Ele morreu cedo no sorriso de Deus

Robert Murray McCheyne (1813–1843)

Robert Murray McCheyne foi um pastor local em Dundee, na Escócia, que morreu em 1843, aos 29 anos. Nenhum evento extraordinário em sua vida o faz ser lembrado. Mas ele tinha um amigo muito precioso, Andrew Bonar, um pastor próximo. E em um período de dois anos, Andrew publicou Memoir and Remains of Robert Murray McCheyne. Ele ainda é publicado atualmente, e aqui estamos nós, 176 anos após a morte de McCheyne, sendo motivados e inspirados por sua vida.

O que foi, na curta, e de certa forma comum, vida de McCheyne, que lhe deu a força que inspirou o livro (e agora livros) que preserva seu legado para nossos dias?

A Rosa e o Espinho

Penso que houve uma chave dupla para a força da vida de McCheyne: a preciosidade de Jesus e a dor de um espinho.

Na descrição de McCheyne sobre sua adolescência, ele disse: “Eu beijei a Rosa, nem pensei sobre o espinho” – ou seja, “entreguei-me a todos os prazeres divertidos e atraentes do mundo, e não pensei na doença, no sofrimento e morte.” Mas, após sua conversão, ele falou muitas vezes de Jesus como sua Rosa de Sarom e viveu com uma consciência quase constante do espinho de sua doença e de que seu tempo poderia ser curto. Ele disse em um de seus sermões:

“Não coloque seu coração nas flores deste mundo; pois todas elas têm alguma corrupção. Aprecie a Rosa de Sarom. . . mais que tudo; pois ela não muda. Viva mais perto de Cristo do que dos santos, para que, quando eles forem tirados de você, você ainda possa tê-lo para apoiar-se.” (Sermões de Robert Murray McCheyne).

McCheyne viveu apenas a manhã de sua vida: ele morreu antes dos 30 anos. Sua eficácia, no entanto, não foi frustrada por esse fato, mas fortalecida por ele. Por causa de sua tuberculose, ele vivia com a forte sensação de que morreria cedo. Portanto, a chave dupla de sua vida foi a preciosidade de Jesus, a Rosa, intensificada pela dor do espinho, a doença e a escassez em sua vida.

Despertado pelo Espinho

McCheyne nasceu em Edimburgo, Escócia, em 21 de maio de 1813. Ele cresceu em uma atmosfera com altos padrões morais, mas era, por seu próprio testemunho, “desprovido de Deus”. Quando ele foi para a Universidade de Edimburgo, aos 14 anos, cursou estudos clássicos. Ele estava beijando a rosa do aprendizado clássico e ignorando o espinho do sofrimento e da morte.

Mas tudo isso mudou em 1831, quando ele tinha 18 anos. David, o irmão mais velho de Robert, não estava bem, nem espiritual nem fisicamente. No verão daquele ano, ele entrou em depressão profunda e morreu em 8 de julho. De repente, o espinho da rosa trespassou McCheyne no coração. Toda a beleza da rosa pela qual ele estava vivendo murchou. E pela graça de Deus, ele viu outra Rosa, como aconteceu com David.

Nos dias que antecederam sua morte, David encontrou uma paz profunda através do sangue de Jesus. Bonar disse que “a alegria do rosto de um Pai plenamente reconciliado iluminou o rosto [moribundo] de David.” (Memoir). McCheyne presenciou isso e tudo começou a mudar. Ele tinha visto uma rosa que não era a aprendizagem clássica. E ele viu isso de forma bonita, não apesar do espinho, mas por causa dele. O espinho o perfurou e o despertou.

Paixão pela Santidade e Evangelização

Quatro meses após a morte de seu irmão, McCheyne se matriculou no Divinity Hall of Edinburgh University, em novembro de 1831. Lá ele conheceu o homem que teria maior influência em sua vida e ministério, Thomas Chalmers.

Chalmers influenciou todo seu grande aprendizado a serviço da santidade e do evangelismo. Ele alertou McCheyne e os outros estudantes sobre o “diabo branco” e “o diabo negro” – o diabo negro levando aos “pecados carnais” do mundo, e o diabo branco aos “pecados espirituais” da justiça própria. E ele fez do Evangelho de Cristo crucificado pelos pecadores o poder central dessa santidade.

Chalmers também estava profundamente oprimido com a pobreza nas favelas de Edimburgo e com o pouco testemunho do Evangelho. Ele estabeleceu a Visiting Society e recrutou McCheyne e seus amigos para participar. Isso levou McCheyne a um mundo que ele nunca tinha visto como estudante universitário de classe média alta. Isso despertou nele um senso de urgência para os que estavam afastados do evangelho. Em 3 de março de 1834, envolvido, por dois anos e meio, em seus estudos sobre divindade, ele escreveu:

“Cenas que eu nunca sonhei presenciar. . .. “Ninguém cuida de nossas almas” está escrito sobre cada testa. Desperta minha alma! Por que eu deveria dedicar mais horas e dias ao mundo vaidoso, quando existe um mundo de miséria à porta? Senhor, põe tua própria força em mim; confirme toda boa resolução; perdoe minha longa vida passada de inutilidade e tolice.” (Memoir).

Então McCheyne tiraria, do seu tempo na escola de divindade, uma paixão pela santidade e pelo evangelismo. Isso nunca o deixaria e se tornaria em impulsos que definiram sua vida – tudo isso motivado pela beleza da Rosa e intensificado pelo espinho do sofrimento.

Vida útil, sem Intercorrências

O último dia das palestras sobre divindade de McCheyne foi em 29 de março de 1835. Ele tinha apenas 22 anos. E, naquele outono, ele foi chamado para ser ministro assistente na dupla paróquia de Larbert e Dunipace. Ele serviu ali como assistente até receber o chamado da Igreja de São Pedro em Dundee, em agosto de 1836. Lá McCheyne serviu como pastor até sua morte, seis anos e meio depois.

Esse é o resumo simples de sua vida profissional: um estudante até os 22 anos, pastor assistente por um ano e pastor sênior por seis anos. Então passei a considerar que, o que torna uma vida sem intercorrências tão útil, mesmo 176 anos após sua morte, não é um evento extraordinário em sua vida. Pelo contrário, é sua extraordinária paixão por Cristo – pela Rosa – pela santidade e pelas pessoas perdidas, tudo intensificado pela expectativa de uma vida curta – o espinho. E toda essa paixão preservada em linguagem poderosa e pitoresca. Ele ainda está nos influenciando por causa das palavras que saíram de sua boca, não dos eventos de sua vida.

Então, vamos ouvi-lo sobre a busca da santidade e sobre sua comunhão com Deus através da palavra e da oração.

Olhe Dez vezes para Cristo

Deus dera, a McCheyne, a chave do Evangelho para buscar a santidade pessoal. Ele a recebeu através do ensino de Chalmers. Chalmers estava muito preocupado com a introspecção excessiva na busca da santidade. Ele sabia que um crente não pode progredir na santidade sem basear-se na garantia da salvação, e, no entanto, o esforço de procurar em nossos corações pecaminosos algumas evidências da graça, geralmente sai pela culatra.

Chalmers disse que simples vislumbres na sala escura do coração não dão boas perspectivas. Em vez disso, ele disse que deveríamos:

“Buscar auxílio nas janelas. Abra as persianas e deixe o sol entrar. Portanto, se você deseja enxergar bem o interior, fique atento. . .. Esta é a maneira exata de acelerar as coisas. Abra amplamente os portais da fé e, com isso, toda luz será admitida nas câmaras da experiência. A verdadeira maneira de facilitar o autoexame é olhar para fora com fé.” (Introduction to The Christian’s Great Interest, 6).

McCheyne escreveu isso em uma aula e sublinhou a última frase. Portanto, não é surpreendente ouvi-lo dar seu próprio conselho em termos semelhantes: “Aprenda muito sobre o Senhor Jesus. Para cada olhar para si mesmo, olhe dez vezes para Cristo. Ele é totalmente adorável. . .. Viva muito nos sorrisos de Deus. Aproveite os seus raios de luz. Sinta o seu olhar que tudo vê fixo em você em amor. E repouse nos seus braços todo-poderosos” ( Memoir).

Essa era a sua estratégia básica na busca da santidade. Então, quando McCheyne falou o que, provavelmente, sejam as suas palavras mais famosas: “A maior necessidade do meu povo é a minha própria santidade”, ele quis dizer não apenas que eles precisavam de um pastor moralmente correto, mas também que precisam de um pastor que estivesse sempre caminhando em comunhão com Cristo e sendo transformado à semelhança de Cristo por essa comunhão constante. O que nos leva agora, finalmente, à maneira como ele cultivou essa comunhão constante com Cristo.

Deixe que a Primeira face seja a de Deus

McCheyne tem muito a dizer sobre as disciplinas de meditar na Palavra de Deus e orar. Suas disciplinas sistemáticas visavam fixar o hábito, em seu coração, de viver em constante comunhão com Cristo. Ele havia formado o hábito de acordar cedo para ler as Escrituras e orar, e tentou manter isso até o fim de sua vida. Ele amava se encontrar com Jesus de manhã. Ele escreveu: “Levantei-me cedo para buscar a Deus e encontrar aquele a quem minha alma ama. Quem não acordaria cedo para encontrar tal companhia? Ele escreveu a um aluno: “Nunca veja o rosto de um homem até que você tenha visto o rosto dele, que é a nossa vida, o nosso tudo” (Memoir).

E quando ele falava em ver a face de Deus, ele tinha em mente ver Deus na Palavra de Deus, a Bíblia. Ele escreveu a Horatius Bonar, irmão de Andrew: “Amo a palavra de Deus e a considero o mais doce alimento para minha alma” (Memoir). A palavra escrita se tornou a janela através da qual ele contemplava as glórias de Cristo – as belezas da Rosa. Essa era a chave para sua constante comunhão com Jesus, que era a chave para sua santidade e pregação.

Mas a comunhão se dá nos dois sentidos, e a oração era essencial ao poder de McCheyne. Tanto a Palavra de Deus lida como a Palavra de Deus pregada dependem da oração para ter poder. A oração era tão crucial para o seu poder na pregação que ele era muito zeloso em discernir rapidamente qualquer obstáculo à oração. Uma das medidas que McCheyne usava para discernir se ele estava excessivamente apaixonado pelo mundo era perceber o efeito que isso tinha em suas orações e leituras da Bíblia: “Irmãos, se vocês estão tão envolvidos com o prazer que é necessário afastar-se de seu amor pela oração ou por sua Bíblia. . . então você está abusando deste mundo. Oh! Liberte-se da alegria deste mundo: ‘o tempo é curto’” (Sermons).

Por essa prática, Palavra e oração, a Rosa de Sarom tornou-se cada vez mais bonita e preciosa para McCheyne. E o tempo todo, esses atos de devoção estavam sendo intensificados pelo espinho de seu sofrimento e pela expectativa de uma vida curta. Na semana em que terminou os estudos universitários, ele escreveu: “A própria vida está desaparecendo rapidamente. Apressa-se para a eternidade” (Memoir).

O véu da Eternidade Levantado

Não demorou muito para que as evidências da tuberculose se tornassem inconfundíveis. No início de 1839, ele escreveu: “Meu quadro doentio me faz sentir, todos os dias, que meu tempo pode ser muito curto”. E para sua própria congregação, ele disse no início de 1843: “Não espero viver muito. Espero um chamado repentino algum dia, talvez em breve, portanto, digo isso muito claramente” (Memoir).

Todo esse sofrimento e expectativa da morte produziram tal concentração de simplicidade e intensidade, que deram um poder cada vez maior a tudo o que McCheyne fazia. Ele via isso como a maneira misericordiosa pela qual Deus levantou o véu desde a eternidade. Ao viver e morrer na manhã da vida, McCheyne beijou a Rosa e sentiu o espinho. Sua suprema alegria era conhecer a Cristo. Ele viveu em comunhão com Jesus através da Palavra e oração. E o espinho de seu sofrimento intensificou e purificou essa comunhão, de modo que ainda estamos sendo inspirados por ele 176 anos depois.

Por: John Piper. © Desiring God Foundation. Website: desiringGod.org. Traduzido com permissão. Fonte: He Died Early in the Smile of God.

Original: Ele morreu cedo no sorriso de Deus. © Ministério Fiel. Website: MinisterioFiel.com.br. Todos os direitos reservados. Tradução: Paulo Reiss Junior. Revisão: Filipe Castelo Branco.