Um blog do Ministério Fiel
Gravidez e a confusão sobre liberdade e intrusão
Confusão sobre Intrusão
Das inúmeras mudanças criadas pela segunda onda do feminismo, a mais notória seria o compromisso inabalável do movimento com o aborto. É aí onde a segunda onda do feminismo mais se separa da primeira, visto que as ativistas pelos direitos das mulheres no século XIX eram geralmente pró-vida. Elizabeth Cady Stanton, por exemplo, chamava o aborto de infanticídio e escreveu: “Quando consideramos que as mulheres são tratadas como propriedade, é degradante para elas que nós tratemos nossas crianças como propriedade da qual podemos dispor como quisermos”.
Aqueles que cresceram à sombra do caso Roe vs. Wade podem se surpreender ao descobrir que o aborto era até mesmo uma preocupação para Stanton e outras mulheres no século XIX. De acordo com Marvin Olasky, autor de Abortion Rites [Rituais do Aborto], o aborto se faz presente nos Estados Unidos desde pelo menos 1629. Apesar de ser ilegal, as taxas de aborto acabaram crescendo em meados do século XIX, alcançando — em termos de proporção populacional — as taxas de hoje. Olasky diz que três fatores foram responsáveis por essa tendência em meados dos anos 1800: o advento da Revolução Industrial, o anonimato nas novas cidades que provocou o aumento da prostituição e a popularidade de “um importante movimento de Nova Era no século XIX (então chamado de “espiritismo”). “Uma grande diferença entre hoje e antes é que a maioria dos abortos do meado do século XIX ocorreu entre prostitutas, provavelmente numa média de quatro por ano”, Olasky escreve. Ele concorda com outros historiadores que dizem que os remédios e procedimentos usados para esses abortos podem ter sido a causa primária para a expectativa de vida reduzida delas.
Esse movimento espírita, que teve seu auge em 1860, predisse o movimento do amor livre do fim dos anos 1960 mais de um século antes. Baseado na crença de que os vivos podem se comunicar, e se comunicam, com os espíritos dos mortos através de sessões e médiuns, o espiritismo também antecipou o lema “questione a autoridade” dos anos 1960 e 1970. Assim, seus praticantes rejeitavam as convenções de sua época, incluindo a monogamia e a maternidade.
De acordo com B. F. Hatch, um médico que escreveu sobre o espiritismo em 1859: “as mulheres que abandonaram seus esposos […] e que estão vivendo em adultério com seus amantes, realizam aborto, e se erguem de sua culpa e ficam de pé diante de grandes audiências como médiuns de anjos”. Ele escreveu que os espíritas daquele tempo “falavam orgulhosamente de sua liberdade do que chamavam de convencionalismo social e das superstições do cristianismo”. Tendo sido proeminente nesse movimento até que começou a testemunhar seus resultados, Hatch escreveu sobre as crenças intensamente egoístas do movimento, dizendo que os espíritas “ardentemente contendem que nenhuma autoridade externa e nenhum código de leis humanas podem justamente limitar suas afeições, nem interferir em sua liberdade de seguir o impulso de suas afinidades pessoais”. Um encontro de espíritas no estado de Vermont aprovou um conjunto de resoluções que afirmavam que “a autoridade de cada alma individual é absoluta e final na decisão de questões em relação ao que é verdadeiro ou falso em princípio, e certo ou errado na prática”; e que “o direito mais sagrado e importante da mulher é seu direito de decidir quão frequentemente e sob quais circunstâncias ela assumirá as responsabilidades e se sujeitará aos cuidados e sofrimentos da maternidade […]”.
Avance um século e você encontra o mesmo pensamento. O grupo Planned Parenthood, de Sanger, estava trabalhando ativamente nos anos 1950 e após para a descriminalização do aborto. Grupos pró-aborto começaram a ganhar terreno legal no fim dos anos 1960 e no início dos anos 1970. Em 1969, Betty Friedan e Dr. Bernard Nathanson estavam entre os fundadores da National Association for Repeal of Abortion Laws [Associação Nacional para Revogação de Leis do Aborto], (que mais tarde se tornou a National Abortion Rights Action League [Liga Nacional de Ação dos Direitos ao Aborto] e que agora é conhecida como NARAL Pro-Choice America [NARAL Pró-Escolha America]). Em abril de 1970, um quinto dos estados norte-americanos tinham aprovado medidas permitindo o aborto, mas somente em condições extremas. Leis mais liberais existiam nos estados de Nova Iorque, Califórnia, Havaí e Alasca. Um artigo resume a história do caso Roe vs. Wade desta forma:
Em 1973, a Suprema Corte dos Estados Unidos entregou sua decisão no caso Roe vs. Wade. A mulher no centro do processo, Norma McCorvey (“Jane Roe”), tinha desafiado as leis de aborto do Texas em 1969. Naquele tempo, ela estava grávida e queria um aborto — o que era ilegal. De acordo com McCorvey, oportunistas políticas se apegaram ao caso dela numa tentativa de avançar seu objetivo pró-aborto.
A decisão da corte em favor de Roe se apoiava em duas premissas: o “direito à privacidade” da mulher e a crença de que o início da vida não poderia ser apontado com precisão. O Ministro Harry Blackmun escreveu sobre a decisão da maioria no caso Roe v. Wade, afirmando: “Não precisamos resolver a difícil questão de quando a vida começa. Quando aqueles treinados nas respectivas disciplinas da medicina, filosofia e teologia são incapazes de chegar a qualquer consenso, o judiciário, a esta altura do desenvolvimento do conhecimento humano, não está numa posição para especular sobre a resposta”.
As palavras do Ministro Blackmun foram o mantra da posição pró-aborto daquele tempo. No entanto, com o lançamento comercial da máquina de ultrassom em 1979, aquele argumento não era mais praticável. De fato, isso levou o Dr. Bernard Nathanson, um dos fundadores da NARAL e ex-diretor da maior clínica de aborto de Nova Iorque, a retratar-se de sua posição no fim dos anos 1970 e se tornar um oponente declarado do aborto. Nathanson afirma que ele foi responsável por mais de 75.000 abortos em sua carreira, incluindo de seu próprio filho. Ele é provavelmente mais conhecido pelo documentário The Silent Scream [O Grito Silencioso], de 1984, o qual usou a tecnologia de ultrassom para revelar o que acontece durante um aborto.
Visto que os avanços científicos empurraram a “difícil questão de quando a vida começa”, do Ministro Blackmun, para um ponto de referência além da “viabilidade” do feto, as ativistas feministas somente tinham o “direito à privacidade” da mulher para promover o pensamento pró-aborto. “Mantenha suas leis longe do meu corpo” se tornou um lema feminista popular. A partir daí, a ideologia feminista desenvolveu ideias bizarras, tal como o argumento feito em 1996 por Eileen McDonagh de que precisamos mudar nossa atenção “do que o ovo fertilizado ‘é’, à medida que ele se desenvolve em um feto e finalmente em um bebê, para o que o ovo fertilizado ‘faz’, pois causa a gravidez ao se implantar no corpo de uma mulher e mantendo aquela implantação por nove meses”. Como ela escreve:
O feto é a causa direta da gravidez, e se ele torna uma mulher grávida sem seu consentimento, ele viola severamente a integridade e a liberdade de seu corpo. Nossa cultura, nossas cortes e o Congresso, todos ignoraram o feto como o agente da gravidez, com uma exceção importante: quando o feto ameaça a vida da mulher […]. Mesmo numa gravidez normal em termos médicos, o feto se introduz massivamente no corpo de uma mulher e a desapropria de sua liberdade. Se uma mulher não consente com essa transformação e esse uso de seu corpo, a imposição do feto constitui dano suficiente para justificar o uso de força mortal para impedi-la. Embora não seja comum pensar na gravidez como um dano, é exatamente assim que a lei já a define quando ela é imposta a uma mulher sem seu consentimento. Por exemplo, quando os homens ou médicos expõem as mulheres ao risco de gravidez por meio de estupro ou esterilização incompetente, e uma gravidez se segue, a lei claramente reconhece que as mulheres foram seriamente prejudicadas. Esse livro expande o conceito de uma gravidez indesejada para incluir o que o óvulo fertilizado faz a uma mulher quando a torna grávida sem seu consentimento. Ele é a única entidade que pode tornar uma mulher grávida, e quando ele assim o faz sem seu consentimento, ele impõe os sérios danos de uma gravidez indesejada mesmo se a gravidez em questão for medicamente normal.
A “lógica” é espantosa, não é?! McDonagh escreve como se o óvulo fertilizado fosse capaz de uma ação independente e ignora o fato de que a atividade sexual das mulheres (geralmente voluntária) é o que contribui para a gravidez.