Por que o evangelismo é mais fácil que o discipulado

Se você perguntasse ao cristão comum com o que seria sua maior luta, eu apostaria que o evangelismo seria uma das principais respostas. As pessoas acham difícil falar sobre sua fé. Eles lutam para que os não-cristãos entendam o que realmente significa acreditar em Jesus, confiar na Bíblia e entender a verdade do evangelho.

Eu posso me identificar com isso. Todos nós já tivemos nossos momentos embaraçosos. Lembro-me de uma ocasião em que um companheiro de equipe de Rugby me perguntou por que eu não estava bêbado como o restante dos rapazes. Eu não era cristão há muito tempo, e me senti um pouco idiota quando timidamente murmurei algo sobre “estar indo mais à igreja”.

Agora, vinte e dois anos depois – doze deles, como ministro presbiteriano ordenado, em um bairro da classe trabalhadora – minha experiência de evangelismo tem sido muito diferente do que era naqueles dias. Eu literalmente falei sobre Jesus milhares de vezes, tanto no púlpito quanto na calçada. E cheguei a uma conclusão: evangelizar é mais fácil do que discipular. O que quero dizer com isso?

A Essência do Evangelismo

Para começar, as comunidades da classe trabalhadora são lugares muito fáceis para conversar sobre julgamento. A vida é dura, as pessoas sofrem todo tipo de injustiça e a pobreza é generalizada. Quando traficantes ou gangues exploram indivíduos ou casas, as consequências são óbvias. Já tive pessoas conhecidas dizendo algo assim para mim: “Eu sei que mereço o inferno. Eu sei que se eu morresse hoje à noite, eu iria direto lá para baixo”.

Da mesma forma, os alcoólatras escravizados me fazem perguntas como: “Eu poderia ser perdoado? Eu poderia ir à igreja? Eu poderia aprender a ser cristão?”. De vez em quando, um viciado ou alcoólatra aparece na igreja no domingo. Eles estão desesperados por esperança e estão abertos a falar sobre Jesus. Infelizmente, também fiz muitos funerais de jovens (muito comuns em bairros carentes de moradias sociais). Podem ser mortes por drogas, suicídios ou várias outras coisas. Mas todos eles oferecem oportunidades para uma declaração clara e ousada do evangelho. Muitas vezes, a igreja está cheia.

Portanto, o evangelismo – o ato de proclamar as boas novas do evangelho – é relativamente fácil no meu contexto. Mas discipulado? Levar as pessoas a realmente se comprometerem com Jesus e segui-lo no contexto da igreja local? Isso é muito, muito mais difícil.

A Dificuldade do Discipulado

Nas áreas de classe média, as pessoas podem levar toda a sua família à igreja por anos sem nunca falarem sobre fé em Cristo fora desse contexto. Na minha comunidade, é o contrário. Alguém pode entrar na igreja por uma semana ou duas. Eles podem até vir para o culto de Natal. Mas compromisso durante todo o ano para adorar? Sem chance.

Por que é assim? Existem razões espirituais óbvias. Em Marcos 4.16, Jesus fala de pessoas que recebem a Palavra com alegria. Mas como não têm raízes, não conseguem perseverar. Esse é um verso muito instrutivo. No mínimo, esse texto mostra-nos que Cristo sabia que precisava preparar seus discípulos, e nós, para a frustração de semear e não conseguir colher.

No entanto, a passagem também indica uma resposta para o problema. Marcos 4.20 destaca a importância da semeadura em “boa terra”. O que é uma boa terra? É um coração disposto para a Palavra. Mas para cultivar esse coração, não podemos subestimar a importância de uma igreja saudável que tenha uma cultura realista de discipulado.

Mudança Radical

Eu lutei com isso. Estou em uma igreja que foi fundada por pessoas fiéis quase meio século atrás (1974). Esses irmãos e irmãs tinham um conjunto totalmente diferente de expectativas cristãs. Conhecer e seguir Jesus era baseado na suposição de que todos iam à igreja. Domingo após domingo, famílias inteiras iam à igreja juntas. Naquela época, a igreja era o centro da comunidade. De fato, junto com um emprego estável, era também a marca da respeitabilidade. Se você era uma pessoa boa e honrada da classe trabalhadora, vestia-se da melhor forma que podia e ia à igreja aos domingos.

Mas para nós, no Ocidente, a vida mudou radicalmente nos últimos cinquenta anos – especialmente em culturas “cristãs” outrora fortes, como a Irlanda do Norte e os EUA. No meu próprio contexto, algumas das maiores questões que impedem o compromisso de longo prazo em seguir Jesus, em comunidade na igreja, são coisas como vícios, desmembramento da família, problemas de saúde mental, falta de modelos masculinos e padrões de trabalho por turnos. Mamãe, papai e os dois filhos simplesmente não entram mais pela porta da igreja nas manhãs de domingo, como faziam antes.

Questões complexas

Deixe-me lhe dar um exemplo. Billy (esse não é seu nome verdadeiro) cresceu em nossa comunidade. Ele se professava ateu. Não tinha nenhuma conexão com a igreja. Ele era um garoto brilhante. Tinha um amplo círculo social e era visto como a “vida e alma” das festas. Mas, como muitos rapazes em nossas comunidades, ele se empolgou com as drogas. Então ele se tornou pai ainda muito jovem depois de um caso com a namorada de seu companheiro. O trabalho tornou-se intermitente, para dizer o mínimo. O dinheiro era apertado.

Desesperado, Billy virou-se para um banco de doação de alimentos de uma igreja local. Ele conheceu cristãos que o alimentaram, oraram por ele e se interessaram por sua vida. Disseram-lhe para ir à minha igreja, sua igreja local. Foi o que ele fez e se interessou pelo evangelho. Ele começou a ler a Bíblia, frequenta a igreja regularmente, evitava as drogas e mostrava sinais encorajadores de mudança em sua vida. Ele até experimentou respostas muito tangíveis à oração, como proteção contra quadrilhas de traficantes e cobradores de dívidas.

Mas então surgiram tensões com sua ex-namorada. Ele caiu – rapidamente – de volta aos velhos hábitos. A vida de Billy foi de mal a pior. Quais foram os problemas? Infelizmente, muitos dos mais comuns: problemas de saúde mental, família desestruturada, falta de exemplos e a dificuldade de tentar trabalhar tendo um passado criminoso.

Certamente, como cristãos que creem na Bíblia, sabemos que os problemas não são meramente externos. A raiz do problema de todo homem é seu próprio pecado. Por natureza, somos todos rebeldes contra Deus. À parte da salvação de Deus em Cristo, continuamos mortos em nossas transgressões e pecados (Ef 2. 1-3). Adicione a isso a gama de fatores complicadores em nosso contexto cultural, e a dificuldade do discipulado, entre as classes trabalhadoras, aumenta ainda mais.

Não Desista

Qualquer pessoa envolvida no ministério em comunidades carentes  da classe trabalhadora ressoará com a experiência de Billy. Alguns podem ficar tentados a sugerir que, no caso de Billy, a semente caiu em “terreno espinhoso”. Algumas delas realmente falam isso. No entanto, o fato é que pessoas genuinamente convertidas podem escorregar e cair com muita facilidade, especialmente com problemas relacionados às drogas. Em suma, não devemos desistir das pessoas com muita facilidade. O crescimento será diferente para pessoas diferentes. A maturidade cristã não é “tamanho único”.

Existem muitos outros homens e mulheres que passaram por jornadas semelhantes. Mas não quero terminar com uma nota negativa. Também vi casos encorajadores. Normalmente, isso envolve oração implacável, pregação fiel, uma família calorosa e acolhedora da igreja, comida, compartilhar a vida durante a semana e uma prestação de contas rigorosa.

A parceria com outros grupos cristãos também é fundamental. Sou grato pelo treinamento “Igreja em Lugares Difíceis” no 20schemes e Acts 29. Para mim, é bom saber que não estou sozinho. Tenho os recursos e o apoio para orientar e compartilhar, com homens como Billy, em prol de seu crescimento e da glória de Deus.


P.S. Recebi uma mensagem de Billy recentemente. Ele foi aconselhado por um Centro de retiro cristão para problemas de dependência. Ele foi intensamente ajudado e diz que mal pode esperar para voltar a estudar a Bíblia comigo quando estiver em casa. Às vezes, a semeadura leva a uma boa colheita.

Por: Marty McNeely. © 20schemes. Website: 20schemes.com. Traduzido com permissão. Fonte: Why Evangelism is Easier than Discipleship.

Original: Por que o evangelismo é mais fácil que o discipulado. © Ministério Fiel. Website: MinisterioFiel.com.br. Todos os direitos reservados. Tradução: Paulo Reiss Junior. Revisão: Filipe Castelo Branco.