O Estado ateu que habita na cabeça da mídia

Extrema-direita húngara quer Brasil financiando cristãos no Oriente Médio”, “Itamaraty contraria Constituição e prega religião como política de Estado” – Basta o governo brasileiro decidir cooperar internacionalmente no auxílio ao combate à perseguição religiosa contra os cristãos, para que grande parte da mídia se comporte como se estivesse em um processo de convulsão. Claro, se a ação governamental fosse no sentido de combater à perseguição religiosa de qualquer outra confissão de fé (o que, frise-se deve fazer também) estaria tudo “mil maravilhas”, mas defender cristãos? De jeito nenhum!

Soma-se ao fato de que nossa geração é imagética e não aprecia ler textos grandes, provavelmente ficará indignada com a manchete, não lerá o teor da notícia, e sairá por aí a dizer que o governo brasileiro está montando as estacas para criar uma teocracia brasileira, como bom gado.

O fato é que você não precisa ser crente em Deus para concordar que a cooperação internacional é essencial para uma boa relação entre países de diferentes culturas. Também não precisa ser católico ou protestante, para perceber que existem problemas de alta complexidadee violações a dignidade da pessoa humana que afetam o nosso planeta. Será mesmo que só vamos processar questões internacionais quando se fala de “islamofobia”?

Assim como o Direito Religioso não existe apenas para proteger a Igreja Cristã, o combate à perseguição religiosa é um comprometimento que visa o livre exercício de qualquer religião, o cristianismo, por óbvio! Se, por muito tempo, o Governo Brasileiro foi silente quanto a série de atos que comprovam a existência de uma alta taxa de Cristofobia, não implica dizer que deverá permanecer para sempre na neglicência.

A fala de Fabio Mendes: “colocar a religião no processo de formulação de políticas no Brasil” é um reflexo do nosso modelo de laicidade, que chamamos de laicidade colaborativa: uma cooperação entre a ordem religiosa e a ordem secular. A mídia passa uma imagem monstruosa sobre essa cooperação, que na verdade sempre existiu em solo brasileiro, sendo entronizado em nosso texto constitucional, quando de sua promulgação, no dia 05 de outubro de 1988:

Do modelo de laicidade colaborativa decorre, também, a proteção ao fenômeno religioso, exatamente como no modelo brasileiro, onde a Constituição consagra, garante e protege o livre exercício de cultos religiosos, os locais em que ocorrem e suas liturgias (art. 5º, VI), a assistência religiosa nas entidades civis e militares de internação coletiva (art. 5º, VII), objeção de consciência (art. 5º, VIII e art. 143, § 1º) e a previsão de ensino religioso, inclusive nas escolas públicas de Ensino Fundamental (art. 210, § 1º).[1]

Para que fique bem claro: a colaboração entre a ordem religiosa e a ordem secular (governo) não é sinônimo de teocracia. Teocracia é um sistema de interação da fé com a política que possuí o mesmo líder em ambas as esferas, algumas teocracias se caracterizam pelo domínio da esfera política, como o Reino Unido, outras se caracterizem pelo domínio da esfera religiosa, como o Afeganistão, mas, em qualquer hipótese, ambos os domínios possuem o mesmo líder. Ou seja, muito longe de qualquer coisa vivenciada na República brasileira desde 1889 até os dias de hoje. Ainda, existe outra forma de interação, na qual a política se compromete com apenas uma confissão de fé, oficializando-a, como ocorreu no Brasil Império, parece-nos, também, que estamos muito longe disto. Na verdade, não vimos ninguém falar algo nesse sentido, mas apenas, propostas de assistência à países que sofrem perseguição religiosa e a possibilidade de influência religiosa na formação de políticas públicas, que é algo que já acontece no Brasil.

No mesmo sentido, a verdadeira Igreja anda conforme uma proposta confessional para suplantar desigualdades, conforme preleciona o Rev. Dr. Davi Charles Gomes:

A Igreja (ou religião): milita para que seus valores transcendentes informem e formem as outras esferas, trazendo os valores do Reino de Deus para as esferas terrenas. Isso é feito pela pregação de sua mensagem de reconciliação com Deus, mas implica a mensagem de reconciliação terrena. Cabe à Igreja o papel profético de anunciar a justiça e a graça divina, de propor caminhos nos quais a lei maior; a lei do amor; cumpra seu efeito transcendental na sociedade. Seu papel é norteador e ela nunca deve assumir jurisdição sobre aquilo que pertence às outras esferas, embaraçando seus mandatos ou pervertendo seus propósitos.[2]

A assistência religiosa, inclusive, está prevista na Carta Maior, em seu artigo 5º, inciso VII: “é assegurada, nos termos da lei, a prestação de assistência religiosa nas entidades civis e militares de internação coletiva”. Não ficou claro se o embaixador Fabio Mendes Marzano tratou do evangelismo como uma imposição, mas como direito ao proselitismo religioso, que é o ato de pregar o evangelho na perspectiva cristã, garantia já prevista em nossa Constituição. Enfim, na mídia o único modelo que existe é o ateu, ou, quem sabe, aquele modelo que seja totalmente contra o cristianismo, em especial.


[1] VIEIRA, Thiago Rafael e REGINA, Jean Marques. Direito Religioso – questões práticas e teóricas. 2ª Edição. Porto Alegre: Concórdia, 2019. p. 137.

[2] GOMES, Davi Charles. Uma visão confessional do estado na luta contra dois tipos de idolatria. Carta de Princípios Mackenzie 2019. p. 12.

Por: TR Vieira e Jean Regina. © Voltemos ao Evangelho. Website: voltemosaoevangelho.com. Todos os direitos reservados. Original: O Estado ateu que habita na cabeça da mídia.