Nenhum homem no seu corner

Porque todo filho precisa de um pai

Tenho repetido aquela cena em minha mente mais vezes do que posso contar. As luzes fluorescentes enchiam o porão com um tom dourado. Os móveis estavam desgastados e a mesa inclinada. Eu não sabia onde estávamos ou quem era aquele homem. Lembro de observar o rosto da minha mãe. Ela parecia gostar dele. Ele devia ser de confiança.

Ele era alto. Moreno. Se parecia mais comigo do que minha mãe. Lembro-me que ele parecia gostar de mim, e eu apreciava isso. Ele se inclinava, me fazia perguntas e me dava doces. Mas quando eu perguntava se ele queria sair para jogar bola, ele dizia que não podia. Alguém não o deixaria sair. A casa de recuperação tinha regras que um garoto não conseguia entender.

E, aparentemente, não conseguia entender a vida também. Os anos se desenrolaram com promessas quebradas, aniversários esquecidos e natais passados olhando para a porta. Com o passar do tempo, o molde se acomodou e o concreto endureceu. Sentimentos de “passei pela sua casa outro dia para ver meu irmão” – sem pensar em parar e ver seu filho – passaram a ser recebidos com um fingido encolher de ombros. Isso não me afetaria. Não poderia me afetar. Eu havia amadurecido muito cedo e adultos não precisam da ajuda de seu pai.

E essa mesma dor, frustração e desespero pelo pai, que eu (e tantos como eu) odiava, se apresentou novamente diante dos meus olhos nesse fim de semana.

Um homem no Corner

De várias maneiras, a história de Adonis Creed é a história de muitos meninos negros. Apesar da linguagem obscena e de uma cena insinuante, a história é uma imagem pungente de uma ausência predominante. Embora seu pai, o famoso boxeador Apollo Creed, tenha morrido no ringue – uma ausência mais desculpável que a maioria – ele ainda havia crescido sem um pai. Por um tempo, ele lutou passando por diversos lares adotivos, até a esposa de Apollo (que não era a mãe biológica de Adonis) o acolher. Mesmo com Apollo morto, Adonis ainda clamava por ele.

Com raiva, endurecido, perdido, ele entra no ringue sozinho para encontrar seu pai, bem como, tentar também encontrar a si mesmo. Mas não há nenhum homem no corner dele. Ninguém para ensiná-lo a jogar um gancho de direita ou um “uppercut” de esquerda, nem como pedir uma garota em namoro ou como lidar com as dificuldades em sua família. O que torna o filme impactante é que Adonis encontra um pai em Rocky Balboa.

Lutando para ser pai de seu próprio filho, após a morte de sua esposa, Rocky se torna um mentor improvável e uma figura paterna para o jovem. Ele o treina, apoia e dá conselhos paternais. Eles têm um relacionamento cativante. Eles lutam verbalmente um com o outro. Ficam bravos e magoados um com o outro. Perdoam. Vão para a luta juntos. Em essência, eles são pai e filho.

O vínculo entre eles é contrastado brilhantemente com o imponente oponente de Creed: Viktor Drago. Nascido no ódio, treinado pelo pai desde criança, ele come, dorme e respira lutando. Viktor é o filho do homem que matou o pai de Creed. Ele foi treinado na esperança de se vingar de Rocky, que derrotou Drago, que custou tudo para a família. Ele é mais arma do que filho. O pai de Drago está presente, mas é cegado pela vingança. O filme é sobre duas famílias, dois relacionamentos de pai e filho e o poder desses relacionamentos para formar ou destruir homens.

O Credo do Apóstolo

Crescendo no centro da cidade, minha história não foi uma exceção. Os outros Garotos Perdidos e eu não nos sentávamos em uma roda e conversávamos sobre como nossos pais biológicos não faziam parte de nossas vidas. Isso não fazia parte da nossa cultura. Não ficaríamos incomodados por causa de uns desconhecidos que não queriam problemas estando por perto. Nós éramos mais duros que isso. Não adianta chorar sobre os cacos na calçada.

“Quem é o seu Rocky”? Perguntei a um irmão cristão negro depois que o filme terminou. Ele se demorou um pouco pensando, mas não me deu uma resposta. Com dois filhos, ele não conseguia pensar em uma figura paterna que o guiasse espiritual, emocional e paternalmente. Eu só pude dizer para ele que se tornasse no Rocky que ele nunca teve.

Os homens precisam de um homem no seu corner. Quer sejam biológicos ou não, eles precisam de homens mais velhos, mais sábios e mais experientes para se tornarem o tipo de guerreiro que Deus os chama a ser. E por mais que a falta de um pai biológico seja uma epidemia na comunidade negra, pergunto-me se a igreja pode se orgulhar de muito mais saúde em relação aos nossos rapazes. Estamos treinando os filhos entre nós para se tornarem maridos fortes, fiéis e piedosos, pais, soldados?

Onde estão os Paulos?

Onde estão os Paulos que passaram algum tempo orientando os Lucas, os Timóteos, os Titos? Onde os órfãos podem encontrar o pai que nunca tiveram? Quantos homens podem chamar um homem mais jovem de “verdadeiro filho na fé”? (1Tm 1.2; Tt 1.4). As ruas e o mundo estão se alinhando para recrutar nossos homens para outros exércitos. Onde estão nossos generais, comandantes e capitães maduros que Deus preparou para treinar outros para nossa guerra? Muitos de nós estamos contra as cordas, machucados, sangrando, cambaleando, tentando sobreviver neste Round. Nós precisamos de vocês.

Deus certamente é o “Pai dos órfãos” (Sl 68.5), mas ele cuida de seus filhos através de santos atuais e maduros nas igrejas locais. Deus promete dar a todos os filhos adotivos muitos pais quando se tornarem membros do corpo de Cristo (Mc 10.29–30). O apóstolo deu exemplo disso. O credo de Paulo foi escrito na vida de seus filhos. Os jovens de nossas igrejas são nossa coroa diante de Deus (1Ts 2.19). Eles precisam de nós.

Se você não tem um pai espiritual, ore por um. Peça aos homens que se encontrem com você. Peça que eles o orientem na palavra. Peça para passar um tempo com a família deles. Pergunte como administrar um talão de cheques, trocar um pneu, amar sua esposa como Cristo amou a igreja. Se você não tem um filho espiritual, não é tarde demais. Mesmo agora você pode mudar a vida de um jovem e a vida de muitos outros através dele. Confie o que você sabe aos homens fiéis que também ensinarão outros (2Tm 2.2). Encontre um Adonis e seja seu pai.

Homens de verdade

O chamado de Deus para masculinidade

Neste livro, Richard D. Phillips corta a cortina de fumaça da confusão cultural e destaca o mandato de Deus para os homens. Começando no Jardim do Éden, o autor traz ensinos fundamentais que abrangem todas as áreas da vida e incentiva os homens a trilharem uma jornada de arrependimento e renovação em direção à masculinidade bíblica.

Confira

 

 

Por: Greg Morse. © Desiring God Foundation. Website: desiringGod.org. Traduzido com permissão. Fonte: No Man in Their Corner.

Original: Nenhum homem no seu corner. © Ministério Fiel. Website: MinisterioFiel.com.br. Todos os direitos reservados. Tradução: Paulo Reiss Junior. Revisão: Filipe Castelo Branco.