Um blog do Ministério Fiel
Ele foi feito para outro mundo (C.S. Lewis)
De acordo com Peter Kreeft, “Clive Staples Lewis não era homem: ele era um mundo” (C.S. Lewis: A Critical Essay, 4).
Esse é o tipo de elogio que você lê repetidamente em livros sobre C.S. Lewis. O que significa que deve ter havido algo extraordinário sobre o homem. De fato, houve.
Falando pessoalmente, desde que comecei a levar Lewis a sério nos meus vinte e poucos anos – junto com seu colega reformado, Jonathan Edwards – nunca mais fui o mesmo. Não me considero um imitador de Lewis. Em sua capacidade de ver, pensar e sentir, ele era quase sem igual. Suas capacidades de ver e sentir o frescor e a admiração das coisas eram infantis, e suas capacidades de descrevê-las, compreendê-las e defendê-las eram massivamente viris.
Então não posso imitar Lewis, mas posso ouvi-lo. E eu o escuto há décadas, e o que ouvi ecoa quase em toda parte na minha vida e trabalho. Sua influência é simplesmente enorme.
A voz da fé da Inglaterra
Lewis nasceu em 29 de novembro de 1898, em Belfast, Irlanda. Sua mãe morreu quando ele tinha nove anos e seu pai nunca se casou novamente. Entre a morte de sua mãe em agosto de 1908 e o outono de 1914, Lewis frequentou quatro internatos diferentes. E então, por dois anos e meio, ele estudou com William Kirkpatrick, a quem chamou de “the Great Knock”. Ali seu ateísmo emergente foi confirmado e seus poderes de raciocínio foram refinados de maneira extraordinária. Mais tarde, ele se descreveu como um racionalista de dezessete anos.
Mas, justamente quando seu racionalismo estava no auge, ele tropeçou no romance de fantasia de George MacDonald, Phantastes. “Naquela noite”, ele disse, “minha imaginação foi, em certo sentido, batizada” (Surprised by Joy, 222). Algo havia se rompido – e ele chamou a isso de uma “nova qualidade”, uma “sombra brilhante” (Surprised by Joy, 220). O impulso romântico de sua infância estava novamente desperto. Só que agora parecia real e santo (embora ele ainda não o tivesse chamado assim).
Aos dezoito anos, ele assumiu seu lugar na Universidade de Oxford, mas antes que pudesse começar seus estudos, entrou no exército e, em fevereiro de 1918, foi ferido na França e voltou à Inglaterra para se recuperar. Ele retomou seus estudos em Oxford em janeiro de 1919 e, nos seis anos seguintes, recebeu três honras de primeira classe em clássicos, ciências humanas e literatura inglesa. Ele se tornou professor em outubro de 1925, aos vinte e seis anos.
Seis anos depois, em 1931, ele professou sua fé em Jesus Cristo e se firmou na convicção de que o cristianismo é verdadeiro. Dentro de dez anos, ele se tornaria a “voz da fé” para a nação da Inglaterra, durante a Segunda Guerra Mundial, e suas palestras transmitidas em 1941-1942 “alcançaram o status de clássico” (C.S. Lewis – A Life, 210).
Em pleno florescer
Ele estava agora em pleno florescer de sua produtividade criativa e apologética. No seu auge, ele provavelmente tenha sido a principal autoridade do mundo na literatura inglesa medieval e, de acordo com um de seus adversários, “o homem mais lido de sua geração” (C.S. Lewis – A Life, 166). Mas ele era muito mais. Livros de vários tipos estavam sendo lançados: The Pilgrim’s Regress, The Allegory of Love, The Screwtape Letters, e Perelandra. Então, em 1950, ele começou o The Chronicles of Narnia. Todos esses títulos eram de gêneros diferentes e mostraram a incrível versatilidade de Lewis como escritor, pensador e visionário imaginativo.
Ele apareceu na capa da Time Magazine em 1947. E então, depois de trinta anos em Oxford, assumiu o cargo de professor de inglês medieval e renascentista, na Universidade de Cambridge, em 1955. No ano seguinte, aos cinquenta e sete anos, casou-se com Joy Davidman. E pouco antes do quarto aniversário, ela morreu de câncer. Três anos e meio depois – duas semanas antes de completar sessenta e cinco anos. Em 22 de novembro de 1963 – Lewis a seguiu na morte.
Lewis, como autor, é mais popular hoje do que em qualquer momento de sua vida. Somente “As Crônicas de Nárnia” vendeu mais de cem milhões de cópias em quarenta idiomas. Uma das razões para esse fenômeno, argumentarei, é que Lewis é um “racionalista romântico” em um nível excepcionalmente alto e saudável. O romantismo de Lewis e seu racionalismo foram os caminhos pelos quais ele veio a Cristo, e eles foram os caminhos pelos quais ele viveu sua vida e fez seu trabalho.
Lewis, o Romântico
A essência do romantismo de Lewis é sua experiência de vida no mundo que despertava repetidamente nele a sensação de que deveria haver mais do que somente esse mundo criado – algo diferente, algo além do mundo natural. Esse sentimento era ao mesmo tempo inconsolável e agradável, uma fome “melhor que qualquer outra satisfação” e uma pobreza “melhor que todas as outras riquezas” (Pilgrim’s Regress, 7). A princípio, ele pensava que o anseio e a saudade ardentes eram pelo que ele procurava. Mas sua conversão ao teísmo e depois a Cristo clareou a atmosfera e mostrou a ele pelo que havia sido, na realidade, todo esse desejo.
Notícias de um país distante
Depois que Deus venceu o ateísmo de Lewis, na primavera de 1929, Lewis olhou para trás, para todas as suas experiências românticas dos anseios e soube por que o desejo era inconsolável e agradável. Era um desejo de Deus. Era evidência de que ele foi feito para Deus.
“Os livros ou a música onde pensamos estar colocada a beleza, nos trairão se confiarmos neles; ela não está neles, apenas vem através deles, e o que veio através deles foi anseio. Essas coisas – a beleza, a memória de nosso próprio passado – são boas imagens do que realmente desejamos; mas se são confundidas com a coisa em si, tornam-se ídolos idiotas, partindo o coração de seus adoradores. Pois elas não são a coisa em si; são apenas o perfume de uma flor que ainda não encontramos, o eco da música que não ouvimos, notícias de um país que nunca visitamos”. (O peso da glória, 32)
Assim, Lewis parou de transformar alegria em um ídolo quando descobriu, pela graça, que ela “apontava para algo diferente e exterior”, a saber, para Deus (Surprised by Joy, 291).
Feito para outro mundo
Lewis diz: “Em certo sentido, a história central da minha vida não é a respeito de mais nada” (Surprised by Joy, 19). Quando você lê suas repetidas descrições dessa experiência de romantismo ou alegria no Surprised by Joy and Pilgrim’s Regress and The Problem of Pain and The Weight of Glory, você percebe que Lewis não vê isso como uma peculiaridade de sua personalidade, mas como uma característica de sua humanidade. Todos nós somos românticos nesse sentido.
Por exemplo, em The Problem of Pain, Lewis afirma que mesmo as pessoas que pensam que nunca desejaram o céu não enxergam as coisas claramente.
“Há momentos em que acho que não desejamos o céu, mas mais frequentemente me pergunto se, em nosso coração, já desejamos mais alguma coisa. . . vislumbres tentadores, promessas nunca cumpridas, ecos que desapareceram no momento que chegam aos seus ouvidos. Mas se . . . alguma vez houve um eco que não se extinguiu, mas cresceu no próprio som – você saberia. Além de toda possibilidade de dúvida, você diria: “aqui está finalmente para que eu fui criado”. (152)
Assim, Lewis viu, em sua própria experiência de romantismo, a experiência universalmente humana. Somos todos românticos. Todos nós experimentamos de tempos em tempos um desejo que este mundo não pode saciar, uma sensação de que deve haver mais. Ele declararia isso de maneira mais famosa no Mere Christianity: “Se encontro em mim um desejo que nenhuma experiência neste mundo pode satisfazer, a explicação mais provável é que fui feito para outro mundo” (181).
Lewis, o racionalista
Passamos agora ao racionalismo de Lewis. Como no termo “romantismo”, quero dizer algo diferente de alguns de seus usos filosóficos comuns. Tudo o que quero dizer, sobre seu racionalismo, é de sua profunda devoção a ser racional – ao princípio de que existe verdadeira racionalidade e que ela está enraizada na razão absoluta, a razão de Deus.
Sem contradições
A maneira mais simples de chegar ao cerne da racionalidade de Lewis é dizer que ele acreditava na lei da não contradição, e ele acreditava que onde essa lei fosse abandonada, não apenas a verdade estaria em perigo, mas o romantismo e a alegria também. A lei da não contradição está simplesmente em que afirmações contraditórias não podem ser verdadeiras ao mesmo tempo e da mesma maneira.
Esse compromisso com as leis básicas da lógica, ou racionalidade, levou Lewis, em seu caminho filosófico, ao mesmo Cristo que ele havia encontrado no caminho em busca do romantismo ou da alegria. No caminho romântico, Lewis foi levado repetidamente a olhar além da natureza para a realidade última – finalmente para Deus em Cristo – porque seus desejos não podiam ser explicados como um produto deste mundo. Agora, como essa mesma coisa aconteceu com o uso de sua razão?
Ele olhou para a cosmologia filosófica e científica emergente no mundo moderno e a considerou autocontraditória.
“Se eu absorvo integralmente a cosmologia científica (que exclui um Deus racional e pessoal), não só não posso me encaixar no cristianismo, como também não posso me encaixar na ciência. Se as mentes são totalmente dependentes dos cérebros, e os cérebros da bioquímica e a bioquímica (a longo prazo) do fluxo sem sentido dos átomos, não consigo entender como o pensamento dessas mentes deveria ter mais significado do que o som do vento nas árvores. E este é para mim o teste final”. (Is Theology Poetry? 21).
Em outras palavras, as pessoas modernas constroem uma visão de mundo que trata seus pensamentos como equivalentes ao vento nas árvores. E então eles chamam esses pensamentos de verdade. Lewis disse que isso é uma contradição. O homem ateu usa sua mente para criar uma visão de mundo que anula o uso de sua mente.
Um lunático qualquer ou Deus
Foi isso que Lewis quis dizer com o título de seu livro The Abolition of Man. Se não existe Deus como fundamento da lógica (como a lei da não contradição) e fundamento de julgamentos de valor (como justiça e beleza), o homem é abolido. Sua mente não passa de farfalhar de folhas, e seu julgamento de valor não passa de ondas em um lago.
Eis como ele descreve o modo como esses pensamentos o levaram pelo caminho da razão para ver o cristianismo como verdadeiro:
“Por esses motivos e alguns outros semelhantes, alguém pode ser levado a pensar que, seja o que for que seja verdade, a cosmologia científica popular, de qualquer forma, certamente não é. … Algo como idealismo filosófico ou teísmo deve, na pior das hipóteses, ser menos falso do que isso. E o idealismo se mostra, quando você o leva a sério, ser um teísmo disfarçado. E uma vez que você aceite o teísmo, não pode ignorar as reivindicações de Cristo. E quando você as examina, percebe que você não pode adotar uma posição intermediária. Ou ele era um lunático ou Deus. E ele não era um lunático”. (Is Theology Poetry? 21)
Anseio e Lógica
Portanto, Lewis veio a Cristo como seu Senhor e Deus ao longo do caminho do romantismo, ou desejo inconsolável, por um lado, e o caminho do racionalismo, ou lógica, por outro lado.
Lewis veio a Cristo pela convergência dos caminhos do romantismo e do racionalismo. E como cristão, ele se tornou um mestre pensador e um mestre do esforço poético na história e no ensaio. Isso é quem ele era, e o que ele conhecia, e esse era o objetivo de sua vida. Ele dedicou cada esforço romântico e cada esforço racional para ajudar as pessoas a ver para onde todos os seus anseios e lógica as levariam: para a glória de Jesus Cristo – a meta de todos os seus anseios e o fundamento de toda a sua lógica.