Sobre liberais, parasitas e neoliberais

liberalismo teológico nasceu, alimentou-se e viveu como um parasita, usando o corpo, as energias, os recursos e a vida das organizações eclesiásticas fundadas e financiadas por conservadores. Os primeiros liberais eram ministros de denominações conservadoras – embora já minadas pelas idéias do Unitarismo e do Iluminismo – de onde tiraram seu sustento e onde ganharam respeitabilidade. Mesmo que tenham mudado suas crenças, não largaram o corpo de onde se alimentavam. Pois não teriam para onde ir.

O liberalismo nunca plantou igrejas, nunca aumentou número de membros e nem a receita financeira das igrejas. Só conseguiu reproduzir outros liberais, os quais por sua vez precisavam também sobreviver. O liberalismo teológico sempre teve que achar um hospedeiro que pudesse sugar até que o mesmo morresse, drenado. Hoje assistimos aos estertores mortais das últimas denominações históricas na Europa e nos Estados Unidos que um dia o abrigaram.

O liberalismo sobreviveu à custa do esforço missionário, do zelo expansionista e do sacrifício financeiro dos cristãos bíblicos, que fundaram igrejas, criaram organizações, ajuntaram fundos missionários, abriram escolas teológicas, todas elas ocupadas depois pelos liberais. Sei que isso não ocorreu do dia para a noite e que houve um processo durante o qual as doutrinas basilares do Cristianismo histórico vinham sendo erodidas lentamente nessas denominações. De qualquer forma, o liberalismo plenamente desenvolvido não fundou novas denominações, não abriu novas igrejas, não inaugurou novos campos missionários e nem abriu novas escolas. Não conheço nenhum curso de teologia hoje nos Estados Unidos e na Europa que seja liberal e que funcione numa universidade que tenha sido criada por liberais. Harvard, Union, Princeton, Yale, Amsterdã, Oxford… todas foram criadas por conservadores das mais diferentes linhas. No Brasil, as denominações que nasceram como fruto de dissidências liberais de corpos conservadores são praticamente inexpressivas a não ser quando ganham mídia por algum escândalo.

O caráter parasitário do liberalismo teológico se deveu ao fato de que os liberais não acreditavam em evangelismo e missões. Acreditavam em fazer obra social, em ensinar as pessoas a cultivar as terras, a se organizar politicamente contra a opressão, a abrir poços, a organizar sociedades de tecelões, etc. Embora essas coisas sejam louváveis, não produzem novas igrejas, não aumentam o numero de crentes comprometidos e nem trazem retorno financeiro. Os liberais sempre precisaram de hospedeiros para sobreviver enquanto levavam avante a sua agenda. Sugaram a herança organizacional eclesiástico-financeira de Calvino, Lutero, Wesley e dos puritanos.

O liberalismo teológico faleceu, historicamente, com o advento da pós-modernidade e pela evidente falta de resultados acadêmicos e eclesiásticos. Mas, como um vírus mutante, transfigurou-se no neoliberalismo. Embora diferente em muitos aspectos do antigo liberalismo, o neoliberalismo conserva o caráter parasitário. Pois neoliberais não sabem direito em que acreditam, duvidam da autoridade da Bíblia, estão meio perdidos sem referencial histórico e teológico. Daí, pastores neoliberais dificilmente conseguem fundar novas igrejas, trazer pecadores a Jesus Cristo, aumentar o número de membros, abrir frentes missionárias e melhorar a arrecadação das igrejas. Precisam de hospedeiros, de corpos eclesiásticos de onde tirar o sustento, enquanto ficam refletindo e tentando descobrir em que acreditam, afinal.

Um dos segredos da capacidade de sobrevivência do parasita é o mimetismo. Ele consegue imitar o ambiente onde se encontra para poder passar despercebido. Neoliberais podem virar fundamentalistas, conservadores, reformados, pentecostais e até liberais, dependendo da necessidade do momento. Talvez seja isso que torne os neoliberais mais perigosos que os antigos liberais, como já sugeri em outro post.

Devido à dificuldade em se extirpar parasitas com poderes de misturar-se ao ambiente, pouca esperança resta a não ser esperar a morte do hospedeiro, que representará também a morte do parasita, embora nem sempre. Pastores neoliberais pulam de igreja local para igreja local, deixando atrás de si um histórico de comunidades drenadas, confusas e cicatrizadas.

Sei que neoliberais não são o único tipo de parasita no Corpo. Pastores reformados ineptos podem ter o mesmo efeito prático. E sei que pastores reformados no Brasil ainda têm um longo caminho pela frente até conseguirem colocar em prática a visão calvinista de missões. Contudo, pela extraordinária capacidade de se transformarem no que quiserem conforme a situação requeira, parasitas neoliberais são os mais difíceis de serem identificados e tratados.


Texto publicado originalmente em O Tempora, O Mores, em 2006.