). Teremos amigos que nos ajudarão a levantar em amor e humildade e nos alegraremos por não estarmos a sós nessa jornada (Eclesiastes 4.10). 

O resultado disso é que abraçaremos a diversidade não como um obstáculo ou empecilho, mas como uma valiosa fonte de graça que contribui para nosso contínuo crescimento espiritual em que ferro afia ferro (Provérbios 27.17). Reconheceremos que cada parte do corpo de Cristo, cada pessoa em suas distinções, é uma peça vital para a completude e a riqueza da comunidade. Enxergaremos as diferenças não como divisões, mas como complementos que fortalecem o todo. A panelinha perderá a tampa e os pimentões vermelhos se ajuntarão a uma diversidade de ingredientes que juntos e combinados resultarão na beleza da comunidade cristã.

Querida irmã, que possamos nos lembrar que a unicidade de Cristo é o tempero que une nossa irmandade, transcende nossas diferenças e nos inspira a viver em amor e serviço mútuo. Assim como uma refeição se torna extraordinária com a variedade de sabores, a comunidade cristã se torna verdadeiramente enriquecedora quando permitimos que as diferentes experiências e dons de cada membro contribuam para a complexidade e beleza de nossa jornada conjunta. Que possamos ser como um banquete, onde cada “ingrediente” único adiciona sabor e textura, criando uma experiência comunitária que reflete a profunda unicidade encontrada em Cristo.

Por: Fabiana Linhares. © Voltemos Ao Evangelho. Website: voltemosaoevangelho.com. Todos os direitos reservados. Revisor: Vinicius Lima. Editora: Renata Gandolfo.