O fator “bacia hidrográfica” em cada geração

O fator bacia hidrográfica em cada geração é a autoridade efetiva das Escrituras e as realidades que ela revela. Por que eu não digo apenas: “O fator bacia hidrográfica em cada geração é a autoridade das Escrituras”? Eu admito que o texto é um pouco desajeitado. Até mesmo a expressão bacia hidrográfica precisa de esclarecimento. O que quero dizer é isto: em uma cordilheira, há uma crista da qual toda a chuva, ou toda a neve derretida, flui irreversivelmente para um oceano ou outro. Enquanto a água flui, ela pode encontrar muita turbulência e dar muitas voltas, mas o oceano para o qual ela está fluindo já foi determinado a montante – na bacia hidrográfica.

Um fator bacia hidrográfica também se comportam assim. Quando a mente humana e o coração abordam um fator bacia hidrográfica, a direção da mente e do coração, nessa questão, se coloca em um percurso de pensar e sentir que pode levar a muita turbulência e dar muitas voltas, mas sempre conduz em direção a um oceano ou outro.

Nem toda questão contém um fator bacia hidrográfica. As pessoas podem ter posições diferentes em algumas questões, e não se verem afastando-se cada vez mais uma da outra em direção a oceanos diferentes. Mas uma questão que contenha um fator bacia hidrográfica é tão crucial, tão formativa e tão amplamente influente que, mesmo quando o terreno circundante parece semelhante, os rios podem fluir separadamente.

“Autoridade das Escrituras”

O próximo termo que precisa ser esclarecido é “autoridade das Escrituras”. Aqui no Desiring God, descrevemos a autoridade das Escrituras em nossa Afirmação da Fé:

As intenções de Deus, reveladas na Bíblia, são a autoridade suprema e final para testar todas as alegações sobre o que é verdadeiro e o que é certo. Em assuntos não abordados pela Bíblia, o que é certo e verdadeiro é avaliado por critérios consistentes com os ensinamentos das Escrituras.

O fundamento dessa convicção é o seguinte:

A Bíblia, composta pelos sessenta e seis livros do Antigo e Novo Testamentos, é a infalível Palavra de Deus, verbalmente inspirada por Deus e sem erro nos manuscritos originais.

Simplificando, o fato de que as Escrituras são a Palavra de Deus significa que tudo o que ela ensina é verdadeiro, e tudo o que ela requer deve ser obedecido. Ela tem autoridade final para o que é real e o que é certo. Cremos que é isso que a Bíblia afirma por si mesma:

“Toda a Escritura é inspirada por Deus” (2Tm 3.16);

“Porque nunca jamais qualquer profecia foi dada por vontade humana; entretanto, homens [santos] falaram da parte de Deus, movidos pelo Espírito Santo.” (2Pe 1.21);

“Disto também falamos, não em palavras ensinadas pela sabedoria humana, mas ensinadas pelo Espírito,” (1Co 2.13);

“Passará o céu e a terra, porém as minhas palavras não passarão.” (Mt 24.35);

“Toda palavra de Deus é pura;” (Pv 30.5);

“a Escritura não pode falhar,” (Jo 10.35).

Acreditamos que a evidência da verdade dessas afirmações é clara o suficiente para as pessoas comuns entenderem – se Deus conceder a elas enxergarem o que realmente está lá. Nossas explicações e argumentos mais completos para essa posição podem ser encontrados em A Peculiar Glory: How the Christian Scriptures Reveal Their Complete Truthfulness.

“Autoridade Efetiva”

Por que eu não digo apenas: “O fator bacia hidrográfica em cada geração é a autoridade das Escrituras”? Por que adicionar a palavra efetiva? “O fator bacia hidrográfica em cada geração é a autoridade efetiva das Escrituras e as realidades que ela revela”.

Porque a autoridade das Escrituras não funciona como uma bacia hidrográfica, a menos que se torne efetiva na criação de um coração de bom grado e uma mente de percepção transformada. É possível dizer que a Bíblia tem autoridade (e assinar uma profissão de fé), e ainda assim não ver como real o que a Bíblia diz que é real, e não sentir como precioso o que a Bíblia diz que é bonito. Até que consideremos real o que a Bíblia considera real e até que nos regozijemos com o que a Bíblia se alegra, sua autoridade pode ser afirmada, mas não ser efetiva – e não ser uma bacia hidrográfica.

Por exemplo, a Bíblia diz dos cristãos: “morrestes” (Cl 3.3). E: “fostes ressuscitados” (Cl 3.1). E, “vossa vida está oculta juntamente com Cristo, em Deus.” (Cl 3.3). Essas são realidades. Mas milhares de cristãos não têm, em suas mentes, nada que corresponda a essas realidades. Se você lhes pedisse para apontar para as realidades de suas vidas que correspondessem a essas coisas, eles não seriam capazes. Portanto, esses ensinamentos bíblicos não têm, efetivamente, autoridade em suas mentes.

O mesmo pode ser visto em relação ao que a Bíblia diz ser valioso ou bonito. Filipenses 3.8 e Mateus 13.44 ensinam que Jesus é mais valioso do que tudo o que possuímos ou poderíamos possuir neste mundo. Mas milhares de cristãos professos valorizam mais outras coisas do que Cristo. Eles raramente falam de Cristo como algo agradável. Porém, filmes, mídias sociais, esportes e política enchem seus pensamentos e suas conversas animadas.

Isso ocorre porque a revelação da suprema beleza e valor de Jesus não é, para eles, efetivamente autoritária. A autoridade das Escrituras é afirmada da mesma forma que o papel de embrulho é afirmado: “Adoro esse presente. É lindo” – o que significa que o papel de embrulho é lindo, embora o conteúdo seja desconhecido, desagradável ou simplesmente insignificante.

Revelação em Momentos Críticos

Onde não há controvérsia pessoal ou cultural com a Bíblia sobre o que é real e o que é bom, essa afirmação não efetiva da autoridade bíblica passa facilmente despercebida. Eles dizem que a Bíblia tem autoridade. Por um tempo as formas externas da cultura e ética pessoal estão de acordo com os comportamentos bíblicos externos. Então, tudo corre como se a Bíblia realmente tivesse autoridade efetiva em suas vidas. Mas, na realidade, não é isso que acontece.

Então, chega um momento culturalmente crítico – uma controvérsia. Os homossexuais praticantes estão pecando? Se continuarem pecando sem arrependimento, entrarão no reino dos céus? (1Co 6.9-10). Se a cultura cria algo chamado “casamento” para pessoas do mesmo sexo, isso é realmente casamento? (Ef 5.31-32). A relação entre pessoas do mesmo sexo é “natural”? Ou é “contrária à natureza”? (Rm 1.26-27). O casamento entre homem e mulher é o único casamento bonito – o único casamento que mostra Cristo e a igreja?

De repente, um momento culturalmente crítico (que pode ser muito pessoal) revela se a afirmação da autoridade bíblica de uma pessoa é efetiva ou não. A autoridade da Bíblia sempre foi efetiva na criação de um coração de bom grado e uma mente de percepção transformada? Nossa afirmação de autoridade foi eficaz na transformação do que vemos como real e certo? Ou a autoridade bíblica tem sido mero papel de embrulho para ensinamentos dos quais não gostamos?

“Realidades Reveladas”

Em resumo, então, “O fator bacia hidrográfica em cada geração é a autoridade efetiva das Escrituras”. Mas não foi só isso que escrevi na primeira frase deste artigo. Eu adicionei uma frase. Eu disse: “O fator bacia hidrográfica em cada geração é a autoridade efetiva das Escrituras e as realidades que ela revela”. Já vimos o suficiente para entender essa adição.

O que quero é chamar a atenção para o fato de que a autoridade por si só não produz os efeitos dos quais falamos. São as realidades, que os ensinamentos, que tem autoridade, revelam, que transformam nossa percepção do que é real e nosso prazer com o que é belo. O Espírito de Deus faz com que o real seja visto como real e o bonito seja visto como bonito. A autoridade pode prender nossa atenção. Mas isso não pode mudar nossos corações.

Os ensinamentos das Escrituras e as realidades que eles revelam não se tornam reais e bonitos para nós apenas porque são afirmados por uma autoridade. Não é assim que nossas mentes ou nossos corações funcionam. Você pode fazer uma criança comer verduras porque você tem autoridade. Mas você não pode fazê-la gostar delas.

Não é isso que a autoridade pode fazer. Ela pode manter a criança à mesa. Pode até impor sabores. Mas não pode criar gostos.

A mera autoridade pode afirmar a realidade. Mas não pode fazer você enxergar a realidade. Então você pode afirmar a autoridade bíblica porque é isso que você deve fazer; e, no entanto, você pode não ter uma mente e um coração transformados a tal ponto que que possam ver como real o que a Bíblia apresenta como real e abraçar de bom grado o que a Bíblia apresenta como bonito.

Dádiva Divina

Essa transformação da mente e do coração acontece cedendo não apenas à autoridade, mas pelo dom divino da visão e do sabor. Para ver a realidade bíblica como verdadeira e real, precisamos de novos olhos. E para saborear o que a Bíblia revela como linda e doce, precisamos de novos gostos.

Por exemplo, a Bíblia ensina que é bonito que as esposas se submetam aos maridos como a igreja está sujeita a Cristo (Ef 5.24), e que é bonito que os maridos amem suas esposas como Cristo amou a igreja (Ef 5.25). Isso é realidade. Mas se sua mente não pode vê-la e seu coração não pode amá-la, nenhuma autoridade pode torná-la real e bonita para você. A autoridade não funciona assim.

Você pode afirmar a autoridade. Mas isso não é eficaz. Torna-se eficaz quando, pelo Espírito, as próprias realidades tornam-se, para você, o que realmente são. Você vê o real como real. E você sente o belo como belo. E, devemos acrescentar, você sente o horrível como horrível.

É essencial afirmar a autoridade das Escrituras. Mas isso não é suficiente. O Espírito de Deus, ao revelar a verdade e a beleza das realidades bíblicas, cria uma nova visão e um novo gosto. Vemos e saboreamos o que a Bíblia apresenta como real e bonito. O Espírito faz isso através das palavras das Escrituras. Quando isso acontece, a autoridade se torna eficaz – distribuindo-se, geração após geração, pela bacia hidrográfica da palavra de Deus.

Por: John Piper. © Desiring God Foundation. Website: desiringGod.org. Traduzido com permissão. Fonte: The Watershed Issue in Every Generation.

Original: O fator “bacia hidrográfica” em cada geração. © Ministério Fiel. Website: MinisterioFiel.com.br. Todos os direitos reservados. Tradução: Paulo Reiss Junior. Revisão: Filipe Castelo Branco.