Um blog do Ministério Fiel
Calçando os sapatos de salto de nossas mães
A beleza da jornada
Eu tinha por volta dos meus 30 anos quando conheci uma senhora em suas 75 primaveras. Seu nome era Devi, sua pele era enrugada, seus cabelos brancos e ela usava um conjuntinho de malha-fria combinando sapatos, colar e brincos. Ela tinha um toque de rímel em seus cílios e seu batom era apenas um tom nude suave. Ela era diferente das mulheres da mesma idade dela que eu conhecia. Não por sua aparência, mas porque exalava um perfume diferente, o perfume de Cristo. Desde aquele dia, passei a admirar a velhice, pois havia conhecido uma mulher piedosa, amorosa e, sobretudo, uma mestra do bem que manejava bem a Palavra.
A imitação sempre foi uma realidade no comportamento humano. Imitamos aqueles a quem admiramos. Quando pequenas, calçamos os sapatos de salto de nossas mães e vestimos seus vestidos que arrastam pelo chão. Passamos não apenas a falar como as pessoas com quem convivemos, mas a nos expressar como elas, inclusive na forma como lidamos com os problemas, o estresse e as alegrias. Exemplos de mulheres piedosas não são apenas bem-vindos na vida da mulher cristã, mas são necessários.
A juventude e a velhice, como um espelho, refletem-se mutuamente, revelando a beleza da jornada que Deus desenhou para nós. A Bíblia frequentemente usa estruturas espelhadas para mostrar como um fim reflete um começo, como em Jó 1.21: “Nu saí do ventre de minha mãe, e nu voltarei para lá”. Assim como chegamos ao mundo dependentes, partimos dele da mesma forma. Da mesma maneira, a juventude e a velhice se encontram em um ciclo: o que um dia foi força torna-se fragilidade, o que um dia foi aprendizado se torna sabedoria a ser transmitida. Assim como uma criança precisa dos mais velhos para aprender a caminhar, os idosos encontram na juventude um reflexo do que um dia foram e um lembrete do que ainda podem ser. Há uma troca silenciosa, um aprendizado mútuo, onde o vigor da juventude se alia à serenidade da experiência. Mulheres piedosas mais velhas são como marcos antigos no caminho da fé, indicando a direção para aquelas que vêm depois. A Escritura nos apresenta esse padrão de discipulado intergeracional, onde a experiência dos mais velhos fortalece os mais novos, e o entusiasmo da juventude renova os mais experientes.
A cultura moderna rejeita o envelhecimento e idolatra a juventude, refletindo-se no culto à aparência e na busca incessante por rejuvenescer. Essa aversão, porém, revela um problema mais profundo: a ausência de exemplos piedosos que mostrem a beleza de envelhecer segundo a Palavra. A modernidade exalta a autonomia e a autoimagem, distorcendo o verdadeiro propósito da vida. Assim, o coração inquieto tenta escapar da transitoriedade da existência, em vez de abraçar cada fase da vida como parte do plano soberano de Deus. No entanto, a Escritura apresenta uma visão contrária: “Coroa de honra são as cãs, quando se acham no caminho da justiça” (Provérbios 16:31, NAA) e “Na velhice ainda darão frutos, serão cheios de seiva e de verdor” (Salmo 92:14, NAA). A maturidade não é um peso, mas um tempo de frutificação e testemunho.
A segmentação excessiva da igreja em grupos distintos como “de moças”, “de mulheres solteiras” e “de junioras” agrava essa desconexão geracional. Precisamos das experiências umas das outras. Dietrich Bonhoeffer, em Vida em Comunidade, destaca que o crescimento espiritual se dá no convívio real, onde aprendemos a carregar os fardos uns dos outros, independentemente da idade. Mulheres idosas, maduras, jovens e crianças precisam caminhar juntas, pois é nessa diversidade que desenvolvemos o fruto do Espírito.
Há muitas mulheres que testemunham a beleza de uma vida envelhecendo em fidelidade a Cristo. Elas nos mostram que juventude e velhice não são estágios opostos, mas complementares, formando um ciclo de dependência mútua. Se você ainda não encontrou alguém assim, olhe ao redor na sua igreja. Procure as mulheres mais velhas que você, observe sua sabedoria, sua firmeza e sua comunhão com Deus. A velhice não é um tempo de perda, mas de ganho – de aprofundamento na dependência de Deus, de testemunho ao próximo e de uma fé inabalável. O brilho do rosto não vem de procedimentos, mas da comunhão com o Senhor (2 Coríntios 3.18 NAA).
O discipulado bíblico vai muito além de ser uma referência distante ou uma figura pública admirada; ele exige envolvimento intencional, proximidade e ensino prático. Praticar isso pode ser simples: chame uma jovem para passar o dia em sua casa, cozinhando juntas e aprendendo na rotina. Saia para tomar um café com uma senhora da sua igreja e ouça sobre sua caminhada com o Senhor. Promova encontros entre gerações, onde possam compartilhar testemunhos e desafios. O discipulado acontece na vida real, no convívio, no aprendizado mútuo que fortalece a fé e o amor cristão.
A juventude passa rápido, mas a fidelidade ao Senhor permanece e cresce com o tempo. Nosso corpo envelhece, mas nosso espírito se renova dia após dia (2 Coríntios 4:16 NAA). A juventude precisa da maturidade da velhice, e a velhice se beneficia do vigor da juventude. Cada ruga, cada fio branco, cada nova estação da vida nos conduz a um conhecimento mais profundo do Senhor e de sua graça. Que possamos abraçar esse chamado, não fugindo do tempo, mas descansando na beleza da fidelidade daquele que nos conduz do começo ao fim.
O exemplo da senhora Devi ainda ressoa em meu coração, me inspirando a envelhecer como uma mestra do bem. Que possamos ter — e ser — exemplos piedosos, para que não temamos o tempo, mas abracemos cada fase como parte da obra de Deus em nós. Há mulheres mais jovens que precisam caminhar com você e colher da sabedoria que Deus lhe deu ao longo dos anos, assim como há senhoras esperando a oportunidade de compartilhar com você seu testemunho de fé, coragem e resiliência em circunstâncias semelhantes às que você vive agora. Essa é a beleza do corpo de Cristo, essa é a graça dessa comunidade que precisa viver em comum unidade! Que Deus nos abençoe nessa jornada.