Então, voltar às reuniões presenciais?

Há pouco mais de dois meses, quando o coronavírus chegou ao Brasil, vivemos um momento de tensão quando precisamos decidir pela manutenção ou suspensão de nossas reuniões presenciais. Se meu senso perceptivo estiver sobrevivendo à quarentena, a maioria das igrejas optou pela suspensão e de lá para cá tem se esforçado para nutrir a fé, a comunhão e a esperança através das plataformas virtuais.

Durante esse tempo discutimos se deveríamos chamar reunião à distância de culto, se deveríamos ministrar os sacramentos nessas reuniões, se o Bolsonaro ou o Moro (ops, deixa isso pra lá…); e estamos chegando em outro momento chave. Correta ou incorretamente, as medidas de isolamento social começam a ser flexibilizadas pelas autoridades civis e, aos poucos, começamos a discutir o retorno às reuniões presenciais.

Escrevo essas palavras, pensando naqueles que precisarão decidir ou conduzir discussões a respeito deste assunto nos próximos dias. Meu objetivo não é defender uma decisão particular; até porque não me parece que homogeneizar decisões seja o mais sábio na conjuntura atual na qual vivemos. O que quero é pensar alto, sugerindo caminhos e pontos de atenção, visando ampliar as possibilidades de uma decisão sábia. Possivelmente, alguém ainda conseguirá ler esse texto como pró ou contra o governo. Fazer o que? No Brasil contemporâneo é a sina de quem diz qualquer coisa publicamente.

Eis algumas coisas que, eu acredito, devemos fazer agora para tomar uma decisão sábia:

1) Orar bastante! E se tivermos um grupo de pessoas que toma a decisão conosco (um conselho ou uma diretoria), acho que faremos bem em botar todo mundo de joelho no chão. Essa decisão será, inevitavelmente, uma decisão controversa e Satanás adora ocasiões assim para perturbar a paz e a unidade da igreja. Se não estivermos sob a direção de Deus, vamos acabar dando uma força para ele.

2) Recuperar as razões pelas quais as reuniões foram suspensas. Isso poderá nos ajudar bastante, pois nós poderemos utilizar essas razões (a eventual permanência delas ou não) como critério para a tomada de decisão.

Aqui, devo dizer uma coisa: eu suspeito que, para muitas pessoas, as reuniões presenciais foram suspensas, simplesmente, em virtude da proibição de aglomeração por parte das autoridades civis. Isso favorece a seguinte lógica: suspendemos quando as autoridades mandaram, voltaremos quando elas permitirem. Veja, pode ser que muitas igrejas tenham suspendido as reuniões apenas por conta disso mesmo. Mas eu não creio que essa fosse a única e nem a razão mais nobre pela qual deveríamos ter feito e pela qual muitos fizeram isso. Para mim, a motivação maior da suspensão de nossas reuniões presenciais deveria ter sido, e em muitos casos foi, um ato de serviço à sociedade, baseado no esforço pela preservação da vida. Se a razão foi essa, então existem outras coisas, para além da “permissão das autoridades civis” (entre aspas para esclarecer a ciência da polêmica), que devemos levar em conta na hora de decidir sobre retornar.

3) Olhar para o entorno. É importante se lembrar que a igreja não existe à parte de um contexto social mais amplo. A implicação disso é que devemos procurar saber como estão as coisas em nossa região. Um bom caminho para isso é nos informar com pessoas que estão enfrentando o problema em posições estratégicas. É provável que em nossas próprias igrejas haja pessoas da administração pública ou da área de saúde que estão envolvidas com o combate à pandemia e que têm maior conhecimento de dados estatísticos e de informações que possam ser úteis na tomada de decisão. Não devemos ignorar a verdade bíblica de que é na multidão de conselheiros que está a verdadeira sabedoria. Devemos ampliar o número dos nossos conselheiros neste momento.

4) Olhar para dentro. Possivelmente, os próximos dias serão dias de debate nas redes sociais e de muitos movimentos nesta questão do retorno às atividades presenciais da igreja. Veremos igrejas retornando e outras que optarão por permanecer mais algum tempo como estão, e um risco que correremos é o de fazer com que esse movimento externo seja determinante em nossa tomada de decisão. Obviamente, considerar o que outros estão fazendo é importante (isso tem a ver com o ponto anterior), mas é preciso cuidar para não agir por impulso. Precisamos refletir levando em conta as condições de nossa igreja local, considerando a localização dela, qual é o nosso público, as condições de nosso espaço físico, o atual estado emocional dos nossos membros, a eficácia das nossas iniciativas de pastoreio durante os últimos dias, etc. Nenhuma comunidade é igual, e cada uma precisa ser considerada em suas especificidades.

5) Em caso de retorno, estabelecer um protocolo rigoroso. A ética cristã sempre foi pautada pela permanente disposição de ir além do que é necessário e exigido. O que isso significa em caso de retorno? Recomendaram uma máscara? Vista duas! Sugeriram um distanciamento de dois metros entre pessoas? Use 3, ainda que seja necessário fazer um ou dois cultos mais! A analogia com o texto bíblico à parte, você pegou a ideia: a partir do momento em que começarmos a nos reunir novamente — o que não vejo a hora de acontecer, e espero que seja rápido — receberemos uma responsabilidade que, coletivamente, ainda não temos agora, e precisaremos assumi-la de modo adequado.

Oro para que o Senhor nos encha de coragem, prudência e sabedoria, e nos ajude a tomar decisões sábias que colaborem para preservar a pureza e a paz daquela a quem Ele mesmo comprou com o seu próprio sangue. E que continuemos contribuindo com o bem estar da sociedade como sempre fizemos ao longo de nossa história.