Um blog do Ministério Fiel
A relíquia da senhora Edwards
O trecho abaixo foi retirado com permissão do livro 8 Mulheres de Fé, de Michael Haykin, Editora Fiel.
Uma revista pouco conhecida, The Panoplist and Missionary Magazine United, publicou um arquivo intitulado “A Relíquia da Senhora Edwards”, que contém um relato raro e aparentemente genuíno da experiência cristã inicial de Sarah. De acordo com o editor dessa revista, os parágrafos que se seguem foram extraídos “com poucas alterações verbais, de um papel com a letra da senhora Sarah Edwards”, “datado de 22 de outubro de 1735…”.
“Tenho olhado neste dia para as razões de minha esperança em relação ao meu futuro estado, e não me falta esperança de que estou em paz com Deus. Cerca de nove anos atrás, fui levada a ver meu perigo de destruição eterna; mas tomei a decisão de buscar misericórdia. Eu pensava que, se algum dia perecesse, seria aos pés do Redentor. As palavras “ainda que ele me mate, nele esperarei” com frequência vinham à minha mente. Não muito depois disso, o capítulo 44 de Isaías, versos 4, 5 e 6[i], eram palavras que derretiam meu coração. Pareciam ser um chamado de Deus para mim, e acredito que fui capacitada pela fé a ouvir e obedecer a ele. No sábado seguinte, fui levada a apreciar a proximidade de Cristo como a maior felicidade da criatura. Minha alma tinha sede dele, de modo que a morte nada parecia para mim, desde que eu pudesse estar com ele; pois ele era completamente adorável. E esse estado de espírito continuou por algum tempo.
No inverno seguinte, mais do que nunca, tive uma compreensão maior do meu próprio estado vil. Eu podia dizer de fato que me detestava e me arrependia no pó e na cinza. Não era por causa do mal que o pecado traria sobre mim, mas porque ele desonrava a Deus. Essa visão do pecado tinha uma grande propensão a me quebrantar e me inclinar a buscar a Deus pelo perdão. Eu tinha grande confiança em meu amor por Cristo; e não sentia medo de apelar a ele, como Pedro fez, e dizer: “Senhor, tu sabes de todas as coisas; tu sabes que te amo”. Eu amava a Cristo pelo que ele era em si mesmo; eu o amava em todos os seus ofícios; eu vi minha absoluta necessidade dele em todos os seus ofícios; e pensava que estava tão disposta a ser governada por suas leis quanto a ser salva por seus méritos. Encontrei uma disposição de ir a Deus como a um pai. Uma maneira de ser salva que esvazia a alma e exalta a Deus era no que eu grandemente me deleitava. Os pensamentos do meu coração eram “O que possuo que não tenha recebido?” e “Quem me faz sobressair?”. Eu sentia grande amor pelo povo de Deus; ainda que fossem pessoas de quem antes não gostasse; ainda assim, eu sentia terna afeição em relação a eles e prazer em sua companhia. Durante seis meses depois disso, senti muito pouco medo da morte. Cristo, como eu sabia, tinha vencido a morte. Nesse período, senti tamanha paz interior e descanso na alma ao refletir sobre essas coisas que não consigo expressar. A vaidade do mundo era muito grande ao meu ver. Parecia quase impossível que, em algum momento, eu pudesse estar sequer um pouco inquieta sobre qualquer coisa com que pudesse deparar neste mundo; pois todas as coisas estavam à disposição de Deus. Isso foi o bastante para me fazer, com paciência e humildade, suportar o que quer que me acontecesse. Eu pensava que Lamentações 3.39, “Por que, pois, queixa-se o homem vivente? Queixe-se cada um de seus próprios pecados”, devia ordenar o silêncio de todos, embora deparassem com coisas tão contrárias ao seu modo de pensar.”
Em julho de 1727, casei-me e me mudei de New Haven para Northampton. Por algum tempo antes de vir para cá, quase tudo o que eu pedia era que Deus viesse comigo. A oração de Moisés estava muito presente em meu coração. E eu espero que Deus tenha estado comigo aqui.
No outono após a minha chegada, preocupei-me com o medo de que fosse como os ouvintes do solo rochoso. Eu temia que, se provada com perseguição, viesse a cair. Mas Deus me mostrou que ele poderia facilmente me tornar disposta a morrer pela sua causa, se me chamasse para isso; e que, por meio de Cristo, que me fortalece, eu poderia me regozijar nas chamas.
Eu tinha o espírito de me regozijar em Deus como a porção da minha alma, e meu desejo mais sincero tem sido que eu possa me aproximar até mesmo do seu tribunal; e, para mim, vale mais um dia em seus átrios do que mil em outro lugar. Eu me alegrava no fato de que o Senhor reina.
Durante um tempo de grande aflição, eu dizia com frequência: a quem tenho no céu além de ti? E não há ninguém na terra que eu deseje além de ti. Minha alma tem sede de Deus, o Deus vivente. Quando virei e estarei diante de Deus?
Eu costumava dizer no meu coração: há alegria em crer. Eu sinceramente desejava imitar o exemplo de Cristo, na paciência, na humildade e na autonegação.
Nesse texto, Sarah se engaja em uma típica reflexão puritana sobre as razões que tem para acreditar que é verdadeiramente filha de Deus. O fato de ela, afinal, deleitar-se em uma salvação que esvaziava a alma e exaltava a Deus foi determinante para sua paz de espírito em relação à autenticidade de sua conversão.
Após o seu casamento com Jonathan, em 1727, Sarah ficou extremamente ocupada com as questões domésticas, pois o casal teve onze filhos entre 1728 e 1750. Embora Jonathan desempenhasse papel significativo como mentor espiritual de seus filhos, boa parte da criação deles recaía sobre Sarah. É compreensível que a pressão das obrigações maternas e de todas as outras tarefas em administrar uma casa cheia e movimentada tenha pesado grandemente sobre ela. Para lidar com isso, Sarah entregou a si mesma e tudo o que ela era sem reserva a Deus em pelo menos algumas ocasiões diferentes em 1739 e 1740. Essa abnegação – na tradição puritana, no sentido de fazer uma aliança pessoal com Deus – viria a ser o fundamento de algumas experiências extraordinárias no final de janeiro e começo de fevereiro de 1742. Jonathan esteve longe de Northampton por boa parte desse período, em uma viagem de duas semanas para pregar que envolvia pelo menos oito reuniões em Massachusetts e Connecticut. Enquanto ele esteve fora, outros ministros – dentre eles, o mais notável era Samuel Buell (–1798), que mais tarde se estabeleceu em East Hampton, Long Island, e cujo sermão de ordenação Edwards pregou em 1746 – subiram ao púlpito em Northampton. Sarah estava inquieta com muitas coisas naquele momento, em especial um comentário que seu marido fizera, pouco antes de partir em sua viagem para pregar, de que ele acreditava que Sarah “tinha falhado em alguma medida na questão da prudência em uma conversa que tivera com o sr. [Chester] Williams”, um ministro em Hadley e primo distante. Sarah estava angustiada por não ter “uma boa opinião de meu marido”. Outras situações de estresse – por exemplo, as finanças e os ciúmes em relação à bênção sobre o ministério de outros em Northampton, tais como Buell e Williams – levaram algumas pessoas a sugerirem que as experiências de Sarah faziam parte de um colapso nervoso. Elisabeth Dodds, por exemplo, descreve Sarah se tornando uma tagarela grotesca, alucinada e bastante fraca”. Edwards, por sua vez, estava convicto de que as experiências de sua esposa representavam um encontro genuíno com o Deus trino e de que o estresse em sua vida era o meio de Deus trazê-la a um ponto de absoluta submissão à sua doce soberania.
[i] Isaias 44.4-6 e brotarão como a erva, como salgueiros junto às correntes das águas. Um dirá: Eu sou do Senhor; outro se chamará do nome de Jacó; o outro ainda escreverá na própria mão: Eu sou do Senhor, e por sobrenome tomará o nome de Israel. Assim diz o Senhor, Rei de Israel, seu Redentor, o Senhor dos Exércitos: Eu sou o primeiro e eu sou o último, e além de mim não há Deus.