Uma Carta de John Newton [Controvérsia 1/7]

Começamos uma série de 7 postagens sobre como lidar de forma cristã com controvérsias. É difícil expressar a importância da leitura desta série, principalmente se você tem se engajado nos intermináveis debates via internet.

Um pastor, prestes a escrever um artigo criticando um colega pastor por sua falta de ortodoxia, escreveu a John Newton sobre suas intenções. O que segue é a (primeira parte da) carta resposta de Newton:

Caro Senhor,

Visto que você está envolvido em controvérsia e que o seu amor pela verdade está unido a um entusiasmo natural de temperamento, minha amizade me deixa apreensivo a seu respeito. Você está do lado mais forte, porque a verdade é poderosa e tem de prevalecer. Assim, mesmo uma pessoa de habilidades inferiores pode entrar na batalha confiante na vitória. Por essa razão, não estou ansioso pelo acontecimento da batalha. Mas desejo que você seja mais do que vencedor e triunfe, não somente sobre o seu adversário, como também sobre você mesmo.

Se você não pode ser vencido, pode ser ferido. A fim de preservá-lo de tais feridas, que lhe poderiam dar motivo de chorar por suas conquistas, quero presenteá-lo com algumas considerações, que, devidamente atendidas, lhe servirão de cota de malha, um tipo de armadura do qual você não precisará queixar-se, como o fez Davi em relação à armadura de Saul, a qual era incômoda e inútil. Você perceberá que esta cota de malha foi extraída do grande manual dado ao soldado cristão, a Palavra de Deus.

Estou certo de que você não espera qualquer pedido de desculpas por minha liberdade; por isso, não oferecerei nenhum. Por amor ao método, reduzirei meu conselho a três assuntos: o seu oponente, o público e você mesmo.

Considere seu oponente

Quanto ao seu oponente, desejo que, antes de começar a escrever contra ele e durante todo o tempo em que estiver preparando a sua resposta, você o confie, por meio da oração sincera, ao ensino e à bênção do Senhor. Esta atitude terá a tendência imediata de conciliar seu coração ao amor e à compaixão por seu adversário; e tal disposição exercerá boa influência sobre cada página que você escrever.

Se você toma seu adversário por um crente, embora esteja grandemente errado no assunto debatido entre vocês, as palavras de Davi a Joabe, a respeito de Absalão, lhe são bastante aplicáveis: “Tratai com brandura… por amor de mim” (2 Sm 18.5). O Senhor ama e tolera o seu oponente; portanto, você não deve menosprezá-lo ou tratá-lo com grosseria. O Senhor tolera igualmente a você e espera que demonstre ternura para com os outros, motivado pelo senso de perdão de que você mesmo tanto necessita.

Em breve, vocês se encontrarão no céu. Ali, ele lhe será mais querido do que o amigo mais íntimo que você tem agora neste mundo. Em seus pensamentos, antecipe aquele tempo. E, embora você julgue necessário opor-se aos erros dele, encare-o pessoalmente como um irmão, com quem você será feliz, em Cristo, para sempre.

Mas, se você o considera uma pessoa não-convertida, em um estado de inimizade contra Deus e a graça dEle (esta é uma suposição que, sem boas evidências, você não deve se mostrar disposto a admitir), ele é mais um objeto de sua compaixão do que de sua ira.

Infelizmente, “ele não sabe o que está fazendo”. Mas você sabe quem lhe tornou diferente. Se Deus, em seu soberano beneplácito, assim o tivesse determinado, você poderia ser o que o seu adversário é agora; e ele, em seu lugar, estaria defendendo o evangelho. Por natureza, vocês eram igualmente cegos. Se você atentar a este fato, não censurará nem odiará o seu oponente, porque o Senhor se agradou em abrir os seus olhos e não os olhos dele.

De todas as pessoas que se envolvem em controvérsia, nós, que somos chamados calvinistas, estamos especialmente obrigados, por nossos princípios, a exercer gentileza e moderação. Se aqueles que diferem de nós têm capacidade de mudar a si mesmos, se podem abrir seus próprios olhos e amolecer seus próprios corações, então, nós podemos, com menor incoerência, ser ofendidos pela obstinação deles. Contudo, se cremos no exato oposto disso, nosso dever é não contender, mas instruir, com mansidão, aqueles que se opõem, “na expectativa de que Deus lhes conceda… o arrependimento para conhecerem plenamente a verdade” (2 Tm 2.25).

Se você escrever com o desejo de ser um instrumento de corrigir erros, é claro que terá cautela para não ser uma pedra de tropeço no caminho dos cegos, nem utilizar expressões que podem incendiar as paixões deles, confirmá-los em seus preconceitos e, por meio disso, tornar mais impraticável (do ponto de vista humano) o convencimento deles.

[cont.]

Por John Newton.

Tradução: editorafiel.com.br

Revisão: voltemosaoevangelho.com