Thomas Cranmer 1489–1556

O político reformado

Enquanto o rei Henrique VIII estava morrendo em sua cama, ele queria que um homem viesse e segurasse sua mão. Surpreendentemente, esse homem foi um dos principais proponentes da Reforma Protestante.

Thomas Cranmer ajudou a liderar a Reforma Inglesa, mas ele é um herói improvável ao lado de Lutero, Calvino e os outros reformadores. Ele não escreveu nenhum livro teológico importante ou pastoreou igrejas importantes. De fato, Cranmer não adotou as verdades centrais da Reforma até relativamente tarde em sua vida. Mas durante os anos da Reforma Protestante, ele moldou a teologia inglesa talvez mais do que qualquer outra pessoa que já viveu.

A semente da separação

Nascido em 1489, na pequena vila de Aslockton, Thomas Cranmer cresceu perto do mesmo Sherwood Forrest onde Robin Hood se escondeu três séculos antes. Ele era um leitor lento, levando oito anos para terminar o curso de graduação de quatro anos de Cambridge. Ele perseverou em seus estudos, completou um mestrado, foi ordenado ao ministério e foi eleito por Cambridge para ensinar. Ele construiu uma reputação de incentivar seus alunos a estudar a Bíblia por si mesmos.

Enquanto Cranmer passava seus dias servindo pacificamente em comitês acadêmicos, a Inglaterra estava em turbulência. O rei Henrique VIII queria anular seu casamento com Catarina de Aragão. Por meio de um estranho conjunto de circunstâncias, Cranmer sugeriu a alguns dos conselheiros de Henrique que o rei da Inglaterra não estava sujeito ao governo do papa (para a alegria do rei). O conselho de Cranmer, então, inadvertidamente plantou uma semente que separou a igreja inglesa do catolicismo romano.

O político reformado

Cranmer trocou o catolicismo romano pela doutrina reformada no final de sua vida, uma transformação que refletiu a turbulência e a divisão da Reforma Inglesa. Enquanto estudante em Cambridge, ele leu Martinho Lutero com ceticismo, mas se acostumou com o pensamento reformado depois de fazer amizade com Simon Grynaeus e Andreas Osiander. Ele acabou rejeitando a doutrina da transubstanciação após conversas com seu amigo Nicholas Ridley. Cranmer então esclareceu suas reformas litúrgicas por meio de conversas com o reformador italiano Pedro Mártir e o reformador alemão Martin Bucer.

A teologia de Cranmer mudou muito dramaticamente aos olhos dos católicos romanos ingleses e muito lentamente na percepção dos evangélicos de mentalidade reformada. Para alguns (ainda hoje), as reformas de Cranmer pareciam muito pessoais e politicamente motivadas. Mas ele não teve o luxo de desenvolver crenças abstratas entre um grupo de acadêmicos desinteressados. Sua teologia foi formada em um caldeirão pastoral e político volátil de crises.

Pai da Igreja Anglicana

As maiores realizações ministeriais de Cranmer vieram durante o governo de Eduardo VI, quando ele reescreveu as liturgias públicas, sermões pastorais (ou homilias), orações privadas e artigos de fé. Esses escritos definiram a estrutura doutrinária e a piedade pessoal que mais tarde se desenvolveu na Igreja Anglicana, pela qual ele é mais lembrado.

Cranmer queria que todos nas igrejas inglesas abraçassem a justificação somente pela fé. Ele escreveu,

Esta proposição – que somos justificados somente pela fé, livremente e sem obras – é falada para tirar claramente todo o mérito de nossas obras, como sendo insuficientes para merecer nossa justificação nas mãos de Deus; e, assim, expressar mais claramente a fraqueza do homem e a bondade de Deus, a imperfeição de nossas próprias obras e a graça mais abundante de nosso Cristo Salvador; e, assim, atribuir totalmente o mérito e o merecimento de nossa justificação somente a Cristo e seu mais precioso derramamento de sangue. (The Works of Thomas Cranmer, 131)

Retratação dupla

Quando a rainha católica romana Maria I assumiu o poder, as convicções reformadas de Cranmer custaram-lhe a vida. Durante um período agonizante de três anos, ele foi preso, isolado, humilhado, interrogado e torturado. Ele foi forçado a assistir seus amigos, Nicholas Ridley e Hugh Latimer, serem queimados vivos.

Mais tarde, em sua própria execução, Cranmer quase sucumbiu e se retratou de suas crenças, mas esse estadista geralmente hesitante e quieto demonstrou poderosamente sua fé em Cristo enquanto era queimado na fogueira.

O ladrão no trono

Mas o momento que melhor ilustra o legado duradouro de Cranmer não foi o dia de sua própria morte, mas um dia nove anos antes, quando ele estava ao lado do rei Henrique VIII no leito de morte. Em 27 de janeiro de 1547, o rei Henrique estava morrendo. Um atendente perguntou-lhe quem ele desejava ter ao lado da cama. O rei perguntou por Thomas.

Quando Cranmer chegou, o rei Henrique não conseguia falar. Foxe conta a história.

Então o arcebispo, exortando-o a colocar sua confiança em Cristo e invocar sua misericórdia, desejou-lhe, embora não pudesse falar, que desse algum sinal com os olhos ou com a mão de que confiava no Senhor. Então o rei, segurando-o com a mão, torceu a mão o mais forte que pôde. (Foxe’s Book of Martyrs, 748)

A cena pontua docemente a amizade mais importante da Reforma Inglesa. O que quer que o rei Henrique acreditasse quando apertou a mão de Cranmer naquele dia, Deus usou o vínculo entre eles para libertar a Inglaterra do catolicismo romano e recuperar o único evangelho verdadeiro.

 

Para saber mais sobre Thomas Cranmer:

Thomas Cranmer: A Life por Diarmaid MacCulloch

Thomas Cranmer’s Doctrine of Repentance: Renewing the Power to Love por Ashley Null

 

Publicado originalmente em DesiringGod.org e traduzido e distribuído em Português em parceria com o Ministério Fiel e Voltemos ao Evangelho.
Produção de audio por DBVoz Studios (voz de Duda Baguera). Revisão e edição por Vinicius Lima.