Consolo a uma gestante

Deus está trabalhando através de você e apesar de você

O choro veio de repente. Enquanto conversávamos sobre nossos planos futuros, meus olhos se encheram de lágrimas, aquelas emoções acumuladas ao longo dos meses transbordaram inesperadamente. Sem compreender muito bem o que se passava, meu marido se achegou e me abraçou, chorei ainda mais, ele perguntou a razão do meu choro e aguardou pacientemente pela minha resposta.

– Me sinto inútil – finalmente desabafei.

Só Deus sabe o quão doloroso foi, para o meu ego, confessar isso. Me sinto inútil. Desde o início da minha gestação este sentimento vinha sendo uma companhia silenciosa em meu coração e, embora eu já soubesse disso, me doeu confessá-lo, pois, ao fazer isso, eu assumi minha própria fraqueza.

Poder gerar uma criança em meu ventre, e ser o seu lar tem sido uma das maiores experiências e bênçãos que o Senhor me concedeu nesta vida, constantemente me assombro tentando compreender esse caminho divinamente misterioso (Ec 11.5). Contudo, apesar de saber o quão maravilhoso e glorioso é esse propósito, confesso que compreender a vontade de Deus para mim nesse momento particular de minha vida não foi tão simples.

Nos últimos anos eu me acostumei a um ritmo de vida no qual estou sempre fazendo muitas coisas; ser produtiva, em casa e no trabalho, servir as pessoas ao meu redor, escrever, ler, ensinar, e estar sempre disponível quando as pessoas precisam, são coisas que me trazem um enorme senso de realização e propósito. De repente, com o início da gestação me deparei com uma nova realidade, uma realidade na qual até mesmo guardar as compras do supermercado havia se tornado um desafio para mim. Eu não tinha forças para fazer quase nada, mal conseguia cozinhar e manter a casa minimamente limpa. Era frustrante ter que escolher entre uma atividade e outra; um golpe e tanto para as minhas expectativas de dona de casa. 

Não bastassem as limitações físicas, também me deparei com as limitações intelectuais; foram meses de frustração por não poder ler e escrever como de costume, cada vez que me forçava a seguir o mesmo ritmo, me sentia ainda mais incapaz. A frustração por não poder ler, escrever e produzir o tanto quanto gostaria ou deveria – simplesmente porque minha mente não conseguia produzir tanto quanto antes – era constante. Parecia que eu não estava fazendo absolutamente nada, que minha vida estava parada, enquanto o restante do mundo girava em ritmo acelerado. Foi assim, que o sentimento de inutilidade foi crescendo e ganhando terreno em meu coração, e me vi chorando copiosamente nos braços do meu marido naquela noite.

Após ouvir todo o meu lamento, ele pacientemente respondeu:

– Meu bem, você está gerando uma criança no seu ventre. Como isso pode ser insignificante? Como você pode concluir que não está fazendo nada? Seu corpo está mais cansado, é óbvio, afinal, ele está trabalhando como nunca em prol de outra vida além da sua. Você está ocupada fazendo a coisa mais importante que você poderia estar fazendo nesse momento, algo que ninguém mais pode fazer por você: você está gerando uma vida! Isso não é e não te torna inútil. O mundo continuará girando sem o seu trabalho, livros continuarão sendo publicados sem sua leitura, textos continuarão sendo escritos sem sua contribuição. Embora cada uma dessas atividades seja importante, elas não são indispensáveis e você não é indispensável na realização delas. A casa pode ser limpa por outra pessoa, a comida pode ser preparada sem você, tudo em volta continuará acontecendo, não porque você não é importante, mas porque não é você quem sustenta o mundo ao seu redor. Mas, Deus confiou a você uma missão que somente você pode cumprir nesse momento, missão para a qual você é indispensável agora: ser mãe. Então, abrace essa missão com contentamento e alegria, não pensando naquilo que você está deixando de fazer, mas naquilo que você está fazendo. Essa é a sua tarefa mais importante nesse momento.

Essas palavras foram um consolo, e também um confronto ao meu coração. A partir de então, passei a refletir sobre como eu estava associando o meu senso de valor e utilidade a coisas mensuráveis. E cá estou, esse momento, enquanto aguardo a chegada do nosso primogênito, Deus tem me ensinado sobre como tendemos a medir nossa utilidade com base naquilo que podemos ver, com base em resultados mensuráveis. Poder observar e mensurar aquilo que estamos fazendo e ver os resultados disso nos traz a sensação de dever cumprido, um senso de satisfação e utilidade. Mas, e quando não conseguimos mensurar aquilo que estamos realizando? E quando não é possível ver ou medir os resultados daquilo que estamos realizando? Creio que este é um dos desafios da gestação, não há como mensurar o trabalho que está sendo realizado aqui dentro, não há como dar um check na lista de “tarefas gestacionais”.

As palavras do apóstolo Paulo ecoam em minha mente: “Portanto, meus amados irmãos, sede firmes e constantes, sempre abundantes na obra do Senhor, sabendo que o vosso trabalho não é vão no Senhor.” (1 Co 15.58). Saber que o nosso trabalho não é vão no Senhor é um lembrete de que mesmo que não consigamos medir ou ver o fruto do nosso trabalho, Deus o vê. O nosso trabalho não é em vão no Senhor pois, por mais simples que seja, ele está ecoando na eternidade. Essa é a realidade de todos aqueles que trabalham para o Reino.

De fato, esse versículo é consolador para todo o cristão, independentemente de sua realidade, ele oferece consolo tanto ao pastor que semanalmente se dedica à sua congregação, sem muitos frutos aparentes, quanto às mães que diariamente se dedicam à criação de seus filhos, sem muitos resultados visíveis, e, também, a nós, mães que estão gerando dia e noite; cujos corpos estão trabalhando ativamente no sustento de uma vida. Quão cansativo isso pode ser; nós não conseguimos mensurar os resultados. Ao chegar ao final do dia, não olhamos para dentro dos nossos úteros e vislumbramos tudo o que foi feito, mas podemos crer, pela fé, que a cada dia Deus está usando nossos corpos limitados para realizar o trabalho necessário para a manutenção da vida dos nossos bebês, estamos cooperando com a obra de Deus, ainda que não possamos ver, ainda que não pareça relevante. Deus está trabalhando através de nós, e apesar de nós para a sua glória. 

Descanse e encontre contentamento em Deus, independentemente daquilo que você consegue fazer. 

Permita-me deixar aqui também uma observação, de forma alguma, quero dizer que o fato de uma mulher estar gerando um filho em seu ventre significa que ela não possa ou deva fazer nenhuma outra coisa, ou que deva viver esta fase sem se responsabilizar por mais nada. Não, não é essa a intenção, mas, quero aplicar aqui o seguinte princípio bíblico: o que quer que você faça, faça conforme as tuas forças (Ec 9.10). 

Se você é uma gestante superprodutiva em diversos níveis, glorifique a Deus e faça conforme as tuas forças, com diligência e sabedoria, lembrando-se que sua maior prioridade, neste momento, é gerar e nutrir – e mudanças fazem parte do processo. Mas, se você é uma gestante que sente sua capacidade de trabalho completamente reduzida – e isso tem trazido um peso e tristeza ao seu coração – descanse no Senhor; saiba que você está fazendo algo importante para Deus. Fuja da comparação, olhe para Cristo e você encontrará satisfação e propósito. Nos dias em que puder fazer muitas coisas mensuráveis, glorifique a Deus, e nos dias em que não puder – nos dias em que se sentir cansada e indisposta, glorifique-o também, pois Ele é digno disso.

A graça vem dele, não de você.

Saiba que não está em você gerar e sustentar essa vida, portanto, não deixe que a maternidade alimente seu ego, te fazendo sentir-se uma mulher superpoderosa ou superior às outras. A maternidade é dom da graça, e essa graça vem do Senhor, e não de você. Cada limitação é uma oportunidade.

Celebre as pequenas vitórias. Depois de meses com muitos enjoos, lembro-me do dia em que, finalmente, consegui refogar o alho e a cebola sem enjoar. Foi uma grande vitória e eu celebrei com grande alegria. A gestação nos limita em vários sentidos, mas cada limitação é uma oportunidade de conhecermos mais a respeito do Deus que é ilimitado, em quem podemos descansar sem medo e reconhecer nossas limitações. Longe do discurso de supermães, ou de que podemos dar conta de tudo, a maternidade é, sem dúvida, uma escola que nos ensina o quão limitadas somos; tenho aprendido isso, mesmo antes de ter o nosso bebê em meus braços. Não poderemos ser tudo que nossos filhos precisam, mas Deus é e sempre será tudo o que eles necessitam. Quanto antes compreendermos isso, mais cedo reconheceremos nossas limitações e colocaremos nossas cargas maternais sobre aquele que pode todas as coisas.

Eu sou apenas uma mamãe de primeira viagem tateando nesse novo e vasto universo, mas gostaria de encorajar você, mãe com seu bebê no ventre ou nos braços: não se sinta inútil por não fazer tudo o que fazia. Nós não vamos dar conta de tudo, esqueça isso! Não coloque sobre seus ombros um fardo que Cristo não colocou, entenda o seu chamado, entenda o seu propósito e viva-o com contentamento e alegria. Lembre-se que, por mais que façamos tudo, sem Cristo, nada disso será o bastante; sem Cristo, somos servos totalmente inúteis, e nosso trabalho é inútil, mas nele, a menor das tarefas, seja dar um copo de água para saciar a sede de um necessitado, ou o alimento para o seu bebê, se torna algo de valor eterno e digno de recompensa.

Deus está trabalhando através de nós, e apesar de nós – há pleno consolo em sua obra.