Querido, hoje eu expulsei você de casa

Um breve crônica sobre uma luta constante da alma

É bem tarde da noite e, como sabe, eu não costumo ficar acordada até tarde, mas essa noite foi imprescindível contar a você o que estava passando nesses últimos tempos.

Eu passei por um período de aflições, poucas pessoas sabem como estive refém de suas estratégias malignas que me importunavam todos os dias, tanto que alguns desses dias eu me sentia tão oprimida que tive que tomar providências imediatas, fui procurar um médico. Não um médico qualquer já que algumas perturbações acontecem em lugares ocultos de nosso ser, lugares que nos escapam até do conhecimento.

Você já ouviu falar em médicos da alma? Ah, sim é uma especialidade pouco comentada, porém bastante pertinente nesses dias de solavancos na alma.

Quando o médico me atendeu ele enfiou um tubo imenso pela minha goela e colocou seus olhos lá na extremidade com uma luneta. Foi então que durante esse processo extravagante ele exclamou: — achei onde ele está escondido!

Aquilo me deu um imenso alívio. Pensei: “breve estarei livre desse tormento!”.

Mas não foi bem como imaginei. Quando o médico da alma enfiou um de seus braços pelo tubo para alcançar o mal, você já não estava lá, havia desaparecido!

Depois, investigando descobrimos que você tinha poder de se mover sorrateiramente de um esconderijo a outro, seus movimentos eram imperceptíveis, mas nós reconhecíamos a sua presença dentro de mim por causa de vários sintomas que me provocava. E ficamos tontos quando percebemos que você podia entrar e sair sem que percebêssemos a sua ousadia.

Algumas vezes você vinha até minha boca. Evocava seus superiores e provocava em mim uma incontrolável vontade de gritar, mas o seu poder era tão gigantesco que em vez de gritar eu ficava completamente paralisada, da cabeça aos pés, imóvel, assolada, envergonhada, entristecida.

O Querido estava lá, acampado em frente a minha biblioteca. Irredutível. Nem mesmo a minha Bíblia na nova tradução transformadora era possível de ser alcançada. A sua barraca foi armada na soleira da porta. Não foi possível chegar até o conhecimento, eu estava impedida. “Barrabás!” – pensei.

Aquele Querido variava sua estadia, ora dentro de mim, ora fora, mas independente disso, ele estava presente, notável senhor de meus dias, ele me tornava miserável.

Esgotou minhas forças com uma intensidade animal, feroz, irracional. Minha cabeça rodou, fiquei quase sem sentidos. Meus olhos tremiam. Cega, tonta e horrorizada. Nem gritei, grunhi um som estranho que ecoou da minha alma.

A vida foi sendo estagnada por aquele Querido. Perdi a autonomia. Meus pensamentos sempre atordoados pela presença dele. Pensei que minha vida não tinha resgate, que seria assim e assim e assim até o resto de minha existência. Vida acuada, sem viço, sem sentido, maltratada.

Enquanto eu estava assim cabisbaixa, um pensamento me ocorreu. Lembrei-me de uma antiga canção:

 

“Não temerei, não temerei, pois minha força está no Senhor”

 

Foi revigorante o tamborilar dessa canção em minha mente. Eu nem percebi que conforme eu cantarolava e cada palavra da canção ia fazendo sentido, ia sendo impressa em minha mente, você teve que fugir! Aha! Querido, você não suportava as palavras daquela canção, não suportava saber que através dela eu louvava o meu Deus. 

A vibração, o efeito da música foi derrotando seu poder. Um dia, feliz, eu percebi que você se enfraquecia com o cantarolar das canções. Mas o dia muito feliz foi aquele que te derrotei com a Espada! Para cada sussurro seu eu proclamava uma Verdade Absoluta! Ah, a Verdade Absoluta não deixa brechas para larápios da paz de espírito. 

Querido, você foi diminuindo e a Verdade Absoluta crescendo. Você se entrincheirou em locais escuros e pequenos de minha alma. Me dizia mentiras terríveis para que eu não louvasse em voz alta. Mas a Espada da Verdade já tinha lhe arrancado um olho, depois um braço, até que ela te decapitou! “Touché”

Querido Medo, prazer em te decapitar com a Espada da Verdade! Sei que seu fantasma ainda assombra a minha vida e a de muitas pessoas, mas você está derrotado. 

 

“Em me vindo o temor, hei de confiar em ti. Em Deus, cuja palavra eu exalto,

neste Deus ponho a minha confiança e nada temerei. Que me pode fazer um mortal?”

Salmo 56.3, 4

 

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Por: Renata Gandolfo. © Voltemos Ao Evangelho. Website: voltemosaoevangelho.com. Todos os direitos reservados. Revisor e Editor: Vinicius Lima.