O que podemos aprender com Lutero na Dieta de Worms?

A Dieta de Worms (Janeiro-Maio de 1521)

Hoje é domingo, dia 18 de abril de 2021 e escrevo esse texto em celebração aos 500 anos da afirmação do reformador alemão, Martinho Lutero, quanto a sua fé na Dieta de Worms. “Worms era o local da Dieta Imperial, marcada para se reunir de tempos em tempos, e aconteceu do fim de janeiro ao final de maio de 1521.”[1] Era uma assembleia imperial convocada pelo Imperador Carlos V para que Lutero ou negasse ou reafirmasse o que havia escrito, pois suas 95 teses geraram problemas frente ao Papa de Roma. “Lutero chegou a Worms em 16 de abril, sob aplausos da multidão, à exceção das autoridades papais. Em 17 de abril, Lutero se apresentou diante da Dieta. Na frente de Lutero, havia uma mesa comprida, sobre a qual se encontrava espalhada uma coleção de seus escritos.”[2]

O reformador passa a noite em vigília de oração, mas diferente de suas lutas comuns com a ansiedade e tentação, Deus lhe deu graça e ele sentiu paz de consciência e segurança no Senhor. A razão pela qual Lutero foi parar nessa dieta foi a excomunhão do Papa e Frederico, o Sábio, príncipe eleitor da Saxônia, tentou lhe dar um salvo conduto, mesmo não sendo bem sucedido, Lutero teve a oportunidade de se apresentar e ser indagado quanto as suas teses. Tal dieta ou assembleia, era formada por um tribunal eclesiástico e poderes civis, com Lutero correndo o risco de ser condenado como herege.

Em suas 95 teses, Lutero afirma o evangelho da graça, a fé em Cristo, e questiona as indulgências, a venda de itens com a concessão da salvação das almas no purgatório, por parte da igreja da época.

Ao ser questionado por Johann Eck, diante de seus livros, Lutero pediu mais um dia para a defesa. Era 17 de abril de 1521. No dia seguinte, proferiu então, diante do plenário, suas famosas palavras:

“A não ser que eu esteja convencido pelo testemunho das Escrituras ou por uma clara razão (pois não confio no papa, nem apenas em concílios, visto que é bem sabido que eles têm errado frequentemente e se contradizem), estou preso às Escrituras que tenho citado e minha consciência é cativa à Palavra de Deus. Não posso negar, e não negarei nada, pois não é seguro nem direito ir contra a consciência. Não posso fazer de outro modo. Que Deus me ajude! Amém.”[3]

Como resultado de sua assertiva, “Carlos condenou Lutero como herege e pronunciou sobre ele pena de morte. Foram concedidos a Lutero vinte e um dias de salvo-conduto para colocar suas coisas em ordem. A Dieta ordenou que fossem queimados todos os seus livros. O conflito que cercava a vida de Lutero havia atingido a mais alta intensidade.”[4]

Lutero foi condenado a pena capital, perseguido e marginalizado ao lançar o princípio que regeria tanto a reforma na Alemanha, como também na Suíça e em outras regiões na Europa, a saber, o Sola Scriptura, somente a Escritura é autoridade final sobre regra de fé e prática, crença e conduta, doutrina e ética, não sendo equiparada a nenhum bispo, concílio ou tradição, mas todos devem estar debaixo dela.

Mas ele não queria ser um novo bispo, ou fundar uma nova igreja. “Lutero estava disposto a admitir que estava errado se isso fosse provado.”[5] De sua retórica, surgiu a expressão muito utilizada pela igreja evangélica (luterana), “aqui eu me firmo”, embora haja debate histórico sobre se essa expressão realmente saiu da boca de Lutero. Tenha saído ou não, o fundamento está lançado e com ele, o que podemos aprender.

O que podemos aprender com Lutero?

Todo acontecimento histórico, sobretudo envolvendo a peregrinação do povo de Deus rumo a Nova Jerusalém que desce do céu (Apocalipse 21 e 22) traz ensino precioso e edificante, como também inspiração e encorajamento para os cristãos das gerações seguintes. O que podemos aprender com a postura de Lutero na Dieta de Worms?

Em primeiro lugar, que somos chamados a confessar a fé. A Fé Cristã é uma fé credal e confessional, e como tal, deve ser confessada pela igreja, o ajuntamento dos santos em Cristo, os que foram alcançados pela graça de Deus. Quando confessamos a fé, louvamos a Deus (Hebreus 13.15), ou seja, Deus é glorificado quando seu povo confessa o seu nome. Lutero não levou a Worms ideias filosóficas ou retórica sofista, mas sim a afirmação do santo evangelho da graça de Deus, recebido pela fé, revelado nas Escrituras Sagradas. Portanto, que a fé seja confessada, independente do contexto e que o Senhor nos dê a sua graça para tal (porque é só por ela).

Em segundo lugar, aprendemos com Lutero a lutar pelo que importa. O reformador estava no contexto da descoberta da imprensa e escreveu muitos textos, com polêmicas e seu conteúdo foi amplamente divulgado. Mas, em Worms, soube reconhecer o que era seu pensamento, ideias humanas e o que era revelado na Palavra de Deus. Conseguiu fazer essa distinção, e estava disposto a negar suas ideias. Mas não estava disposto a negar a Palavra de Deus, nem a fé em Cristo. Que a afirmação seja pelos aspectos centrais da fé cristã e não debates importantes, porém, periféricos para a fé cristã.

Aqui cabe uma palavra de encorajamento. Muitos jovens tem conhecido a fé nas redes sociais da internet e louvamos a Deus por isso. Mas há muito debate com muito calor e pouca luz, muita discussão, às vezes, lamentavelmente faltando o decoro cristão. Podemos aprender a confessar a fé, com coragem e doçura ao mesmo tempo, sabendo respeitar o próximo, sem faltar com a verdade bíblica.

Um terceiro ponto é que Lutero não vivia para o debate e pelo debate. O debate era comum nas Universidades daquele tempo, mas ele tinha obrigações e deveres, sobretudo como professor universitário, da cadeira de Hebraico, como também, auxiliava o vigário do Castelo de Wittenberg. O debate era uma consequência da redescoberta do evangelho da graça e da justificação pela fé e do ensino desses fundamentos a luz da escritura sagrada. Podemos aprender a discernir e evitar contenda, ou saber enfrenta-la quando o evangelho “está em disputa”.

A postura de Lutero na Dieta de Worms traz encorajamento, inspiração, ensino, consolo, conforto e o lançamento de fundamentos essenciais e centrais para fé. Que Deus seja louvado pela vida de seu servo, e nós, o seu povo, edificados pela peregrinação e coragem dos servos de Deus na história. Soli Deo Gloria.


Recursos relacionados

Livro: O legado de Lutero – R. C. Sproul & Stephen Nichols
Livro: Além das 95 teses: A vida, o pensamento e o legado de Martinho Lutero – Stephen Nichols
• Curso: Lutero e a Reforma – R. C. Sproul
• Curso: A Reforma em 5 Solas – Stephen Nichols
Curso: Terras da Reforma – Franklin Ferreira, Jonas Madureira e Tiago Santos


[1] Sproul, R.C.. O Legado de Lutero (p. 59). Editora Fiel. Edição do Kindle.

[2] Ibid.

[3] Ibid. P. 73.

[4] Ibid.

[5] Nichols, Stephen. Além das 95 teses: A vida, o pensamento e o legado de Martinho Lutero (p. 52). Editora Fiel. Edição do Kindle.