Um Redentor Qualificado (Paul Washer) [19/26]

E o Verbo se fez carne e habitou entre nós. (João 1.14)

A quem Deus propôs, no seu sangue, como propiciação, mediante a fé. (Romanos 3.25)

Antes de voltarmos nossa atenção para um estudo mais detalhado de Cristo enquanto nossa propiciação, ajudará se considerarmos os requisitos exigidos para tal função. Para ser claro, a morte do sacrifício é completamente insignificante a não ser aquele que oferece sua vida como propiciação seja verdadeiramente qualificado para fazê-lo. Em outras palavras, o valor do ato depende do caráter daquele que o está executando. A maioria dos evangélicos considera a cruz de Cristo com grande ênfase no que ele fez, e com razão, mas nós frequentemente damos pouca ênfase em quem ele é. Jesus era tanto Deus quanto homem, tanto impecável (sem pecado) quanto de valor infinito. Se ele não se adequasse a todas essas qualificações, então sua oferta por nós não conquistaria nada. Ainda assim, nós veremos que ele era tudo isso e mais. Portanto, Jesus era singularmente qualificado para oferecer sua vida como um sacrifício expiatório e para ser o Salvador do mundo.[1]

Uma palavra de alerta

Nós precisamos sempre ter grande cuidado toda vez que falarmos ou escrevermos sobre a pessoa de Jesus Cristo. Nós não podemos compreender completamente o mistério do Deus encarnado e a exata função de suas naturezas divina e humana em nossa redenção. Assim como o apóstolo Paulo escreveu, “Evidentemente, grande é o mistério da piedade: Aquele que foi manifestado na carne foi justificado em espírito, contemplado por anjos, pregado entre os gentios, crido no mundo, recebido na glória.”[2]

Ao longo da história da igreja, houve muitas heresias a respeito da exata relação entre as naturezas divina e humana da pessoa de Jesus Cristo. Alguns desses falsos ensinos vieram de hereges que procuraram negar tanto a divindade de Cristo quanto sua humanidade. No entanto, outros ensinos errôneos vieram também de cristãos sinceros que simplesmente tomaram para si a responsabilidade de explicar a questão sem deixar espaço para o mistério. Portanto, nós precisamos nos esforçar para falarmos e escrevermos com precaução. Nessa questão, é melhor falar muito pouco do que falar demais; é melhor incluir muitas coisas à categoria do mistério ao invés de tentar remover todo o mistério acrescentando coisas às escrituras. Como Moisés nos alertou: “As coisas encobertas pertencem ao SENHOR, nosso Deus, porém as reveladas nos pertencem, a nós e a nossos filhos, para sempre, para que cumpramos todas as palavras desta lei.”[3]

Duas naturezas e a obra da salvação

As Escrituras testemunham constantemente que somente Deus é o Salvador e ele não compartilha sua divina prerrogativa gloriosa com ninguém. Falando por meio do profeta Isaías, Deus declara: “Eu, eu sou o SENHOR, e fora de mim não há salvador.”[4] Mesmo nesta era secular, não existe falta de deuses ou salvadores. No entanto, contra a maré dessa variedade de divindades e salvadores, as Escrituras são a única fonte que declara a salvação como a obra exclusiva de um único Deus verdadeiro que criou o céu e a terra. Assim como o profeta Jonas declarou da barriga do grande peixe: “Ao SENHOR pertence a salvação!”[5] Portanto, atribuir a obra da salvação ou garantir o título de “Salvador” a qualquer ser que não seja Deus é uma grande blasfêmia.

Essa verdade bíblica apresenta um problema pra qualquer um que considere as reivindicações do Novo Testamento a respeito da pessoa e da obra de Jesus Cristo. À luz do que sabemos sobre salvação como a obra exclusiva de Deus, e à luz das incontáveis referências a Jesus como Salvador, as seguintes conclusões permanecem: Se Jesus é o Salvador, então ele é Deus no mais estrito sentido do termo. Se Jesus não é Deus no mais estrito sentido do termo, então ele não é Salvador algum.

Aqueles que negam a divindade de Cristo e ainda assim declaram beneficiarem-se de sua morte estão em grande contradição. Ele não pode salvar se não for Deus. No entanto, se Jesus é divindade verdadeira, então não existe contradição quando o profeta Isaías declara não existe nenhum salvador além de do SENHOR, e o apóstolo Pedro proclama que não existe salvação em ninguém além de Jesus.[6] Além disso, Isaías pode certamente advertir os confins da terra a se voltar somente a Deus para salvação, e o apóstolo Paulo pode clamar que “todo aquele que invocar o nome do Senhor será salvo.”[7]

Para ser o Salvador do mundo era necessário que Cristo fosse Deus, e também é verdade que a justiça de Deus exigia que o pecado fosse punido na mesma natureza na qual ele foi cometido.[8] Portanto, aquele que morreu tinha que ser um homem. Foi o homem que transgrediu a lei de Deus e era um homem que deveria morrer. Assim como Deus falou por meio do profeta Ezequiel: “A alma que pecar, essa morrerá.”[9] Para que tal alma fosse livre da justa sentença de Deus, era necessário que outra alma da mesma natureza morresse no lugar dela. O autor de Hebreus apoia essa verdade com a opinião de que é impossível que o sangue de bois e cabras remova os pecados da humanidade, que é superior a eles.[10] Somente um homem que foi verdadeiramente um com a raça de Adão poderia tomar o lugar do culpado e fazer expiação pelos pecados deles.

A Escritura ensina que Jesus de Nazaré foi esse homem. O autor de Hebreus nos diz que visto que ele veio para “dar ajuda” aos descendentes de Abraão, foi necessário que ele se tornasse como seus irmãos em todas as coisas, e visto que as crianças partilham de carne e sangue, ele próprio, igualmente, partilhou do mesmo.[11] Foi por essa razão que quando o apóstolo Paulo escreveu de Cristo como o único mediador entre Deus e o homem, ele se referia a ele como “o Homem” Cristo Jesus.[12] Para ser o Salvador do povo de Deus, era necessário que o Verbo se tornasse carne e vivesse entre nós, e que, “subsistindo em forma de Deus”, ele se fez em semelhança de homens.[13] A declaração famosa de Pilatos “Ecce Homo” (“Eis o Homem”) é somente mais um lembrete de que Jesus Cristo foi aquele homem![14]


[1] João 4.42; João 4.14

[2] 1 Timóteo 3.16

[3] Deuteronômio 29.29

[4] Isaías 43.11; veja também Oséias 13.4

[5] Jonas 2.9

[6] Atos 4.12

[7] Isaías 45.22; Romanos 10.13

[8] Francis Turretin, Institutes of elenctic Theology (Phillipsburg, N.J.: P&R, 1994), 2:303.

[9] Ezequiel 18.4

[10] Hebreus 10.4

[11] Hebreus 2.14-17

[12] 1 Timóteo 2.5

[13] João 1.1, 14; Filipenses 2.6

[14] João 19.5

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O Poder e a Mensagem do Evangelho (Paul Washer)Extraído do livro 19º capítulo do livro “O Poder e a Mensagem do Evangelho” de Paul Washer, a ser lançado pela Editora Fiel. Tivemos a oportunidade de traduzi-lo e o privilégio de poder compartilhar pequenos trechos de cada capítulo com vocês.

Tradução: Vinícius Musselman Pimentel. Versão não revisada ou editada. Postado com permissão.

© Editora Fiel. Todos os direitos reservados. Original: Um Redentor Qualificado (Paul Washer) [19/26]

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