Um blog do Ministério Fiel
A presença de Cristo na Ceia do Senhor
Na Confissão de Fé de Westminster, Artigo 29, parágrafo 7, lemos estas palavras:
Comungantes dignos, que participam exteriormente dos elementos visíveis deste sacramento, também recebem intimamente, pela fé, real e verdadeiramente, a Cristo crucificado e todos os benefícios da sua morte, e nele se alimentam, não carnal ou corporalmente, mas espiritualmente; não estando o corpo e o sangue de Cristo corporal ou carnalmente no pão e no vinho, nem com eles ou sob eles, mas espiritual e realmente presentes à fé dos crentes nessa ordenança, como estão os próprios elementos presentes a seus sentidos exteriores.
Nesta confissão, vemos uma distinção entre a presença real e a presença física de Jesus. Quando articula esta noção da presença real de Jesus, o que ela significa é que, espiritualmente falando, ele está realmente presente. O que isto significa? Primeiro, vamos considerar o que não significa. Às vezes, dizemos: “Não posso estar com você no próximo domingo, mas estarei em espírito”. O que queremos dizer, quando falamos isso? Queremos dizer que, embora eu esteja ausente de você em termos de localização física, estarei pensando em você. Isso pode ser considerado como um tipo de presença espiritual. Mas, dificilmente entenderíamos esse sentido de alguém estar presente em algum lugar em espírito como uma presença real. Isto não é, certamente, o que a Confissão significa ou o que os reformadores como João Calvino queriam dizer, quando falaram sobre a presença real e espiritual de Cristo na Ceia do Senhor.
O que Calvino queria dizer? Primeiro de tudo, vejamos a importante fórmula de Calvino, que é expressa na frase latina finitum non capax infinitum. Este é um princípio filosófico extraído da razão e da lógica. Calvino estava dizendo que o finito não pode conter o infinito. Se você tem uma quantidade de água infinita, não pode conter essa água em um copo de 200 ml. Simples de entender, certo?
Quanto à natureza humana de Jesus, Calvino afirmou que o corpo humano de Jesus não poderia conter a infinitude da deidade do Filho de Deus. Esta é apenas outra maneira de dizer que, embora o corpo humano de Jesus não seja onipresente, a natureza divina de Cristo é. Todavia, Calvino não disse apenas que Cristo está verdadeiramente presente na Ceia do Senhor, em referência à sua natureza divina, mas também que, na Ceia do Senhor, os que dela participam são verdadeiramente fortalecidos e nutridos pela natureza humana de Cristo. Como isso é possível, se a natureza humana não é onipresente? Calvino disse que Cristo se torna presente a nós por meio da natureza divina.
No Novo Testamento, Jesus fala sobre ir embora e ficar: “Filhinhos, ainda por um pouco estou convosco; buscar-me-eis, e o que eu disse aos judeus também agora vos digo a vós outros: para onde eu vou, vós não podeis ir” (Jo 13.33). Os discípulos viram-no subir ao céu, mas ele lhes disse: “Embora num sentido eu vá para o Pai, apesar disso, noutro sentido, estou com vocês, sempre, até ao fim dos séculos”. Jesus falou sobre uma presença e uma ausência. Além disso, quando Paulo falou sobre o ministério terreno de Cristo, disse que nunca conheceu a Cristo “kata sarka”, ou seja, na carne. Nunca viu a Cristo em sua encarnação terrena; o apóstolo não conheceu a Cristo durante seu ministério terreno. A Bíblia fala que Cristo está à direita de Deus, e a ideia é que ele não está lá em termos de sua presença visível, física.
O Catecismo de Heidelberg fala sobre isto, quando diz: “No que concerne à natureza humana de Cristo, ele não está mais presente conosco”. A igreja sempre entendeu que a natureza humana subiu ao céu. “No que concerne à sua natureza divina”, diz o catecismo, “ele nunca está ausente de nós”. Embora Cristo tenha subido ao céu em sua natureza humana, sua natureza divina permanece onipresente e está especialmente presente na igreja. Isso não significa que no momento da ascensão, a natureza humana foi para o céu e deixou a natureza divina e que a perfeita união das duas naturezas foi desfeita? Não. A encarnação ainda é uma realidade. Era uma realidade até mesmo na morte de Cristo. Na morte de Cristo, a natureza divina estava unida com um corpo humano; a alma humana foi ao céu, e a alma humana que foi ao céu estava unida com a natureza divina. O corpo humano, que estava no sepulcro, estava unido com a natureza divina. Então, se podemos entender que a natureza humana é localizada porque é humana, a natureza humana está em algum outro lugar que não é este mundo. No entanto, a natureza humana, no céu, permanece perfeitamente unida com a natureza divina.
Lembre que, se estamos em comunhão com a natureza divina, estamos em comunhão com a pessoa do Filho de Deus em tudo que ele é. Quando eu o encontro aqui, na natureza divina, e entro em comunhão com a pessoa de Jesus, esta natureza divina permanece conectada e unida com a natureza humana. Por ter comunhão com a natureza divina, tenho comunhão não somente com a natureza divina, mas também com a natureza humana, que está em perfeita unidade com a natureza divina, sem haver a natureza humana tomado para si mesma a habilidade de estar em todos estes diferentes lugares. Lembremos: em nenhum momento a natureza humana está separada da natureza divina; por isso, podemos afirmar a unidade das duas naturezas e afirmar a localização da natureza humana sem deificá-la. E a pessoa de Cristo pode estar presente em mais de um lugar, mais do que uma vez, por virtude da onipresença da natureza divina.
É importante que vejamos a diferença entre esta opinião e a opinião católica romana. A opinião católica romana atribui poder à natureza humana de descer à terra em todos os lugares diferentes, ao mesmo tempo. Desta maneira, pode-se achar o corpo humano de Cristo em quantas igrejas romanas existirem no mundo. Rejeitamos esta opinião porque o corpo de Cristo está no céu. Nós nos encontramos com a pessoa real de Cristo em todas as nossas várias igrejas e entramos em comunhão bendita com o Cristo todo por virtude do contato que temos com sua natureza divina, mas o seu corpo humano permanece localizado no céu. Isto é consistente com a maneira como Jesus fala no Novo Testamento, quando diz: “Eu vou para o Pai, mas estarei com vocês”. A presença de si mesmo, que ele promete no Novo Testamento, é uma presença real e comunhão real com seu povo.
Considere de novo a Confissão de Westminster:
No sacramento, participamos não apenas exteriormente dos elementos visíveis, mas também recebemos intimamente, pela fé, real e verdadeiramente, a Cristo crucificado e todos os benefícios da sua morte, e nele nos alimentamos, não carnal ou corporalmente, mas espiritualmente; não estando o corpo e o sangue de Cristo corporal ou carnalmente no pão e no vinho, nem com eles ou sob eles, mas espiritual e realmente presentes à fé dos crentes nessa ordenança, como estão os próprios elementos presentes a seus sentidos exteriores.
Por causa da onipresença do Filho de Deus, em sua deidade, nos encontramos realmente com o Cristo todo na Ceia do Senhor e somos nutridos pelo Pão do Céu.
Uma observação final a respeito do ensino da Igreja Católica Romana sobre a Ceia do Senhor. Eles creem que a missa representa uma repetição da morte sacrificial de Cristo, toda vez que é celebrada. Cristo é, por assim dizer, crucificado de novo. É claro que a Igreja Católica Romana ensina que há uma diferença entre o sacrifício original que Jesus fez, no Calvário, e a maneira como o sacrifício é oferecido na missa. A diferença é esta: no Calvário, a morte sacrificial de Jesus foi uma morte que envolveu sangue real. O sacrifício que é feito hoje é um sacrifício sem sangue. No entanto, é um sacrifício real e verdadeiro. Foi esse aspecto, bem como a doutrina da transubstanciação, que causou muita controvérsia no século XVI, porque pareceu aos reformadores que a ideia de uma repetição, de qualquer tipo, viola o conceito bíblico de que Cristo foi oferecido de uma vez por todas. Portanto, no ponto de vista católico romano sobre a natureza sacrificial da missa, os reformadores viram uma rejeição do caráter “uma vez por todas” da oferta sacrificial realizada por Cristo em sua expiação (Jo 19.28-30; Hb 10.1-18).