COVID-19 e a Nossa Humilhação

Depois de dois anos de pandemia, nós ainda nos humilhamos?

“Portanto, humilhem-se debaixo da poderosa mão de Deus, para que ele, em tempo oportuno, os exalte.” (1Pe 5.6)

Dois anos atrás, os dominós estavam caindo. Todos nós podemos contar nossas próprias histórias de como percebemos, através de um anúncio após o outro, que nosso mundo parecia estar mudando da noite para o dia.

À medida que interrupções e confinamentos se estendiam pelo mundo, Deus estava nos humilhando — e, sem dúvida, com mil outros bons propósitos por trás. Mas ele estava nos humilhando, e nada menos que isso. Você e eu, cristãos — começando pelas nações mais desenvolvidas do mundo — Deus estava nos humilhando. Uma pandemia verdadeiramente global foi, e continua a ser, uma demonstração impressionante do alcance global de sua poderosa mão (1Pe 5.6) e seus dedos gentis e amorosamente permissivos (Lc 22.31).

A questão não é se sua mão humilde desceu (e continua descendo), mas se nós reconhecemos isto. Enchemos nossas mentes com explicações naturais? Corremos para notícias e reportagens sobre ciência para explicá-la na íntegra e acalmar nossas ansiedades? Você rastreou a composição de perturbações, inconveniências, tragédias e divisões, até a permissão soberana e a providência salvadora de Deus?

Ele nos humilhou. Isso está muito claro. Contudo, a questão permanece: nós nos humilhamos? Reconhecemos sua mão poderosa e misericordiosa, recebemos sua humilhação pela fé e até aceitamos seu trabalho desconfortável?

Terreno delicado

Talvez, muitos de nós poderíamos dizer que, nos últimos dois anos, aprendemos vários conceitos e termos científicos e epidemiológicos, mas o que aprendemos recentemente — se é que aprendemos algo — sobre nosso Deus, nós mesmos e seu mundo? Em especial, percebemos a fragilidade de nosso conhecimento, de nossos corpos, de nossos relacionamentos e de nossas sociedades? Quanto de nossas seguranças e confortos foram expostos como construídos na areia?

Para começar, conte comigo apenas algumas das maneiras pelas quais uma pandemia global nos humilhou. Primeiro, a ameaça da morte nos humilhou e alimentou o medo e a histeria iniciais. E, com isso, a interrupção de uma vida normal nos humilhou. Mesmo muitos que podem não temer a morte lamentaram pela perda do Final Four, da NBA e da Major League Baseball. E o fechamento de escolas e escritórios mudou as famílias da noite para o dia.

Os confinamentos e seus efeitos nos humilharam. E as máscaras nos humilharam. Ah, como humilharam, e ainda o fazem! Coloque isto no rosto, ou vá para casa. E claro, a vacina nos humilhou, com seus riscos e incertezas inerentes (de uma forma ou de outra!) e suas implicações pessoais e práticas — e depois, tomando decisões por nossos filhos. Mas não fomos humilhados apenas como indivíduos e famílias.

Governos foram humilhados. Partidos políticos humilhados. Escolas e empresas humilhadas. E sim, igrejas humilhadas. Da noite para o dia, nossas reuniões de adoração corporativa enfrentaram novas incertezas, levando-nos a navegar em um terreno delicado entre nosso próprio povo (sem mencionar os obstáculos e as pressões externas).

Uma marca de dois anos

Em, e através de, uma pandemia global, Deus desencadeou, muitas vezes e de muitas formas, fortes admoestações e lembretes gentis, gritos e sussurros, exposições afiadas e exortações graciosas para os justos e os ímpios, para os crentes e os incrédulos.

E o que dizemos de sua duração, até hoje? José esperou “dois anos inteiros” (Gn 41.1) em mais confinamento quando o copeiro se esqueceu dele. Nós também estamos na marca de dois anos inteiros dessa calamidade lenta, onda após onda, variante após variante, mês após mês, por duas voltas ao redor do Sol — e quanto tempo mais? Anos? Como o COVID lançará sua longa sombra no resto de nossas vidas? Nós não sabemos. E isso é humilhante.

Mas ser humilhado é uma coisa; admitir isso, e até mesmo receber, é outra.
Objetivamente, Deus humilhou nosso mundo através do COVID-19, mas
nosso mundo, em geral, se humilhou subjetivamente diante dele?

Propósito divino e auxílio

Sem fazer pronunciamentos indevidos sobre o que Deus está fazendo ou não, podemos ser sábios em nos questionar: a duração dessa pandemia é um reflexo obscuro de nosso orgulho coletivo e dureza de coração? E quão poucos receberam a mão humilde de Deus por meio de corações humildes e orações auto-humilhantes?

Temos nos ocupado com as opiniões, tanto de especialistas quanto de leigos, acerca de epidemiologia, economia e política, de acordo com o padrão deste mundo (Rm 12.2), ao invés de encararmos o fato de que nosso Deus está nos céus e faz tudo como lhe agrada (Sl 115.3)? Como Nabucodonosor aprendeu sobre o Altíssimo, depois de uma longa humilhação de “sete tempos” (Dn 4.32), de que “não há quem lhe possa deter a mão” (Dn 4.35). Como o
profeta perguntou retoricamente: o desastre pode chegar a uma cidade — ou ao mundo inteiro — a menos que Deus o tenha feito (Am 3.6)?

Quantos de nós, que estamos em Cristo, deixamos a conversa do mundo sobre causas, correlações, efeitos e estatísticas nos impedir de ver através da neblina e cair de joelhos? E ali, prostrados diante de nosso Deus, antes de perguntarmos como Deus estava humilhando nossos inimigos ideológicos recém-percebidos, perguntamos qual era a sua aplicação daquilo para mim? Deus, me ajude. Por favor, tire a trave do meu olho primeiro. Eu me humilho diante de ti.

Como Deus me humilhou?

Confesso que tenho sido mais lento do que gostaria em ter como prática notar as humilhações do COVID. Foi só em algum momento do ano passado que comecei a guardar um pedaço de papel na minha Bíblia para registrar como o COVID me humilhou — na esperança de tentar me humilhar diariamente diante de Deus. Compartilho apenas alguns itens da lista para que você saiba o tipo de humilhação que tenho em mente.

Primeiro, a pandemia me humilhou ao revelar os limites do meu conhecimento, em todos os lugares. Por que fingir saber mais do que eu sei? Por que não reconhecer meus limites? Por que não lembrar e abraçar minha finitude? Que eu, como criatura, não crio minha própria realidade e, no grande esquema, sei muito pouco sobre tanta coisa que faz o mundo girar. Meu corpo e minha saúde são humanos e frágeis, e a criação é amaldiçoada por causa do pecado humano e sujeita à futilidade (Rm 8.20).

Não só não sei tanto quanto muitas vezes finjo, mas tenho muito menos controle do que suponho. O fato de que um vírus invisível a olho nu tenha afetado praticamente todos os aspectos da vida me lembra que este é o mundo de meu Pai, não meu. Tanta coisa na vida moderna nos condiciona a fingir que ele é nosso. Pandemias, guerras, furacões e incêndios florestais nos lembram que este lugar não é nosso último lar. Em nossos mundos de areia, a Palavra de Deus é a única rocha segura sobre a qual podemos nos apoiar.

O COVID me humilhou para que eu pudesse ver a fragilidade da sociedade e dos relacionamentos. Primeiro, sentimos isso com barreiras desconfortáveis para nos reunirmos pessoalmente: confinamentos, máscaras, e agora, cartões de vacina. Em algumas de nossas comunidades mais antigas e preciosas, novas falhas emergiram, novas prioridades têm energia. Na perturbação, queridos amigos mudaram de cidades e de igrejas. A separação dói. Em alguns lugares, divisões parecem crescer em linhas étnicas. Minha própria cidade se mostrou muito mais frágil do que eu teria imaginado. Até mesmo queridas igrejas irmãs têm sofrido pressões dolorosas e fraturas.

Fui rebaixado para considerar novamente como gasto meu tempo. O discurso público em aplicativos de grande tecnologia expôs como a maior parte dele tem sido vazia há dez anos. Jurassic Park parecia incrível, até que os dinossauros começaram a comer as pessoas. É humilhante pensar o quão melhor eu poderia ter investido o pouco tempo que dediquei às mídias sociais na última década.

A última humilhação a ser observada aqui diz respeito à fragilidade econômica. Passei quase quarenta anos da minha vida achando que poderia adquirir bens básicos sempre que quisesse. E a internet parecia tornar isso ainda mais fácil. É humilhante para um cidadão urbano como eu ser lembrado de que, sem lojas próximas, um automóvel, gasolina e uma linha de suprimentos funcionando, eu não teria nada para comer em questão de dias.

Você fez uma pausa?

E você? Como estes últimos dois anos o humilharam? Não apenas circunstancialmente, mas em sua própria alma diante de Deus? Você fez uma pausa para se humilhar sob sua mão poderosa e globalmente soberana?

Deixe-me encorajá-lo a fazer uma pausa comigo e reconhecer o Deus do COVID-19. Ele é soberano e ele é bom. Jesus Cristo, que viveu como um de nós nesse mundo doente, morreu por pecados que não eram seus, ressuscitou em triunfo e está sentado no trono do céu, empunhando seu cetro com o cuidado, com as intenções e a habilidade de um cirurgião que salva vidas com seu bisturi. Jesus está cumprindo e cumprirá todos os seus sábios e bons propósitos em e através de uma pandemia global. Ele está humilhando o mundo. E seu povo se humilhará sob sua mão poderosa, se arrependerá conforme necessário (Lc 13.3, 5) e lhe dará glória (Ap 11.13; 16.9).

E um dia, em breve, sem minimizar nenhuma dor, interrupção, perda e dificuldade, nós o louvaremos e agradeceremos a severa misericórdia do COVID-19.

Por: David Mathis. © Desiring God Foundation.Website: desiringGod.org. Traduzido com permissão. Fonte: After Two Whole Years: Have We Humbled Ourselves Yet?
© Voltemos ao Evangelho. Website: voltemosaoevangelho.com. Todos os direitos reservados. Tradutor: Julia Maria. Editor: Vinicius Lima. Revisor: Zípora Dias