Um blog do Ministério Fiel
Salmo 32: A Misericórdia que nos assiste (Parte 4)
Compreendo o contexto e a estrutura literária do Salmo 32
O Salmo 32, objeto de nosso estudo, é um dos sete salmos penitenciais (6, 32, 38, 51, 102, 130 e 143), assim chamados porque trazem com ênfase a confissão do pecador arrependido e/ou demonstram com intensidade a necessidade do favor de Deus. Neles encontramos forte alento para o pecador perdoado.
Além de gratidão (v. 3-8), neste salmo temos também instrução (8), contrastando o comportamento do íntegro com o do ímpio (10) e, por fim uma palavra de estímulo a todos os perdoados a se alegrarem em Deus (11).[1]
A sua estrutura é bem clara:
1) A bênção do Senhor (1-2).
2) A pressuposição da triste experiência do pecado, arrependimento, confissão e perdão (3-5).
3) A experiência do perdão encoraja-nos a buscar refúgio em Deus (6-7).
4) A disposição de Deus em nos instruir (8-10).
5) Convite a todos os “justificados” a se alegrarem em Deus (11).
Neste salmo Davi narra a sua experiência tendo como ingrediente fundamental a misericórdia perdoadora de Deus.
Aqui ele compartilha com o seu povo a bênção do perdão, demonstrando a intensidade e gravidade do seu pecado e a bem-aventurança de ser fiel a Deus.
O conceito de bem-aventurança
A palavra traduzida por “bem-aventurado” (rv,a,) (‘esher) (1) é, em geral, uma exclamação que quer dizer: “quão feliz é”, “verdadeiramente feliz”, “verdadeiramente abençoado”.
Para os gregos a ideia de bem-aventurança (maka/rioj) estava geralmente associada a algum bem terreno: saúde, bem-estar, filhos e riquezas, ainda que não exclusivamente, podendo se referir ao conhecimento e à paz interior.[2] A palavra grega carrega consigo o sentido de beleza e harmonia.[3]
O Antigo Testamento, por sua vez, contém muitas advertências contra o julgamento puramente externo; de forma que a verdadeira bem-aventurança, de modo especial nos Salmos, está associada:
- À confiança em Deus (Sl 40.4; 84.12);[4]
- Refugiar-se em Deus (Sl 12; 34.8);[5]
- Ser disciplinado e educado por Deus (Sl 94.12; Jó 5.17);[6]
- Andar na Lei do Senhor (Sl 119.1-2);[7]
- Ter a Deus por auxílio, esperança (Sl 146.5)[8] e Senhor (Sl 33.12; 144.15);[9]
- Ser escolhido de Deus (Sl 65.4);[10]
- Temer a Deus e andar nos seus caminhos (Sl 128.1);[11]
- Socorrer o necessitado (Sl 41.1).[12]
- E, neste salmo, ter os pecados perdoados (Sl 32.1).[13]
Caminhemos com o salmista para partilharmos de sua exultação. Por vezes, para entender a alegria do amanhecer, temos que visualizar as angústias da noite.
Contexto histórico (2Sm 11)
Davi reinava sobre Israel. O seu reinado era relativamente tranquilo. Em certa ocasião, quando o seu exército estava em guerra contra os Amonitas, Davi, atipicamente, não foi guerrear (Vejam-se: 2Sm 5.2; 8.1-14; 10.17; 18.3; 21.17). Ficou no palácio. A situação, parece, estava bem encaminhada. Ele não precisava mais sair para guerrear. Ele tem os seus competentes e leais comandantes. Digamos, Davi estava com o seu burro amarrado na sombra. Podia ficar em casa ociosamente.
Numa tarde, viu uma linda mulher chamada Bate-Seba, a quem desejou. Procurou saber a seu respeito. Davi adulterou com ela. Bate-Seba ficou grávida.
Calvino comenta sobre a progressão da tentação de Davi:
Este texto nos adverte que, quando nos sentimos tentados e inclinados a algum vício, devemos imediatamente nos controlar e impedir Satanás de entrar e tomar posse de nós. Portanto, sejamos cuidadosos e não acender um fogo mau, mas ouçamos a admoestação de Paulo a Timóteo: “Reavives o dom de Deus” (2Tm 1.6). Ele usou essa ilustração, que significa: fazer prevalecerem os favores que ele tinha recebido. Ele chama isso de “reviver”. Por quê? Porque quando Deus planta em nós uma pequena gota de sua graça, se formos muito preguiçosos e negligentes em fazê-la prevalecer, é como se estivéssemos extinguindo totalmente essa gota de pureza. Portanto, devemos colocá-la em operação. É como um fogo que está pronto para ser aceso novamente, de modo que possa novamente arder em chamas e continuar queimando. De fato, isso é frequentemente mencionado na Escritura – que extinguir a graça de Deus é como apagar o fogo. Mas, quando possuímos uma única centelha da graça de Deus, devemos imediatamente ser cheios de verdadeiro zelo e ardor, para que esse fogo não se apague. Sejamos cuidadosos, portanto, para não o apagar com a nossa falta de cuidado, e protejamo-lo com orações e petições e o mantenhamos aceso. Isto é, quando tivermos algum pensamento mau, não o alimentemos até que nosso coração seja finalmente incendiado, para que o expulsemos assim que pensarmos nele. Também não devemos nos encorajar em um desejo perverso e misturá-lo com outro pensamento vicioso que já temos. Então, isso é o que devemos levar em conta quando vemos que Davi perguntou quem era aquela mulher.[14]
Sendo ela casada, estando o seu marido, Urias – arrolado como um dos valentes de Davi (2Sm 23.39; 1Cr 11.41) – com o exército de Israel na batalha, Davi arquitetou um plano: mandou chamá-lo, induziu-o a ir para sua casa deitar-se com sua mulher, enviando-lhe, inclusive presente.
No entanto Urias não quis fazê-lo porque achava injusto que a arca, Israel e Judá estivessem em tendas; seus companheiros de batalha ficassem ao relento enquanto ele permanecesse em sua casa comendo e bebendo. Assim, dormiu à porta da casa do rei.
Davi usa então outra estratégia; faz com que Urias coma e beba bastante e se embriague e, assim, arrefecendo seus princípios, fosse para sua mulher. Nada disso adiantou.
As Escrituras não ocultam as fraquezas de seus personagens. Na narrativa, o contraste é realçado pela atitude de Urias que por duas vezes se negou a deitar-se com sua esposa, em solidariedade aos seus companheiros que permaneciam no campo de batalha, enquanto Davi, mente, finge e se torna um assassino para poder ter a esposa de seu leal soldado.
Não satisfeito, Davi com uma estratégia cada vez mais pecaminosa, envia pelo próprio Urias a sua sentença de morte. Ele sabia que Urias não seria tentado a violar a correspondência. Assim, na carta que o valente e íntegro Urias leva ao comandante do exército de Israel, Joabe, Davi dizia: “Ponde a Urias na frente da maior força da peleja; e deixai-o sozinho, para que seja ferido e morra” (2Sm 11.15). Nesse processo pecaminoso, Davi tornar-se-ia assassino de diversos outros soldados leais (2Sm 11.17).
O rei Davi valeu-se das oportunidades concedidas por Deus não para se arrepender, mas, para agravar de forma assustadora a sua maldade. Esse episódio ilustra de forma iluminadora o potencial de maldade do coração humano; o coração de todos nós.
Assim se fez. Urias foi morto e Davi tomou Bate-Seba para si. Parecia que tudo estava dando certo. Ninguém fora do contexto imediato percebera nada. O grande estrategista venceu mais uma. No entanto, o texto relata: “Isto que Davi fizera, foi mal aos olhos do Senhor” (2Sm 11.27).
O Senhor que não vê como vê o homem e, por isso, por graça Ele o tornou rei (1Sm 16.7), vê todas as coisas. Mais tarde, Salomão escreveria: 20“Por que, filho meu, andarias cego pela estranha e abraçarias o peito de outra? 21Porque os caminhos do homem estão perante os olhos do SENHOR, e ele considera todas as suas veredas” (Pv 5.20-21).
Esta foi a batalha mais difícil pela qual Davi passou. Não havia exércitos inimigos, não havia perseguição, fome, sede, fuga, nem valentes guerreiros. O inimigo estava no coração de Davi; era a cobiça. O olho abrira as portas do seu coração para a cobiça.[15]
Em geral, o inimigo mais difícil de ser combatido está dentro de nós mesmos. É por isso que as nossas estratégias contra tentações exteriores, por mais eficientes que sejam, são insuficientes, porque o mal está dentro de nós.
A cobiça, quando toma conta de nosso coração, assume o status de Deus, e o que cobiçamos passa a ser adorado (Cl 3.5).[16] Parece que o mais difícil para Davi não foi conquistar o inimaginável reino, mas preservá-lo. Por vezes, estamos prontos para determinados testes que se configuram à primeira vista como mais difíceis. Nos preparamos adequadamente, nos concentramos, damos o melhor… e, tombamos em outros, que parecem mais simples. Para estes, é natural, sem percebermos, quase que instintivamente baixemos a guarda, relaxemos, confiemos em nossa força e experiência. Os olhemos, talvez, até com certo desdém.
O grande estrategista; o valente Davi, caiu, tombou. Tombou tão forte, que a sua história serve de alerta para todos nós: Todos estamos sujeitos a isso. Quando nos sentirmos autossuficientes, estaremos a um passo da queda e, portanto, de uma total deficiência. Satanás nos conhece bem.[17] Ele sabe qual tecla apertar, qual corda tanger.
A nossa santidade, por maior que seja, por si só[18] não está imune à sonoplastia satânica que tão bem fala aos nossos ouvidos, fascina os nossos olhos de forma indutiva,[19] enche de cobiça nossas mentes e atiça as nossas mãos.
Quando damos ouvidos a ele, a nossa queda vai ecoar em nós e, seus efeitos serão também danosos sobre as pessoas que amamos. Contudo, primeiramente o pecado é contra Deus; uma ofensa à santidade de nosso Senhor.
O puritano Dyke († 1614), vasculhando o coração humano em seus subterfúgios, escreveu:
As provações vêm em meio à prosperidade. Ela não é superada pela adversidade. […] Há muitos que não são detectados pela aflição, embora sejam pela paz e pela prosperidade. Algumas pessoas do tempo da rainha Maria, que mantiveram suas vestes de fé e boa consciência, apesar de todo o abalo de ventos violentos que sopravam muito ferozmente naquele tempo, mais tarde – pelos raios agradáveis daquele doce brilho do sol que se seguiu – foram tentados a desabotoar-se e tirar seus casacos, ou, pelo menos, a usá-los mais folgadamente. Como Davi foi inocente em suas aflições! Se 100 Bate-Sebas tivessem se encontrado com ele no deserto, ele não teria sido abalado. Mas depois, quando estava despreocupado em seu reino, quão facilmente ele caiu! Dessa forma, como aquelas mulheres que cantavam sobre Saul e Davi com alegria e felicitações – “Saul feriu os seus milhares, porém Davi, os seus dez milhares” – podemos verdadeiramente cantar sobre as provações de Davi com pranto e lamentação: “A adversidade feriu os seus milhares, porém a prosperidade, os seus dez milhares”.[20]
Árvores mais altas necessitam de raízes mais profundas e vigorosas. A nossa ascensão profissional, social, intelectual e econômica, em geral, vem acompanhada de tentações mais sofisticadas e sutis, às quais se configuram de maneira diferente. Possivelmente o nosso arsenal espiritual, se não estiver em constante sincronia com a Palavra, estará desatualizado para uma batalha na qual já entramos vencidos porque nem sequer a percebemos como tal.
A ignorância a respeito de nosso inimigo e de seu arsenal bélico de tentações, pode nos conduzir, devido à falta de percepção dos perigos, a uma ingênua e fatal indolência espiritual. Não brincamos com o pecado, nem fazemos pouco caso das tentações. O nosso coração em sua volúpia pode se tornar em um péssimo conselheiro a serviço do pecado.[21]
“O homem que ainda não descobriu o poder da tentação é o mais típico novato em questões espirituais. (…) O poder do inimigo contra nós somente é inferior ao poder de Deus. Ele é mais poderoso que qualquer homem que jamais viveu; e os santos do Velho Testamento caíram diante dele”, acentua Lloyd-Jones (1899-1981).[22]
Calvino (1509-1564) tem razão quando diz que: “Aqueles que a tal combate se preparam na confiança de si mesmos não compreendem suficientemente com quão aguerrido e bem equipado adversário têm que enfrentar”.[23] A autoconfiança é uma armadilha que produzimos alegre e vaidosamente e, da qual Satanás se vale de forma sutil eficaz.[24]
Ao que parece, Davi se esqueceu do seu pecado e continuou a viver tranquilamente, entregando-se, como diz Calvino, a uma profunda letargia espiritual;[25] até que, cerca de um ano depois o profeta Natã foi enviado por Deus a Davi, contando-lhe uma parábola que dizia haver dois homens numa cidade: um rico e o outro pobre. O rico tinha um grande gado e muitas ovelhas. O pobre tinha apenas uma cordeirinha que tratava como filha. O homem rico, quando recebeu um viajante, querendo oferecer-lhe um banquete, sem nenhum constrangimento tomou a cordeirinha do pobre, a preparou e serviu como prato principal ao homem que havia chegado.
Essa história – que falava tão de perto a Davi, que fora um dedicado pastor de ovelha – foi suficiente para deixá-lo irritadíssimo, declarando ao profeta em forma de juízo: “Tão certo como vive o Senhor, o homem que fez isso deve ser morto. E pela cordeirinha restituirá quatro vezes, porque fez tal cousa e não se compadeceu” (2Sm 12.5-6).
Há algo de surpreendente aqui. Davi, servo de Deus, poeta inspirado e rei de Israel, adulterou, tentou esconder seu pecado, envolveu pessoas nisso e, por fim, providenciou com requinte de sagacidade a morte de um leal servo e amigo. Nada disso o sensibilizou. No entanto, o coração de pastor de ovelha falou-lhe mais alto. O pecado afeta também o nosso intelecto; ele é anti-intelectual nos fazendo perder o discernimento. Ele cria um obstáculo epistemológico para com a Palavra de Deus e seus ensinamentos. Tornamo-nos avessos ou, simplesmente impermeáveis à instrução divina.
Isso me faz pensar das diversas mensagens que comumente recebemos por e-mail e via WhatsApp. Muitas nos sensibilizam com fotos e filmes de gatinhos, cachorrinhos e burrinhos. No entanto, por vezes, permanecemos insensíveis à fome, miséria, infanticídio, indução ao uso de drogas e exploração de todo tipo. O pecado nos bestializa. A nossa sensibilidade torna-se mal direcionada e nos perdemos diante do que é mais importante. Voltemos a Davi. Ele está sob forte emoção.
A surpresa maior estava por vir. Natã numa declaração corajosa e dramática diz a Davi: “Tu és o homem. Assim diz o Senhor Deus de Israel” (2Sm 12.7).
Deus o acusa de além de ter adulterado, ter matado a Urias pelas mãos dos Amonitas (2Sm 12.9). O pecado, sem arrependimento e confissão, tende a se agravar porque infecciona ainda mais a nossa alma e, comumente tentamos ocultá-lo cometendo outro e outro pecado. Foi isso que Davi fizera.
Mas agora, confrontado com a Palavra por meio da sensível parábola contada por Natã, Davi cai em si. Arrependido, diz com profunda tristeza: “Pequei contra o Senhor” (2Sm 12.13). Essas breves palavras foram suficientes para indicar logo de início o seu foco teológico e o seu arrependimento.
Aqui está o mais importante rei de Israel, que escreveu salmos magníficos, sendo inspirado sobrenaturalmente por Deus, mas, que cedeu à tentação, tendo que aprender a não confiar em si mesmo nas questões espirituais. Por um tempo ele esteve cego, dominado pelas suas tentações. Mas agora, aprendeu a duras penas o quão fraco é: Ele pôde enfrentar um leão, um urso, um gigante e um exército; no entanto, não consegue vencer as suas próprias inclinações pecaminosas.[26]
Só lhe resta, portanto, como a todos nós, apelar, como escrevera no Salmo 51, para a “multidão” da misericórdia de Deus (1), para que apague as suas transgressões (1,9), lave a sua iniquidade (2), o purifique do seu pecado (2,7), crie nele um coração puro (10), restituindo-lhe a alegria da salvação (12), sustentando-o com um espírito voluntário (12), pronto para obedecer a Deus.
O Deus de toda misericórdia o perdoa: “Disse Natã a Davi: Também o Senhor te perdoou (abar) (desconsiderar o pecado) o teu pecado (hattath);[27] não morrerás” (2Sm 12.13).
Foi nesse contexto de angústia que Davi escreveu o Salmo 51. O salmo 32 parece ter sido composto depois, quando o salmista recuperou a sua paz com Deus e pôde refletir mais demoradamente sobre a sua teologia e experiência que ilustra aquela.
Este salmo retrata de forma didática, sensível e intensa a bem-aventurança do perdão de Deus resultante de sua misericórdia que nos assiste. Aliás, “Só serão bem-aventurados aqueles que põem sua confiança na misericórdia de Deus”, afirma Calvino.[28]
Salmo 51 x Salmo 32
No Salmo 32 o salmista cumpre em parte o que escrevera no Salmo 51, sob o primeiro impacto da mensagem de Natã: “12Restitui-me a alegria da tua salvação e sustenta-me com um espírito voluntário. 13Então, ensinarei (lamad) aos transgressores os teus caminhos, e os pecadores se converterão a ti” (Sl 51.12-13).
No Salmo 32 ele conta a sua experiência de pecado, da qual não se orgulha, mas, também, se regozija com a bem-aventurança do perdão. A bem-aventurança está reservada aos que andam no caminho do Senhor (Sl 1) sendo ela progressiva estando associada necessariamente à santificação.[29] Davi agora descobriu, depois de muito sofrimento, a bem-aventurança da restauração espiritual; do retorno à comunhão com Deus. (Sl 32.1-2). A misericórdia de Deus sempre se manifesta quando nos arrependemos e confessamos nossos pecados.
Davi, então, escreve: “Muito sofrimento terá de curtir o ímpio, mas o que confia no SENHOR, a misericórdia (hesed) o assistirá (sabab)” (Sl 32.10).
A palavra “assistir”
A palavra que tem um amplo sentido literal e figurado, significa envolver, cercar, contornar. Apenas para ilustrar, menciono que esta é a palavra usada para descrever as voltas que o exército de Israel deu em torno de Jericó durante sete dias (Js 6.3, 4, 7,11,14,15).
A ideia expressa é a de que Deus nos cerca, nos envolvendo por todos os lados com a sua misericórdia. A misericórdia de Deus é uma realidade contínua em nossa existência. Contudo, ela se torna mais eloquente para nós quando tomamos consciência do nosso pecado, de nossa incapacidade em vencê-lo sozinho e, do perdão de Deus. O Espírito, por sua vez, reforça em nossa consciência a convicção do perdão divino.[30]
A consciência piedosa do cuidado de Deus realiza uma transformação em nós. Sendo guiados pelo Espírito, somos conduzidos a uma atitude de arrependimento pelos nossos pecados e indiferença e, também, à uma expressão de gratidão em reconhecimento ao fato de Deus ter nos assistido sempre em sua misericórdia. A misericórdia, como o seu amor nos constrangem.
Analisaremos nos tópicos seguintes as manifestações da misericórdia de Deus em nossa vida à luz do salmo 32.
[1] Vejam-se: Willem A. VanGemeren, Psalms: In: Frank E. Gaebelein, gen. ed. The Expositor’s Bible Commentary, Grand Rapids, MI.: Zondervan, 1991, v. 5, p. 271; Peter C. Craigie; Marvin E. Tate, Psalms 1-50, 2. ed. Waco: Thomas Nelson, Inc. (Word Biblical Commentary, v. 19), 2004, p. 265
[2] Cf. U. Becker, Bênção: In: Colin Brown, ed. ger., O Novo Dicionário Internacional de Teologia do Novo Testamento, São Paulo: Vida Nova, 1981-1983, v. 1, p. 297.
[3] Veja-se: William Barclay, El Nuevo Testamento Comentado, Buenos Aires: La Aurora, 1973, v. 1, (Mt 5.3), p. 97-98.
[4]“Bem-aventurado o homem que põe no SENHOR a sua confiança e não pende para os arrogantes, nem para os afeiçoados à mentira” (Sl 40.4). “Ó SENHOR dos Exércitos, feliz o homem que em ti confia” (Sl 84.12).
[5]“…. Bem-aventurados todos os que nele se refugiam” (Sl 2.12). “Oh! Provai e vede que o SENHOR é bom; bem-aventurado o homem que nele se refugia” (Sl 34.8).
[6]“Bem-aventurado o homem, SENHOR, a quem tu repreendes, a quem ensinas a tua lei” (Sl 94.12).
[7]“Bem-aventurados os irrepreensíveis no seu caminho, que andam na lei do SENHOR. Bem-aventurados os que guardam as suas prescrições e o buscam de todo o coração” (Sl 119.1-2).
[8]“Bem-aventurado aquele que tem o Deus de Jacó por seu auxílio, cuja esperança está no SENHOR, seu Deus” (Sl 146.5).
[9]“Feliz a nação cujo Deus é o SENHOR, e o povo que ele escolheu para sua herança” (Sl 33.12); “Bem-aventurado o povo a quem assim sucede! Sim, bem-aventurado é o povo cujo Deus é o SENHOR” (Sl 144.15).
[10]“Bem-aventurado aquele a quem escolhes e aproximas de ti, para que assista nos teus átrios; ficaremos satisfeitos com a bondade de tua casa – o teu santo templo” (Sl 65.4).
[11]“Bem-aventurado aquele que teme ao SENHOR e anda nos seus caminhos!” (Sl 128.1). Seguir fielmente o caminho do Senhor nos torna irrepreensíveis (Sl 119.1).
[12]“Bem-aventurado o que acode ao necessitado; o SENHOR o livra no dia do mal” (Sl 41.1).
[13]“Bem-aventurado aquele cuja iniquidade é perdoada, cujo pecado é coberto” (Sl 32.1).
[14]John Calvin, “Sermons on Second Samuel, 1:482-83”. In: Derek Cooper; Martin J. Lohrmann, eds. Reformation Commentary on Scripture. Old Testament V: 1-2 Samuel, 1-2 Kings, 1-2 Chronicles. Downers Grove, Illinois: InterVarsity Press: 2016, p. 195. (Devo esta citação ao Rev. Mauro Filgueiras que em correspondência particular a compartilhou comigo).
[15]“Na anatomia da tentação, o olho é a janela do coração” (Philip G. Ryken, Quando os problemas aparecem, São José dos Campos, SP.: Fiel, 2018, p. 75).
[16]“Fazei, pois, morrer a vossa natureza terrena: prostituição, impureza, paixão lasciva, desejo maligno e a avareza, que é idolatria” (Cl 3.5).
[17]“Suponho que não haja nenhum aspecto da natureza humana que seja desconhecido de Satanás”, especula Spurgeon. (C.H. Spurgeon, Um Antídoto contra os Artifícios de Satanás: In: Bruce H. Wilkinson, ed. ger. Vitória sobre a Tentação, 2. ed. São Paulo: Mundo Cristão, 1999, p. 182).
[18]Calvino comenta: “Quanto mais exceda alguém em graça, mais deve ele temer a queda; pois a política costumeira de Satanás é empenhar-se, mesmo à luz da virtude e força com que Deus nos revestiu, por produzir em nós aquela confiança carnal que nos induz à negligência” (João Calvino, O Livro dos Salmos, São Paulo: Paracletos, 1999, v. 1, (Sl 17.5), p. 333-334).
[19]“E não somente pode o pecado paralisar a memória, ele pode também torcer os fatos; pode manipulá-los, e provar qualquer coisa que queira. Pecado é capaz de manipular nosso raciocínio e corromper todas as nossas argumentações. Inflamará nossos desejos; pintará pinturas belíssimas; colocará óculos cor-de-rosa. Também paralisará a vontade a tal ponto que, quando a tentação vier novamente, esqueceremos de tudo de ruim que sentimos ao pecar, e cometeremos novamente o mesmo erro” (D.M. Lloyd-Jones, O Caminho de Deus não o nosso, São Paulo, Publicações Evangélicas Selecionadas, 2003, p. 78).
[20]Daniel Dyke. The Mystery of Self-Deceiving, 332-33. In: Derek Cooper; Martin J. Lohrmann, eds. Reformation Commentary on Scripture. Old Testament V: 1-2 Samuel, 1-2 Kings, 1-2 Chronicles. Downers Grove, Illinois: InterVarsity Press, 2016, p. 192. (Devo esta citação ao Rev. Mauro Filgueiras que em correspondência particular a compartilhou comigo).
[21]“Sucede amiúde, e deveras é muito natural, que a excelência dos dons produz descuido e frouxidão, sendo essa a maneira na qual Satanás age continuamente a fim de extinguir em nós tudo quanto provém de Deus” (João Calvino, As Pastorais, São Paulo: Paracletos, 1998, (2Tm 1.6), p. 201.
[22]D.M. Lloyd-Jones, Por Que Prosperam os Ímpios?, São Paulo: Publicações Evangélicas Selecionadas, 1985, p. 16-17. “Não há um santo sequer que ele não tenha atacado, assim como nenhum pecador que não tenha desencaminhado” (C.H. Spurgeon, Um Antídoto contra os Artifícios de Satanás: In: Bruce H. Wilkinson, ed. ger. Vitória sobre a Tentação, 2. ed. São Paulo: Mundo Cristão, 1999, p. 182).
[23]João Calvino, As Institutas, (2006), III.20.46.
[24]“A autoconfiança não é o caminho da santidade, mas sua negação. Ela é, diante das tentações e pressões conflituosas, uma garantia certa de que algum tipo de falha moral virá adiante” (J.I. Packer, A Redescoberta da santidade, 2. ed. São Paulo: Cultura Cristã, 2018, p. 74).
[25]João Calvino, O Livro dos Salmos, São Paulo: Paracletos, 1999, v. 2, p. 421.
[26]“Um homem pode confiar em Deus, esperar em Deus, lutar por Deus, cantar louvores a Deus e ainda ceder a uma tentação mortal” (Philip G. Ryken, Quando os problemas aparecem, São José dos Campos, SP.: Fiel, 2018, p. 71).
[27]Tratarei mais abaixo desta palavra.
[28]João Calvino, O Livro dos Salmos, São Paulo: Paracletos, 1999, v. 2, (Sl 32.1), p. 40.
[29] Veja-se: R.C. Sproul, A Alma em Busca de Deus: Satisfazendo a fome espiritual pela comunhão com Deus, São Paulo: Eclesia, 1998, p. 170.
[30] Veja-se: Herman Bavinck, Dogmática Reformada, São Paulo: Cultura Cristã, 2012, v. 4, p. 182.