Quais atividades da igreja são alcançadas pela imunidade tributária religiosa?

No último artigo explicamos brevemente os fundamentos da imunidade tributária religiosa no Brasil – você pode conferir clicando aqui[1]. Apesar disto, quando vamos aplicar a questão da imunidade tributária dentro da rotina da organização religiosa, percebemos situações que levantam dúvidas pontuais, mais especificamente sobre quais respostas o Direito Religioso tem a oferecer diante de determinadas surpresas no dia-a-dia da Igreja.

Não basta apenas saber que a Igreja tem este direito de natureza constitucional, à Imunidade Tributária – compreender como ele se desdobra em todas as atividades do corpo eclesiástico é importante. O culto é a expressão primária que identifica uma comunidade de fé, entretanto, há fatos geradores que envolvem a renda das igrejas, e que você precisa saber como a Igreja vai proceder diante de cada um deles, de tal forma que seu direito não seja reduzido, ou até mesmo escondido.

A imunidade tributária religiosa impede que o Estado cobre do sujeito passivo qualquer norma de incidência tributária de imposto, alcançando todo o fato gerador que tenha em sua regra-matriz qualquer patrimônio da Igreja, podendo compreender edifícios, capelas, templos, veículos, computadores, equipamentos de som, máquinas, equipamentos diversos, móveis e utensílios, desde que o fato social prescrito na norma tributária de criação do fato gerador esteja relacionado com a atividade-fim e com as necessidades da Igreja e do fenômeno religioso.

Da mesma maneira, a imunidade tributária religiosa alcança o fato gerador que envolva a renda das Igrejas, compreendendo os dízimos, as ofertas, as contribuições e doações recebidas, valores recebidos por serviços prestados, casamentos, batizados e qualquer outro objeto  cujo resultado da venda  é utilizado para as atividades essenciais ao culto religioso[2] e tenha em seu critério pessoal o sujeito passivo Igreja (organização religiosa).

A imunidade tributária religiosa alcança toda a propriedade, renda e/ou serviço que tenha como sujeito passivo as organizações religiosas e esteja diretamente relacionada à sua atividade religiosa previamente descrita em seu objeto social. Todas as compras, aquisições e contratações de serviços realizadas e/ou contratadas em nome da Igreja e para as suas finalidades essenciais, gozam da imunidade tributária religiosa.

Exemplos Práticos

1. Residência do ministro religioso

 A residência do ministro de confissão religiosa que desempenha a função de liderança religiosa em determinada organização religiosa conforme suas próprias normas estatutárias, desde que seja propriedade da igreja ou alugada em nome desta, também é alcançada pela imunidade tributária religiosa, nos termos de entendimento do Supremo Tribunal Federal neste sentido:

O fato de os imóveis estarem sendo utilizados como escritório e residência de membros da entidade não afasta a imunidade prevista no art. 150, VI, c, § 4º da Constituição Federal.[3]

2. A Igreja como locatária

No caso de a Igreja ser locatária do imóvel onde realiza suas práticas litúrgicas ou outras vinculadas à sua atividade essencial constante em seu estatuto social, também é imune ao pagamento desta exação; isso se contratualmente for sua obrigação e no cadastro fiscal municipal constar a organização religiosa como sujeito passivo da exação. Isso porque, como vimos no conceito de imunidade tributária, no momento em que o fenômeno religioso, por meio da pessoa jurídica da organização religiosa está presente na regra matriz (critério pessoal) da incidência do imposto, ocorre a supressão da competência do sujeito ativo Estado de cobrá-lo e o fato gerador não incide. Assim, o imóvel locado para organização religiosa e sendo utilizado para fins religiosos é imune. A imunidade tributária religiosa incide em razão da destinação do imóvel, não importa quem seja o proprietário.

3. A Igreja como locadora

A renda das organizações religiosas quando investida nas suas atividades essenciais também é imune. Exemplo que pode ser trazido à baila é aquele em que a Igreja adquire imóvel urbano, locando-o para terceiro, e a renda deste locativo aplica integralmente na propagação de sua fé religiosa em campanhas de evangelização ou qualquer outra empresa neste sentido. O IPTU que incidia sobre este imóvel deixa de incidir no momento em que sua renda é utilizada para fins eclesiásticos em razão da regra imunizante.

4. A sede dos escritórios de representação (Convenções)

Os imóveis em que estão sediados os escritórios das organizações religiosas, entre eles os escritórios das convenções que desempenham o papel de órgão moderador e de representação de próprias organizações religiosas, também são imunes a quaisquer exações na espécie de imposto pelo mesmo fundamento constitucional, uma vez que possuem como escopo primeiro a propagação de sua fé.

5. IPVA

Outra imunidade tributária religiosa é referente ao Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores – IPVA. Se o veículo automotor estiver em nome da organização religiosa e o veículo for utilizado para a atividade essencial da igreja e do fenômeno religioso, ocorre a limitação estatal de cobrar este imposto, incidindo assim a imunidade tributária religiosa. Para tal, basta requerer junto ao respectivo Fisco Estadual a concessão da imunidade, juntando apenas e tão somente os documentos que comprovem (i) que o veículo está em nome da organização religiosa; (ii) que o veículo é utilizado na atividade essencial da organização; e (iii) a legitimidade do sujeito passivo para assinar o requerimento. Ou seja, qualquer outro documento que seja exigido pelo fisco estadual é ilegal, pois impõe condições para a concessão da imunidade que não existem no Texto Constitucional ou no Código Tributário Nacional.

Não se trata de favor do Fisco, e, uma vez juntados os documentos, a Receita Estadual é obrigada a imunizar a requerente do imposto e devolver as exações porventura pagas anteriormente sobre o mesmo veículo até a data de comprovação de propriedade e atividade essencial.

Conclusão

Há ainda outros impostos, assim como outras atividades no âmbito das Igrejas, que seguem a mesma lógica daquelas que listamos neste artigo: o Imposto sobre a Transmissão de Bens Imóveis e de Direitos a eles relativos (ITBI), entre outros. Isto porque são atividades vinculadas a estrutura essencial da Igreja, ou que simplesmente você pode dizer que são ligadas a “atividade-essencial” da Igreja.

É esta característica que justifica a amplitude da imunidade tributária sobre qualquer atividade que, dentro do nosso ordenamento jurídico, esteja suscetível a determinado imposto. Na vida secular, o que determina o pagamento de determinado imposto é a natureza da atividade e a previsão da lei. Já na ordem espiritual, no qual se encaixa a Igreja, – por ser portadora da fé e da espiritualidade humana – o que determina o não pagamento do imposto é simplesmente o “ser Igreja”, nos rememorando a natureza do Ente, em que o homem passa a da física para a metafísica, ou seja, para a Teologia Sagrada.

O homem busca, através da comunidade de fé, a sabedoria que provém de Deus: aquele que, conforme a confissão de fé cristã, é a sabedoria encarnada. Diante de tais coisas, elevadíssimas, não cabe ao Estado cobrar impostos, inclusive sobre todas as atividades que a comunidade de fé realiza.

Uma Igreja não sobrevive apenas meditando ao ar livre. Há custos, manutenção, cuidado com os líderes, projetos a serem custeados, e uma missão a ser realizada a nível mundial – essas coisas demandam tempo, dinheiro e disposição, e são expressões da fé, ou seja, a prática da teoria essencial da Igreja, e que define sua substância como indisponível para a cobrança de impostos.

[1] Por que a igreja possui imunidade aos impostos?

[2] Súmula 724 – Ainda quando alugado a terceiros, permanece imune ao IPTU o imóvel pertencente a qualquer das entidades referidas pelo art. 150, VI, “C”, da Constituição, desde que o valor dos aluguéis seja aplicado nas atividades essenciais de tais entidades. Disponível em: <http://Direito.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=724. NUME.%20NAO%20S.FLSV.&base=baseSumulas>

[3] BRASIL. Supremo Tribunal Federal, 2016.

Por: TR Vieira e Jean Regina. © Voltemos ao Evangelho. Website: voltemosaoevangelho.com. Todos os direitos reservados. Original: Quais atividades da igreja são alcançadas pela imunidade tributária religiosa?