Definindo o chamado de Deus

As Escrituras descrevem o chamado de Deus em nossas vidas de várias maneiras, que vão do amplo ao preciso. Então, por onde começamos se queremos formar um entendimento bíblico das diferentes formas pelas quais a Bíblia fala sobre o chamado de Deus? Muitas vezes começamos no lugar errado, pensando em nosso contexto específico, nossas vidas, nossa situação. Em vez disso, devemos começar com Deus e seu chamado. Estamos falando do Deus Todo-Poderoso do universo, cujo decreto soberano é executado na criação e em seu cuidado providencial contínuo para com todas as suas criaturas e todas as suas ações. Ele, em sua soberania, nos redimiu. Esse Deus, nosso Deus, estabeleceu chamados, para nossas vidas, que definem quem somos e o que ele espera de nós, aquilo que nos ordena e ao que nos chama a fazer neste mundo que ele criou, neste mundo no qual somos somos seus servos. Podemos resumir as formas pelas quais a Bíblia usa estes temas – a onipotência de Deus, sua reivindicação sobre nossas vidas, sua intenção para nós e para o mundo e o evangelho de Jesus – de acordo com duas categorias de chamados: criação e redenção. Cada uma dessas palavras – criação e redenção – nos dá uma janela através da qual podemos ver os diferentes chamados de Deus.

Olhando primeiro para a criação, podemos considerar o chamado da vocação. Deus nos chama como seres humanos, criados à sua imagem, para um trabalho diligente no mundo que ele criou. Deus não fez com que Adão ou qualquer um de seus filhos fosse preguiçoso. Eles não viveriam eternamente no sótão de Deus, sem fazer nada além de desbloquear novos níveis no mais novo jogo de videogame. Deus também não deixou Adão livre em relação a como ele se envolveria com a criação ou o que ele faria dela. Deus chamou Adão – ordenou – para ele exercer domínio sobre a criação, mesmo quando trabalhava e cuidava do jardim do Éden (Gn 1.28; 2.15). Após a queda, esse trabalho se tornou muito mais difícil, em meio aos espinhos, mas o chamado não mudou. Pelo suor de seu rosto, Adão continuaria a exercer domínio sobre a criação, trabalhando e mantendo o mundo no qual Deus o havia colocado (3. 17-19). E esse trabalho seria feito para a glória de Deus. Nesse chamado, todos os seres humanos, todos os filhos e filhas de Adão, encontram o chamado de Deus para uma vocação. E por vocação, não quero dizer necessariamente uma profissão assalariada. O contador qualificado, o escavador de valas, o soldado, a dona de casa, o aposentado e o estudante da escola primária, estão todos seguindo o chamado de Deus em suas vidas através do trabalho que honra a Deus.

Em seguida, tendo em mente nosso foco nos chamados enraizados na criação, consideremos o chamado do casamento. Deus não pretendia que os humanos executassem seu chamado ao trabalho diligente sozinhos. Deus olhou para Adão como um indivíduo e declarou definitivamente que sua situação não era boa (Gn 2.18). Então, ele criou Eva, uma auxiliadora adequada para Adão, e os chamou para a aliança do casamento, um pacto no qual um homem e uma mulher se comprometem um com o outro por toda a vida. Eva foi a auxiliadora de Adão nas tarefas de multiplicar e exercer domínio. Da mesma forma, a menos que um cristão tenha um chamado específico ao celibato (1Co 7.8-9), ele ou ela é chamado a encontrar um cônjuge e, se Deus assim o abençoar, a gerar filhos. Esse chamado cria vários chamados derivados e específicos para cada gênero – marido, esposa, pai, mãe, filho, filha, irmão, irmã – cada um com papéis e responsabilidades a serem cumpridos somente para a honra e glória de Deus.

Terceiro, na criação, Deus escreveu sua lei no coração de todas as pessoas (Rm 2.15), dando-lhes um chamado à santidade (Lv 20.26). Essa lei encontra uma codificação mais específica nos Dez Mandamentos e, finalmente, plena demonstração na pessoa de Jesus Cristo. Essa lei exige a perfeição que nenhum pecador pode encontrar, mas nossa incapacidade, por causa da queda em obedecer à lei, não anula o chamado da lei para que sejamos perfeitos como Deus é perfeito, faça isso e viva (Gl 3.10). Assim, embora arruinado pelo pecado, todo ser humano conhece o chamado de Deus à santidade, à perfeição moral e a se sentir culpado por seu pecado.

Quarto, quando as famílias se multiplicaram em nações e depois que Deus dispersou as nações em resposta à torre de Babel, o governo e o comércio se desenvolveram dentro das culturas produzindo estruturas de responsabilidade e autoridade. Tudo isso, especialmente a escolha de quem detém autoridade em qualquer cultura ou grupo, é ordenado pela vontade expressa de Deus (Rm 13.1-4). Como Deus ordena as autoridades da sociedade, todas construídas em torno de famílias, ele chama todos a obedecer às autoridades que ele mesmo coloca no comando. O chamado para obedecer à autoridade é onipresente, desde a liderança do marido em casa até o governo do presidente sobre um país, desde o funcionário de uma empresa até a criança em seu lar. O único momento em que a desobediência à autoridade é justificada e garantida é quando uma autoridade pede para que alguém cometa pecado. O chamado de Deus para obedecer à autoridade também responsabiliza essas autoridades a seguir a justiça de Deus no mundo enquanto exercem poder. Dessa maneira, o chamado de Deus, para obedecer à autoridade, fornece estrutura e responsabilidade para além dos limites da família individual, protegendo contra o caos e a injustiça da anarquia.

Um simples estudo dos textos sobre o tema do chamado, na Bíblia, revelaria vários outros chamados de Deus para todas as pessoas, mas o que consideramos até agora resume como os chamados básicos de Deus são onipresentes e aplicáveis a qualquer pessoa, a qualquer momento. E a experiência da humanidade é que cada uma dessas áreas de vocação, longe de mostrar a capacidade da humanidade de cumpri-las, mostrou como esses chamados se tornaram áreas de pecado e depravação. Mas Deus, antes de Adão e Eva deixarem o jardim, já havia começado a falar da obra redentora que ele faria, um dia, através do Messias que esmagaria a cabeça da serpente (Gn 3.15). Esse Messias, por meio de sua vida, morte e ressurreição, pagaria pelos pecados de seu povo, proporcionaria a justiça que eles não poderiam alcançar e cumpriria todos os chamados de Deus ao seu povo. Esse Messias é Jesus Cristo, e nele encontramos novos chamados e chamados renovados de Deus.

Ao considerarmos os chamados da perspectiva da redenção, sabemos que Deus foi paciente com o pecado da humanidade ao longo dos tempos, mas agora chama todos a se arrependerem e crerem em Cristo (At 17.30). Esse é o chamado externo do evangelho que os cristãos carregam no mundo. Pastores pregando de púlpitos e cristãos evangelizando seus vizinhos, estendem a todos a oferta gratuita do evangelho: Arrependa-se e creia em Jesus Cristo, e você será salvo. Esse é, hoje, o único grande chamado redentor colocado diante de todo homem, mulher e criança. Esse chamado impulsiona a igreja do Novo Testamento, alimenta missões mundiais e é imposta a todo cristão.

Assim como esse chamado externo soa, também existe, quando uma pessoa nasce de novo, um chamado interno que a acompanha. A salvação é do Senhor; é o seu trabalho monergístico. Ele conhece os seus e os chama pelo nome (Jo 10.27). Quando um pecador é redimido, o Espírito Santo o regenera para que ele possa receber e descansar em Cristo Jesus, conforme ele é oferecido no evangelho. Dessa maneira, o chamado interno do evangelho é sempre eficaz, porque é sempre e somente realizado por Deus. O chamado externo e interno de Deus marca a era do Novo Testamento. Esses dois chamados traçam e explicam a explosão da igreja de um bando de galileus a um corpo mundial de pecadores redimidos de todas as tribos, línguas e nações.

O chamado eficaz de Deus através de Jesus, que nos converte, também inicia o trabalho de nos conformar à sua imagem (Rm 8.29). Isso não significa que todos estamos nos tornando mais parecidos com carpinteiros nazarenos que se tornaram pregadores. Isso significa que a obra de santificação de Deus em nós opera dentro dos trilhos dos chamados da criação que já estão operacionais em nossas vidas. Sob o poder do Espírito Santo, agora lutamos contra o pecado e buscamos a santidade. Recebemos nosso chamado à vocação e trabalhamos como para o Senhor com toda a nossa força. O marido abraça seu chamado ao casamento e ama sua esposa como Cristo amou a igreja. A esposa abraça seu chamado ao casamento e se submete ao marido, como a igreja se submete a Cristo. A criança piedosa obedece a seus pais como ao Senhor. O cristão abraça seu chamado à santidade, buscando a santidade em grata resposta à graça de Deus. O cristão com autoridade não exerce sua autoridade arbitrariamente sobre os outros. O cristão sob autoridade submete-se com alegria e obedece à autoridade, sabendo que Deus está por trás de tudo. Dessa forma, os principais chamados de Deus em nossas vidas – o chamado à vocação, o chamado ao casamento, o chamado à moralidade, o chamado à submissão à autoridade, o chamado externo do evangelho e o eficaz chamado interno do evangelho – funcionam juntos desde a criação e através da redenção para cumprir o propósito de Deus no mundo, sua própria glória através da adoração de Jesus Cristo na igreja.

Por: Joe Holland. © Ligonier Ministries. Website: ligonier.org. Traduzido com permissão. Fonte: Defining the Call of God.

Original: Definindo o chamado de Deus. © Ministério Fiel. Website: MinisterioFiel.com.br. Todos os direitos reservados. Tradução: Paulo Reiss Junior. Revisão: Filipe Castelo Branco.