Cinema e pregação

Homo Narrativus

Contar histórias e estórias é algo demasiadamente humano. Somos assim não por conta de um construto social. As narrativas são parte de quem somos por refletir quem nos criou. Os enredos que criamos integram a História maior. A meta narrativa da Criação – Queda – Redenção. Na História das histórias escrita por Deus, somos personagens que executam parte do enredo que já havia sido decretado na eternidade, que tem como estrela o Verbo que se fez carne e que tem seu ápice, isto é, o ponto alto da narrativa, o ato vicário do Justo que se colocou no lugar de pecadores.

Nossos escritos, toda nossa herança literária, está conectada com a obra maior. Podemos ver pecado e beleza naquilo que nos é narrado em verso e em prosa. Podemos ver inquietações da alma humana, podemos ver redenção e graça. E ler/ouvir as narrativas que estão aí no mundo que surgiu da Palavra Eterna – e que é sustentado por Ela – deveria nos levar a observar com mais cuidado e afeição o mais belo dos roteiros: A história do Deus que redime os pecadores e os convida para com eles ter amizade.

E por falar em contar histórias, temos o cinema – para além da literatura. Hoje podemos ler uma boa narrativa ou podemos vê-la em ação através de uma telona ou de uma telinha. Cinema é mais uma forma que o homo narrativus encontrou para poder dramatizar a vida. E é desse ponto, do cinema, que quero tratar de um outro assunto: Pregação.

Um bom filme para uma boa aplicação

Há uma frase que diz que se o pregador não aplica o seu sermão, na verdade ele não pregou. E, de fato, aplicar nem sempre é tarefa fácil, principalmente quando o pregador está deslocado do contexto de seus ouvintes. Há também o problema de uma deslocação cultural, quando o pregador não está muito ciente do que têm moldado seus ouvintes durante todo o momento em que eles estão vivendo suas vidas comuns em seus afazeres comuns. É aí que o cinema entra como um aliado do pregador. A dita sétima arte é – talvez – o elemento cultural que mais sirva para fazer aplicações de forma ilustrativa usando alguma boa narrativa das telonas. Por isso, o simples fatos de ver filmes contribui para a elaboração de um sermão. Obviamente, não digo que isto precisa ser feito em todas as pregações, mas é bom intercalar uma narrativa cinematográfica de vez em quando.

Quando estou pregando gosto de usar alguns trechos de livros para fazer aplicação de um ponto do sermão. As Crônicas de Nárnia tem o título de obra mais citada, mas já fui de O Peregrino ao Pequeno Príncipe. Só que, infelizmente, o nosso país é composto de gente que não tem o hábito de ler uma boa literatura ficcional. Logo, mesmo que citar livros já seja um incentivo para a leitura, citar trechos de filmes acaba sendo um pouco mais positivo se o que se deseja na aplicação é fazer a ponte entre o conteúdo repassado com uma boa história já conhecida pelos ouvintes. Afinal, se os aparelhos de vídeo cassete já haviam popularizado o ato de assistir filmes em casa, na era do serviço de streaming, não apenas em casa, mas até no ônibus, indo e voltando do trabalho dá para assistir filmes através do smartphone.

Recentemente fiz uma enquete em meu Facebook perguntando sobre três bons filmes feitos de 2001 até o presente. Fiz o recorte intencional por serem filmes produzidos e consumidos para a geração atual. Embora bons filmes tendam a ser atemporais, por suas narrativas transversais, a grande maioria deles são produtos de uma época e falam muito para uma geração específica. Há bons filmes que podem ser usados para aplicarmos o que queremos transmitir em nossos púlpitos. Portanto, que o pregador assista aos filmes fazendo deles uma experiência vicária, utilizando as narrativas de uma maneira que seus ouvintes possam assimilar bem o conteúdo da pregação quando a narrativa do filme espelhar uma aplicabilidade do conteúdo bíblico. Filmes que gosto e que podem ajudar nesta difícil tarefa são: Até o Último Homem, A Mula, O Regresso, Lion – Jornada Para Casa, Homem Irracional, Sniper Americano, Sangue Negro, O Homem Duplicado e Coringa.

Só mais uma coisa

Não poderia deixar de mencionar o fato de que embora o cinema tenha um papel importante na formação do imaginário e como uma boa opção de entretenimento, precisamos saber dosar o nosso tempo diante da tela. Hoje, para além dos filmes, existem as séries e o atual fenômeno de maratonar uma temporada completa ou mais – fazendo com que pessoas passem um dia inteiro grudadas no sofá ou na cama, assistindo aquilo que lhes apetece.

Precisamos ter cuidado para não deixar o entretenimento dominar nosso cotidiano. Filmes e séries não podem nos tornar preguiçosos e não produtivos. A preguiça é pecaminosa. E o entretenimento pode se transformar em idolatria. Se por um lado temos um ótimo recurso para o ludismo e para auxiliar nossa concepção doutrinária – ligando uma cena com algum conceito bíblico, por outro lado temos um concorrente das atividades devocionais. Quando você diz não ter tempo para orar e ler a Bíblia, você já contabilizou o tempo que tem gastado com sua assinatura da Netflix ou do Prime?

Por: Thiago Oliveira. © Voltemos ao Evangelho. Website: voltemosaoevangelho.com. Todos os direitos reservados. Original: Cinema e pregação.