Um blog do Ministério Fiel
Evangelho na Periferia – Princípio 8: Evite o Paternalismo
Evite paternalismo e dependência
Muitos missiólogos importantes do ocidente têm lidado com a questão do paternalismo em contextos transculturais por décadas. O que exatamente é paternalismo?
A essência do paternalismo é a provisão de direção e recursos de fora por parte de alguém “maduro” para alguém considerado “imaturo” e ainda não capaz de carregar totalmente a responsabilidade de liderança. Apesar de ser muito mais do que prover dinheiro, o dinheiro é uma força tremenda de paternalismo.
Foi uma questão contra a qual lutei no Brasil quando plantei a “Igreja Boas Novas”. Nós queríamos passar responsabilidade total para um pastor brasileiro rapidamente, mas muitos missionários acreditavam que eu deveria ficar mais tempo para “treinar e desenvolver” o povo. Eu estava com 31 anos de idade, tinha somente 8 anos de convertido, era minha primeira plantação de igreja, eu falava português básico e eu tinha uma experiência pastoral limitada. O homem que eles queriam que eu “treinasse e desenvolvesse” estava perto dos 50 anos, era um cristão a mais de 20 anos, pastor há pelo menos 20s5 anos, era professor de Grego e Hebraico em um seminário local e desejava assumir o pastoreio da igreja. Diga-me você, quem precisava ser “treinado e desenvolvido”? A questão é que eu era branco, ocidental e tinha algumas libras a mais no banco, o que de alguma forma me qualificaria mais do que meu amigo brasileiro. Eles estavam errados e eu fui embora.
O paternalismo pode ser um perigo na periferia, especialmente quando cristãos de classe média podem parecer superiores àqueles que não tiveram a mesma educação básica ou mesmo que não leram tantos livros quanto eles. Eles podem ver as pessoas aqui como, de alguma forma, inferiores e necessitadas de seus tipos particulares de piedade e experiência espiritual. Em Niddrie, eu trabalho duro para assegurar que as pessoas saibam que somos todos iguais aos olhos de Deus e que alguns de nós possuem talentos específicos. O ponto é que todos que vêm a Cristo foram salvos para servir, e para tanto, o Espírito Santo os capacita, equipa e dá dons para todos a fim de que possam servir melhor ao Senhor. A chave é não exaltar um dom acima dos outros, mas descobrir os dons em cada indivíduo. Nós precisamos dar às pessoas uma chance de servir, ao invés de esperar que elas de alguma forma mágica estejam “prontas” ou sentirmos que eles organizaram todas as áreas das suas vidas. Caso contrário, nós vamos esperar por muito tempo pelo desenvolvimento em qualquer nível na periferia. O paternalismo (muito ligado ao controle) é um jogo seguro de se jogar, mas normalmente resulta em crescimento atrofiado, tanto do indivíduo envolvido quanto do testemunho do evangelho na comunidade. Muitas igrejas e organizações cristãs trabalham sobre este princípio. Tantos ministérios de misericórdia fazem um grande trabalho alcançando os pobres, mas então os deixam ociosos quando se trata de discipulado e serviço. A quantidade de igrejas que me telefonam porque alcançaram uma pessoa e eles “não tem o tempo, recursos ou experiência” (palavra deles) para discípulá-la é, francamente, vergonhoso. Isto não quer dizer que não deveríamos estar ajudando uns aos outros em parceria (muitas pessoas precisam sair da periferia onde moram para crescer e se desenvolver), mas as igrejas precisam se perguntar quantas pessoas vindas de comunidades pobres têm recebido a oportunidade de fazer algo mais do que arrumar as cadeiras no domingo. Quantos cristãos de origem pobre estão em treinamento para serem líderes no Reino Unido? Quanto do problema no Reino Unido é porque, na verdade, se formos honestos, muito do que é chamado alcançar é na verdade paternalismo disfarçado?
Muito conectado a isso está o problema da dependência. Uma vez que alcançamos as pessoas e elas se tornam parte da comunidade (tanto como cristão quanto de outra forma), nós temos que ensiná-las a assumir responsabilidades por suas próprias vidas. O risco para muitos ministérios da periferia é que eles podem criar dependência. O governo (e a sociedade) está pagando o preço por isto agora com nosso sistema de assistência atual. No Antigo Testamento, em especial, nós lemos que Deus ensinou seu povo a cuidar do pobre, mas também lemos em Deuteronômio 24 e Levítico 19 que ele ensinou o princípio da “respigadura” para que eles pudessem cuidar de si mesmos. Sim, devemos tentar cuidar das necessidades do nosso povo primeiro (cristãos) e só depois daqueles na comunidade mais ampla, mas também precisamos tentar criar mecanismos pelo quais as pessoas podem trabalhar para amenizar sua própria situação (nós oferecemos vários incentivos para tal em Niddrie). Se eles não estão preparados para buscar maneiras (em parceria conosco) de melhorar suas próprias vidas, então nós não estamos preparados para fazer isso no lugar deles. Eu acredito que estamos em um fundamento bíblico sólido com essa abordagem tanto para evangelismo quanto para discipulado aqui.
Nós cometemos alguns erros nessa área em Niddrie, mas Deus tem sido gracioso para conosco. Eu oro para que ele continue sendo assim, já que vamos cometer mais erros no futuro. Algumas vezes as coisas ficam bagunçadas na periferia e não existe uma resposta fácil. Às vezes, existem soluções rápidas (raramente), mas com frequência é trabalho doloroso. As pessoas simplesmente querem sair do momento de dor que estão vivendo e nosso instinto é fazer isto por elas, mas precisamos ser corajosos o suficiente para ver o quadro mais amplo e não simplesmente colocar um curativo em uma ferida aberta. Deus nos ajude à medida que alcançamos os muitos necessitados à nossa porta, de maneira que glorifique a Deus, honre o evangelho do Senhor Jesus Cristo, sirva a nossa comunidade e capacite aqueles que estão necessitados para, em parceria conosco, ajudarem a si mesmos, de forma que possam devolver isso de alguma forma à sociedade, ao invés de só receberem o tempo todo.