Deus governa seu dia-a-dia?

De novo. Ele deixou o copo de vitamina sobre o balcão durante a noite de novo. Meu marido, Dave, é um homem brilhante e talentoso. Porém, às vezes, coisas comuns relacionadas à cozinha fogem à sua capacidade.

Uvas grudadas e sendo rude

Agora não havia a menor chance dos pedaços de uva incrusta dos saírem do copo sem que eu fizesse grande esforço. Comecei a falar comigo mesma (você também faz isso?). “Eu não tenho tempo para isso”, resmunguei. Rangi meus dentes com força e comecei a esfregar vigorosamente e, quando Dave passou pela cozinha, suspirei raivosamente e aumentei a intensidade das esfregadas. “Nossa, espero conseguir limpar este copo que você não enxaguou”.

Dave se desculpou e disse que tinha simplesmente esquecido. “Que falta de educação”, pensei. “Ele sabe o quanto eu trabalho. O mínimo que poderia ter feito era enxaguar o copo. Mal-educado…” Mas, na verdade, eu era a malcriada e sabia disso. O Espírito Santo me trouxe à mente a famosa passagem acerca do amor em 1 Coríntios 13: “O amor é paciente, é benigno; o amor não arde em ciúmes, não se ufana, não se ensoberbece, não se conduz inconvenientemente, não procura os seus interesses, não se exaspera, não se ressente do mal; não se alegra com a injustiça, mas regozijasse com a verdade; tudo sofre, tudo crê, tudo espera, tudo suporta. O amor jamais acaba. (1Coríntios 13.48). A Nova Versão Internacional traduz o versículo oito como “o amor nunca perece”.

Eu sabia que havia falhado em mostrar amor. De novo. Eu falho nisso todos os dias. Que esperança há para mim em entregar minha vida em sacrifício como Jesus fez, quando não consigo amar os outros ao fazer algo tão simples, como lavar um copo? Minha única esperança deve estar no Deus que é “compassivo, clemente e longânimo e grande em misericórdia e fidelidade” (Êxodo 34.6)

Deus governa seu dia-a-dia?

Esse é um exemplo tão estereotipado da minha vida. Sou esposa de um ocupado implantador de igrejas e mãe de três filhos, o mais velho com quatro anos. Vivemos no Oriente Médio, onde a areia permeia cada fresta nas janelas e portas, deixando, para eu varrer, uma película arenosa por todo o assoalho. Lavo oito cestos de roupa suja e corto as unhas de todos da minha família uma vez por semana.

Minha vida é totalmente normal.

Por isso amei escrever este livro. Necessito dessa mensagem de graça e esperança todos os dias. É por isso que, às vezes, me lanço em uma atitude de autopiedade, como a que você acabou de ler. Costumava pensar que esse tipo de atitude amarga sobre cuidar da casa era necessária, aceitável e até mesmo um rito de passagem. Afinal, um estímulo comum para alguém no meio das trincheiras do lar ou criando os filhos é consolar-se com pensamentos como “isso também passará”; “sofremos e suportamos”; e falamos sobre tudo o que faremos “algum dia” quando nossas vidas “voltarem ao normal”.

Essas frases, tão comuns, costumavam ser o resumo da minha esperança. Eu acreditava que se pudesse passar por essa temporada horrível e aparentemente interminável, então sairia do outro lado machucada e desgastada, mas com a missão concluída. Talvez, desse modo, eu estaria livre para servir ao Senhor com alegria e ficaria satisfeita.

Mas eu estava errada.

Quando compareci a uma conferência para casais, ministrada por Paul Tripp, ele disse algo que me devastou. Tripp disse: “Se Deus não governa seu dia a dia, então ele não governa você. Porque é nele que você vive”. Momentos dramáticos e com poder de transformar a vida se apresentam raramente durante nossa existência — por isso são dramáticos. Os demais dias são vividos de modo comum, ordinariamente secular.

A administração do lar é a minha rotina. Independentemente de como seja o seu dia a dia, tenho certeza de que podemos concordar: é nele que vivemos.

Glorifique a Deus em tudo o que você fizer

Eu sei que servir minha família é o mesmo que servir a Jesus e, ao administrar meu lar, devo trabalhar como para o Senhor. Colossenses 3.23-24 diz: “Tudo quanto fizerdes, fazei-o de todo o coração, como para o Senhor e não para homens, cientes de que recebereis do Senhor a recompensa da herança. A Cristo, o Senhor, é que estais servindo”.

Devemos considerar a gestão da nossa casa “como a criação de um organismo vivo que produz a paz de Cristo e a retidão de Deus”. Declarações como essa me incentivaram muito.

Eu já acreditava nas Escrituras ao exaltar o papel de uma dona de casa como algo de enorme valor. Não tive nenhum problema em ver o cuidado do lar de modo significativo à luz da eternidade. Perspectiva eterna? Feito. Contudo, e hoje? Como o “hoje” está incluído no escopo da eternidade? O comentário de Tripp me fez lembrar que a Bíblia tem muito a dizer sobre o ordinário. 1Coríntios 10.31 diz: “Portanto, quer comais, quer bebais ou façais outra coisa qualquer, fazei tudo para a glória de Deus”.

Sim! É claro que eu quero glorificar a Deus! Ele é o presente supremo de todo o universo, ele é digno de tudo o que há em mim. No cerne do meu ser, meu maior desejo é trazer glória a Deus. Considerei, até mesmo, transcrever o Catecismo de Westminster em minha parede para me ajudar a lembrar desta verdade:

Questão 1: Qual é o fim principal do homem?

Resposta: O fim principal do homem é glorificar a Deus e gozá-lo para sempre.

 Se eu deveria cumprir ou não meu objetivo de glorificar a Deus em tudo, não estava em questão. Eu sabia que viver para a sua glória deveria ser a minha maior alegria. Meu problema era simplesmente como? Como eu posso dobrar as roupas e separar brigas entre irmãos para a glória de Deus quando estou tão propensa ao fracasso por causa do meu pecado? Como o evangelho me torna uma mulher que limpa, com paixão, banheiros e narizes sujos, como para o Senhor? Como o evangelho me faz uma mulher que se preocupa em honrar a Deus na maneira com que dobra as roupas e serve o jantar?

Como minha cidadania no céu (Filipenses 3.20) muda o modo como administro a minha casa?

Fraldas podem colocar seu coração e sua mente em coisas superiores

Se o “mundo” de Deus é para pessoas do dia a dia, que fazem coisas do dia a dia, então, certamente, as Escrituras falam sobre como podemos engrandecer a Deus em meio ao cotidiano. E se os momentos corriqueiros, de pratos e fraldas, podem ser realizados com o objetivo de desfrutarmos de Deus, logo, a vitalidade espiritual que experimentaremos em nossa casa não é nada menos que milagrosa.

A oportunidade de crescimento em santidade se encontra bem debaixo do seu nariz — sentada na lava-louça morna, apodrecendo no cesto de roupas sujas, em sua mesa de jantar abarrotada e sob o banco do carro, onde seu bebê guardou as sobras da barra de cereal para mais tarde. Claro, aquele mofo cabeludo pode estar crescendo ali, mas nesses momentos também ocorre o crescimento em santidade.

Exatamente de onde estamos, podemos ter vislumbres da graça ao aprendermos passagens como Colossenses 3.13, que diz: “Por tanto, se fostes ressuscitados juntamente com Cristo, buscai as coisas lá do alto, onde Cristo vive, assentado à direita de Deus. Pensai nas coisas lá do alto, não nas que são aqui da terra; porque morrestes, e a vossa vida está oculta juntamente com Cristo, em Deus”.

Poderosamente, Deus traz nosso ministério à existência e nossas obras realizadas pela fé (2 Tessalonicenses 1.11). Assim sendo, aquela enésima fralda suja pode ser um meio significativo do trabalho transformador de Deus em sua vida.

A cruz, a coroa e a “mulher de Tito 2”

Vamos observar o capítulo 2 de Tito como um exemplo. Tito 2 é uma lista básica e prática de qualidades que uma mulher piedosa deve ter e fazer. As mulheres devem ser sérias em seu proceder, não caluniadoras ou escravas do vinho (Tito 2.3). As mulheres devem ser sensatas, honestas, boas donas de casa, bondosas e submissas ao marido (Tito 2.5). As mulheres devem ser mestras do bem (isto é, a “sã doutrina” em Tito 2.1), a fim de instruírem as jovens recém-casadas a amarem ao marido e a seus filhos (Tito 2.4).

Tito 2 contém não só uma lista de tarefas que você poderia colocar num lembrete em seu espelho do banheiro. Tito 2 também nos dá a motivação para fazer tais coisas, para “que a palavra de Deus não seja difamada” (Tito 2.5) e “a fim de ornarem, em todas as coisas, a doutrina de Deus, nosso Salvador” (Tito 2.10). A motivação não pode ser escrita num lembrete — ela deve ser escrita no coração.

Como esse motivo para adornar o evangelho de Deus se inscreve em nossos corações? Nossos corações devem ser transformados por Cristo. O versículo 11 diz: “Porquanto a graça de Deus se manifestou salvadora a todos os homens”. No versículo 12, Paulo acrescenta que essa graça está “educando-nos para que, renegadas a impiedade e as paixões mundanas, vivamos, no presente século, sensata, justa e piedosamente”.

A motivação do evangelho é apresentada com a promessa de uma esperança futura. Ao fazermos essas coisas, estamos “aguardando a bendita esperança e a manifestação da glória dos nosso grande Deus e Salvador Cristo Jesus, o qual a si mesmo se deu por nós, a fim de remir-nos de toda iniquidade e purificar, para si mesmo, um povo exclusivamente seu, zeloso de boas obras” (Tito 2.13-14).

É neste ponto que a fé entra e é neste ponto que vem a hora da verdade. Quando olho para a cruz e vejo que Deus não poupou seu próprio filho por mim (Romanos 8.32) e aguardo por sua promessa de glória futura (Tito 2.13), ele me dá o poder de limpar, com alegria, a bagunça do meu marido, que se esqueceu de enxaguar o copo, e não ferver de raiva, atacando-o verbalmente.

Um erro não justifica o outro

Posso imaginar o que você deve estar pensando neste momento, porque estou pensando nisso também. Acredito que isso seja verdade, mas tenho muitas coisas indo contra mim. Não consigo manter essa ideia em minha mente tempo suficiente para meditar sobre ela. Já posso ouvir os sons constantes do bebê vindo do quarto ao lado pela babá eletrônica. Não posso aplicar essas verdades com regularidade. E se não for apenas um copo sujo, mas uma casa inteira, dentro da qual parece ter se desencadeado uma tempestade de areia? O que fazer então?

Preciso ter meu coração transformado.

Se você é como eu, já deve estar, portanto, pronta para desistir. Isso é tão tentador para mim. Observo os padrões elevados de santidade e sei que não posso alcança-los. Nesse caso, poderia apenas voltar aos pratos sujos, resmungando comigo mesma e fazendo comentários sarcásticos sobre “quantas vezes eu lembrei de você”, esperando envergonhar meu marido a ponto de fazê-lo confessar, sinceramente, como ele estava errado e eu estava certa (quando é que essa estratégia funcionou mesmo?).

Ou eu poderia abordar essa situação de uma maneira diferente. Sei que a Bíblia diz para fazermos todas as coisas sem murmurações e para, em lugar disso, nos agarrarmos ao evangelho (Filipenses 2.14); e eu quero fazer o que é certo. Deus nos ensina como amarmos uns aos outros (1 Tessalonicenses 4.9). Desejo honrar a Deus em tudo que faço, assim como 1 Coríntios 10.31 diz que eu deveria. Decido que preciso tentar mais. Portanto fixo um bilhete com Filipenses 2.14 à janela sobre a pia, para que eu seja lembrada de não pecar. E então lavo a louça e controlo minha língua enquanto meu marido passa pela cozinha. Daí em diante, consegui evitar os comentários ofensivos e o bater de pratos com o propósito de obter a atenção de meu marido e um possível pedido de desculpas. Bom trabalho, Gloria, você conseguiu. Parabenizo a mim mesma por um trabalho bem feito. Meu convencimento, no entanto, revela que tenho ainda outro problema em minhas mãos: a auto aprovação. A tolerância que mostrei na cozinha aparentemente não era fruto do Espírito. Ela estava enraizada em orgulho pecaminoso. No fim do dia, estou mergulhada na autoaprovação — regozijando-me em orgulho ou me deprimindo em culpas, pelo fato de que poderia ter feito um trabalho melhor.

Os pratos sujos não são o maior problema em minha vida, ainda que pareçam ser, quando estão empilhados até o teto, tendo eu um milhão de outras coisas para fazer. O maior problema na minha e na sua vida é o pecado. Como posso me colocar diante do Deus que faz todas as coisas baseadas em seu caráter, caráter esse que inclui justiça perfeita (2Tessalonicenses 1.6)?

Por: Gloria Furman. © Editora Fiel. Website: editorafiel.com.br. Traduzido com permissão. Fonte: Trecho retirado do livro Vislumbres da Graça.

Original: Deus governa seu dia-a-dia?. © Ministério Fiel. Website: MinisterioFiel.com.br. Todos os direitos reservados.